A rapidez da existência. “Opção Francisco”, por Armando Matteo

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13 Abril 2022

 

O advento das novas condições de vida que hoje permitem que o cidadão médio desfrute de um impensável bem-estar e de um amplíssimo exercício da própria liberdade foi tão rápido a ponto de encontra-lo, em certa medida, despreparado e vulnerável.

 

A opinião é de Armando Matteo, professor de Teologia Fundamental da Pontifícia Universidade Urbaniana e subsecretário adjunto da Congregação para Doutrina da Fé, convocado pelo Papa Francisco.

 

O artigo foi publicado na coluna “Opzione Francesco”, da revista Vita Pastorale, de abril de 2022, e reproduzido na íntegra por Settimana News, 10-04-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

 

Leia também, em português, o primeiro, o segundo e o terceiro artigos da série.

 

Eis o artigo.

 

Outro aspecto da nova cultura que distingue os cenários contemporâneos diz respeito à rapidez com a qual ela se impôs na existência dos indivíduos e da coletividade.

 

Para chamar a atenção para o tema, o Papa Francisco não tem medo de utilizar um neologismo espanhol particularmente eficaz: a “rapidación”. Eis as suas palavras:

 

“A contínua aceleração das mudanças na humanidade e no planeta junta-se, hoje, à intensificação dos ritmos de vida e trabalho, que alguns, em espanhol, designam por ‘rapidación’. Embora a mudança faça parte da dinâmica dos sistemas complexos, a velocidade que hoje lhe impõem as ações humanas contrasta com a lentidão natural da evolução biológica. A isto vem juntar-se o problema de que os objetivos desta mudança rápida e constante não estão necessariamente orientados para o bem comum e para um desenvolvimento humano sustentável e integral. A mudança é algo desejável, mas torna-se preocupante quando se transforma em deterioração do mundo e da qualidade de vida de grande parte da humanidade” (Laudato si’, n. 18).

 

Essas considerações são particularmente significativas na medida em que a “opção Francisco” nos pede, como fiéis, que reconheçamos a radical mudança de época que estamos vivendo e os seus efeitos sobre o nosso compromisso de anúncio e de testemunho do Evangelho.

 

De fato, o advento das novas condições de vida que hoje permitem que o cidadão médio desfrute de um impensável bem-estar e de um amplíssimo exercício da própria liberdade foi tão rápido a ponto de encontra-lo, em certa medida, despreparado e vulnerável.

 

Do vale de lágrimas ao paraíso na terra

 

Francisco recorda com razão a natural lentidão da evolução biológica da nossa espécie. Hoje, ao contrário, encontramo-nos diante de uma passagem, de um salto: no arco de poucas décadas, os ocidentais passaram de uma vida breve, sacrificada, frustrada, exposta às doenças, à fome, às guerras, à pobreza e à ignorância a uma vida longa, menos sobrecarregada de trabalhos braçais, rica em satisfações possíveis, em boa saúde, saciada, medianamente abastada e até saturada de informações.

 

Para usar uma imagem suficientemente forte, podemos condensar tudo isso dizendo que passamos rapidissimamente do vale de lágrimas dos nossos pais e avós para a planície luxuriante do bem-estar. Um bem-estar que encontra a sua expressão mais eloquente em uma liberdade de pensamento, decisões, ações, gozo, experiências, viagens, em uma palavra de vida e de poder que não podemos deixar de saudar como um verdadeiro salto evolutivo da espécie. Uma conquista, em muitos aspectos, efetivamente admirável.

 

Resta o ponto delicado do despreparo da espécie para tal “paraíso na terra”, que não só pode causar dores de cabeça, com efeitos de desequilíbrio, mas que também pode ser contraproducente quando, como dizia o papa, não está orientado para o bem comum e para um desenvolvimento humano, sustentável e integral.

 

Afinal – e é aqui que a questão se torna urgente para os fiéis – quem primeiro compreendeu essa nova condição humana, com todos os seus possíveis calcanhares de Aquiles, foi o capitalismo avançado dos nossos dias.

 

 

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