4º domingo da quaresma - Ano A - Jesus, a LUZ, que cura nossas cegueiras

17 Março 2023

 

"A cura do cego de nascença é o sexto sinal do evangelho de João. A função dos sinais é dar a conhecer quem é Jesus, provocando as pessoas a tomar partido a favor de Jesus e da vida (fé) ou contra Ele e a favor da morte (rejeição). (...) Jesus é o servo (cf. Is 42,6; 49,6) que capacita as pessoas a enxergar a realidade, sobretudo, as situações que provocam alienação e marginalidade. O gesto audacioso de Jesus transgride a instituição do repouso sabático e ensina a transgredi-la quando a vida se encontra fragilizada, ferida. A ordem de se lavar na piscina de Siloé – palavra que significa enviado- apresenta a novidade da narrativa: nossas cegueiras começam a desaparecer quando nos lavamos Naquele que o Pai enviou. Jesus é a água que lava e purifica, e todos são convidados a se aproximar dessa fonte para enxergar.

 

A reflexão é de Regina Candida Führ, religiosa da Congregação das Irmãs de Santa Catarina. PhD em Educação, ela é também doutora em teologia e mestre em educação. Atua como avaliadora dos artigos científicos para a Revista da ANEC, integra o grupo de mulheres do Mistério da Palavra na Voz das Mulheres – IHU/ Unisinos e é Missionária e facilitadora na etapa formativa do Juniorato em Mariveles, Província de Bataan – Filipinas.

 

 

Desperta, ó tu que dormes; levanta-te dentre os mortos e Cristo de iluminará” (Ef 5,14).

Introdução

O 4º domingo da quaresma chama-se é Laetare – LETARE- (da antífona latim de entrada: “Alegre-te, Jerusalém”), representa a alegria na expectativa da Páscoa durante o tempo austero da quaresma. A primeira leitura (1Sm 16,1b.6-7.10-13ª) nos revela que Deus escolhe os últimos, não se deixando enganar pelas aparências. A resposta de fé a Deus nos conduz a reconhecer em Jesus a plenitude do humano, o profeta enviado pelo Pai. Entendemos que nossa fé se fortalece no meio dos conflitos, assumindo as consequências do discipulado de Jesus (Jo 9,1-11) e denunciando tudo o que é obra estéril das “trevas”, a maldade, a injustiça, a mentira, a exploração, a alienação (Ef 5, 8-14).

 

Comentários dos textos bíblicos

1ª Leitura: 1Sm 16,1b.6-7.10-13a

Neste quarto domingo da quaresma, a primeira leitura narra à eleição de um grande líder do povo de Israel, Davi. O nome de Davi (hebraico: David) significa “Querido, Amado”. Sem nenhum sinal exterior e em ligação imediata com a unção, o “Espírito do Senhor” desce sobre Davi, pois a graça concedida a uma pessoa consagrada, torna a eleição estável: o Espírito, que irrompeu ocasionalmente nos juízes (cf. Jz 3,10; 6,34; 11,29; 13,25; 14,6.19) permanece agora em Davi (cf. Is 11,2). Ele é a figura do governante, “segundo o coração de Deus”, o rei justo que não abandona os pobres. Samuel, o profeta escolhido por Deus, foi um dos últimos juízes de Israel. A fase em que viveu foi de grandes conflitos, de transição entre o tribalismo e a monarquia. Conforme a ordem divina, busca reconhecer, entre muitos irmãos, qual seria o escolhido para governar o povo. Após a análise feita, dos sete filhos, de Jessé, Samuel declara que nenhum deles tinha sido chamado por Deus. O menor deles, ausente por estar cuidando do rebanho, é o escolhido. Samuel, como juiz de Israel, unge Davi como rei segundo a vontade divina. Seu governo deve ser realizado sob a autoridade de Deus. Deus não se deixa conduzir pelas aparências [...] o homem vê as aparências, mas o Senhor olha o coração (1Sm 16, 7). Ele conhece o coração de cada pessoa, chama os que estão em último lugar, para realizar o seu plano na história. O texto denuncia o poder monárquico e valoriza os caminhos alternativos que emergem com a mobilização dos pequenos e marginalizados, pois é a partir deles que Deus irá consolidar a justiça e o direito no meio do povo.

