13 Dezembro 2012
Sete horas de viagem na maior floresta equatorial africana. Em uma estrada de terra vermelha, cercados pela selva, entre picos de pedras, buracos que parecem crateras e um rio de lama. Para chegar ao centro operacional do M23 – os 2.000 soldados rebeldes que, liderados pelo bispo Runiga Rugerero, conquistaram o coração da região mais rica em matérias-primas de todo o Congo e que tumultuaram os interesses de dezenas de países ocidentais e de muitas outras empresas multinacionais –, é preciso avançar pelo Rutshuru: um território que o governo central de Kinshasa efetivamente abandonou.
A reportagem é de Daniele Mastrogiacomo, publicada no jornal La Repubblica, 11-12-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Depois de dezenas de colinas e de muitas outras planícies, chegamos a Bunagana, sede do quartel general do Movimento 23 de Março, um pequeno vilarejo na fronteira com a Uganda, onde vive encastelado o ex-bispo de Goma: encerrado entre doces colinas cultivadas com chá, envolto por bosques de bananeiras, tapetes de samambaias, trechos de palmeiras de abacaxi, ele domina do alto o imenso parque natural de Virunga.
"Se você vier me encontrar", nos propôs o bispo, "irá conhecer a nossa terra, irá entender quem somos e por que lutamos". Mas primeiro é preciso sair de Goma, a capital do Kivu do Norte. Deixar esse inferno de 100 mil desesperados onde, há 20 anos, as Nações Unidas, com a missão da MONUC, juntamente com uma centena de ONGs, afligem-se por um renascimento impossível.
A estrada não existe. Assim como todas as estradas do Congo. A velha pista de asfalto, traçada nos tempos do antigo Zaire de Mobutu para libertar as distantes regiões do Leste, foi comida por milhares de caminhões e pelas chuvas torrenciais. Agora também está chovendo. Cascatas de água chicoteiam homens, mulheres e crianças curvados sob o peso de sacos, fardos de cana-de-açúcar, pilhas de lenha e de pasto. Os mais sortudos têm uma bicicleta, os mais fortes, a típica carriola congolesa de maneira que corre o risco de virar a cada solavanco por estar submersa pela carga.
Mulheres, homens e crianças têm cestos cheios de frutas, mandiocas, batatas e cenouras que levam sobre a cabeça com um equilíbrio elegante e natural. Ninguém reclama. Todos estão envolvidos nesse esforço coletivo: na África, você participa do trabalho familiar desde pequeno. Não é raro ver crianças de poucos anos carregando latões de água que devem ser enchidos todos os dias a quilômetros de distância. Eles arrastam a sua carga com uma cinta que passa pela testa, seguidos à distância pelos pais.
A multidão chega dos campos para vender os produtos no mercado. Mas primeiro deve enfrentar os postos de bloqueio controlados pela polícia e pelo exército oficiais. Verdadeiros centros de tributos. Dinheiro em troca da passagem. Haviam desaparecido por dez dias: o tempo da permanência dos soldados do M23. Após a retirada dos rebeldes e o retorno do exército regular das Forças Armadas da República Democrática do Congo, tudo voltou a ser como era antes.
Agentes e soldados gritam, bloqueiam os carros, pedem os documentos, vasculham entre os sacos. Quem pode, paga; os outros se resignam. Cedem comidas, roupas, objetos. Novamente há uma grande tensão. A brutalidade dos militares exala vingança.
No dia 20 de novembro passado, depois de uma breve e intensa batalha em que houve 90 mortes, os soldados legalistas tiveram que se curvar diante da ofensiva dos rebeldes, abandonar Goma e fugir para o Kivu do Sul. Foi uma verdadeira humilhação. Agora, estão se saciando depois do longo jejum: saqueiam o que podem.
O Congo é feito assim: a corrupção, desenfreada, sistemática, impune, afunda o mais rico país do planeta. Em benefício dos clãs no poder que exploram a fraqueza política e de imagem do presidente Joseph Kabila. Isolados, mal pagos e raramente pagos, os soldados das FARDC contam com o fuzil e com o uniforme para reafirmar o seu poder. E para sobreviver.
Entre Kinshasa e Goma, há 1.500 quilômetros de floresta, malária, disenteria. Nada de estradas, nada de ferrovias. Somente o velho rio Congo, o "coração das trevas" do capitão Joseph Conrad, une duas terras tão diferentes e tão distantes. Com os seus perigos, as suas tribos agressivas com relação ao mundele, o homem branco sempre em busca de marfim e de borracha e hoje de diamantes. Até de ouro, cobre, coltan, tão úteis para os nossos computadores e celulares. E de petróleo, descoberto justamente aqui, no Kivu do Norte.
Os homens do M23 deixaram Goma, mas continuam a postos a dois quilômetros de distância. As pressões dos países vizinhos, Ruanda e Uganda à frente, e as condenações internacionais os convenceram a recuar. A retirada não foi uma derrota, ao contrário: é uma vitória. Política, sobretudo. Era a condição para negociar.
Sabe-se que, nas guerras de guerrilha, negocia-se quando se vence. Quando se perde, você é bombardeado e oprimido. Os rebeldes, que se intitulam como "Armada Revolucionária Congolesa", aceitaram. Sentam-se desde domingo à mesa de negociação aberta em Uganda, em um país neutro, diante dos observadores internacionais.
O mesmo fez Joseph Kabila. E isso equivale a um reconhecimento político do M23 por parte do governo central de Kinshasa: um interlocutor oficial, bem diferente das cerca de 20 milícias (entre Maï Maï, Nyatura, FDC e os extremistas hutus do FDLR) que atuam na região, entre violências e saques, provocando ondas de refugiados.
As reivindicações são simples: igualdade de direitos para todos os soldados das FARDC. Incluindo grau, salário, tempo de serviço. Retorno dos refugiados, distribuição das riquezas em todas as regiões do país. Esses 2.000 militares são e se sentem congoleses. Aqui nasceram aqui e aqui querem ficar. Mas a sua origem étnica ruandesa, de maioria tutsi, acaba discriminando-os entre as fileiras do exército de Kinshasa.
As escolhas dos impérios coloniais não resistem às mudanças da história. Foi a Bélgica do rei Balduíno I que explorou, nos anos 1950, a explosão demográfica de Ruanda para contratar uma nova força de trabalho a ser usada nas fábricas do Kivu. Depois de meio século, são 800 mil: um terço de toda a população congolesa.
As ambições ruandesas e ugandesas sobre a região são evidentes. Mas, no caso dos rebeldes do M23, surgem motivações mais profundas. A discriminação étnica sustentada pelos impérios coloniais, com muitas carteiras de identidade sobre as quais era indicada a própria cepa de pertença, até o genocídio em Ruanda de um milhão de tutsis e de hutus moderados em 1994, despertam fantasmas e medos. Sentimentos que os acordos do dia 23 de março de 2009, entre o Congresso Nacional para a Defesa do Povo (CNDP) do general Laurent Nkunda e o governo de Joseph Kabila, haviam aplacado.
As milícias seriam desmanteladas, todos os rebeldes seriam integrados no exército nacional, o Kivu teria as ajudas e o justo peso nas decisões centrais. Mas os acordos – que levam o nome de M23 – nunca foram aplicados. O Kivu é cobiçado por muitos.
Assim, manter um Congo instável é conveniente para todos. Ter no Kivu um novo interlocutor como o M23 altera equilíbrios e pontos de referência. Significa pôr novamente em discussão os acordos alcançados em Kinshasa. Significa perder as exclusividades e os subornos já pagos. Os rebeldes sabem disso. Pedem transparência e a distribuição das riquezas em todo o país. Precisam de um Estado, de instituições, de legalidade.
Nos cartazes que pontilham a região, além das advertências de saúde, da condenação das violências sexuais, das campanhas contra a Aids, incita-se a combater a corrupção. Não vemos as crianças-soldados, nem coletamos denúncias de mulheres violentadas. Os ataques relatados por diversas vezes por ONGs e pelas Nações Unidas são outros: meios de administração e armas abandonados em Goma pelo exército em fuga. Vemo-los com nossos próprios olhos. Jipes e caminhões com o sinal da polícia congolesa disparam ao longo das estradas que ligam as dezenas de vilarejos da região. Os rebeldes os usam, com uniformes de soldados e de policiais com o emblema do M23 na manga, para controlar a região de Rutshuru e defender a população das milícias de bandidos.
Eles fazem o que o governo central em Kinshasa nunca fez. Prontos para conquistar um novo território se a mesa de negociação for derrubada. Como já é provável que irá acontecer.
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O bispo armado do Congo ensanguentado - Instituto Humanitas Unisinos - IHU