 

Salmo responsorial – Sl 22(23),1-3a.3b-4.5.6 (R. 1)

O salmo 23 é qualificado como um cântico de confiança, onde Davi centraliza sua atenção no fato de que se pode confiar em Deus, e que mesmo em tempos de desespero, sua justiça, sua bondade, sua misericórdia e seu cuidado para com o povo se manifestam, pois Deus deleita-se em saber que aqueles que Nele creem confiam sua vida a Ele, assim como uma ovelha indefesa dependia da total proteção do seu pastor.
Talvez o Salmo 23 seja até o canto de um israelita que, diante de seus perseguidores, encontrou refúgio no templo de Jerusalém; neste sentido, a assistência do pastor divino não fortalece aqui quem já é forte ou quem já é dominante na sociedade, mas se dirige aos fracos e perseguidos, os quais temem não apenas por seu direito, mas também por sua simples existência.

 

2ª Leitura: Ef 5,8-14

A leitura de São Paulo aos Efésios professa a fé em Cristo luz: “Desperta, ó tu que dormes; levanta-te dentre os mortos e Cristo te iluminará” (Ef 5,14). Paulo apresenta a incompatibilidade entre trevas e luz, entre sono e estar acordado, entre o segredo e a denúncia. Pelo batismo os cristãos passaram das trevas para a luz. São luz enquanto permanecem no Senhor (v. 8). Por isso, ser luz no Senhor pressupõe a rejeição e a denúncia das obras estéreis das “trevas” que envolve a sociedade no egoísmo, na injustiça e na mentira. A sociedade em que viviam os destinatários da carta era marcada por ídolos disfarçados de deuses mantenedores da maldade, injustiça e mentira. O texto apresenta a denúncia e desmascaramento deste sistema:” Tudo o que é desmascarado é manifesto pela luz (v 13). Os cristãos e a Igreja também apresentam disfarces. Urge, portanto, levantar-se dentre os mortos e ser iluminado pelo Cristo (cf. v. 14). A vida em Cristo é considerada o verdadeiro caminho da luz. Ele é a verdadeira luz. Quem se unir a Ele é também filho da luz e produz “frutos de bondade, justiça e verdade” (v 9). Quem decidir seguir Jesus não pode ser cúmplice da maldade, da corrupção, da mentira, do egoísmo, do desamor.

 

Evangelho: Jo 9,1-41

A cura do cego de nascença é o sexto sinal do evangelho de João. A função dos sinais é dar a conhecer quem é Jesus, provocando as pessoas a tomar partido a favor de Jesus e da vida (fé) ou contra Ele e a favor da morte (rejeição).

O contexto do sexto sinal é o da festa das Tendas. Neste dia, o sacerdote costumava tirar água da piscina de Siloé para purificar o altar. A noite o povo acendia tochas para iluminar a cidade. Neste contexto, a cura do cego de nascença mostra que Jesus é a água que nos lava das cegueiras da alienação e a luz que faz brilhar os olhos da fé.

O cego, símbolo do povo oprimido, é vítima de preconceitos religiosos – e para a sociedade – o cego de nascença é um castigo de Deus. A sociedade estabelecida gerou esse preconceito, e a única coisa que o povo (cego) pode fazer é pedir esmola (v.8), perpetuando sua dependência e reagir violentamente quando alguém desmontou o sistema. Jesus afirma que libertar os que vivem desde seu nascimento na alienação, dependência e opressão é manifestar as obras de Deus que o enviou (v.3).

Jesus é o servo (cf. Is 42,6; 49,6) que capacita as pessoas a enxergar a realidade, sobretudo, as situações que provocam alienação e marginalidade. O gesto audacioso de Jesus transgride a instituição do repouso sabático e ensina a transgredi-la quando a vida se encontra fragilizada, ferida. A ordem de se lavar na piscina de Siloé – palavra que significa enviado- apresenta a novidade da narrativa: nossas cegueiras começam a desaparecer quando nos lavamos Naquele que o Pai enviou. Jesus é a água que lava e purifica, e todos são convidados a se aproximar dessa fonte para enxergar.

O cego, que se tornou discípulo, começa a ver a sociedade de modo crítico, enfrentando os conflitos e dando testemunho de Jesus. Aquele que fora cego precede por etapas: I – começa reconhecendo que Jesus é homem (v. 11), alguém que sente, com profundidade e sensibilidade, os anseios do ser humano; II – progride na descoberta de Jesus como Servo enviado por Deus (v 15), como profeta (v 17), aquele que vem de Deus (v 33), o Filho do homem; III – o cego curado se encontra com Jesus fora da instituição que o mantinha na cegueira e mendicância e da o último e definitivo passo na fé: “’Eu creio Senhor’! E prostou-se diante de Jesus” (v 38).

No texto do evangelho de João, Jesus desmascara e desqualifica os que mantém o povo na cegueira da alienação, impedindo-o de ter acesso à vida (v 41).

 

Para refletir na oração

 

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