07 Outubro 2021
Eric de Moulins-Beaufort, o arcebispo de Reims: "Estou profundamente envergonhado".
"Estou profundamente envergonhado." Pede mil e mil vezes o "perdão", em seu nome e em nome de toda a Igreja da França. Ele se sente humilhado e envergonhado diante do mal absoluto das violências contra milhares de crianças infligida por sacerdotes durante setenta anos nas Sagradas Salas do país. O presidente da Conferência Episcopal, mons. Eric de Moulins-Beaufort, arcebispo de Reims, sofre também e principalmente pelos silêncios póstumos de quem não quis ouvir o grito desesperado de algumas das cerca de 330.000 vítimas de pedofilia na Igreja francesa de 1950 até hoje, de acordo com o relatório da Ciase (Comissão sobre os Abusos Sexuais na Igreja) encomendado pelos próprios bispos.
A entrevista com Eric de Moulins-Beaufort é de Domenico Agasso, publicada por La Stampa, 06-10-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Excelência, como pode recomeçar a Igreja da França?
Essas cifras são uma surpresa enorme, inacreditável e espantosa, além de uma aflição indescritível. A voz daqueles que foram abusados nos oprime, seu número nos oprime. Tudo isso é insuportável, além de intolerável. Portanto, o primeiro fundamental passo a ser dado é escutar com o coração aberto o sofrimento daqueles que foram violentados: é uma exigência crucial. Depois teremos que tomar consciência dessas atrocidades cometidas por milhares ‘de nós’.
E depois?
Seremos depois chamados a tomar as decisões necessárias, considerando as recomendações do relatório, sobre como prevenir os abusos. Estas incluem a formação dos padres e a promoção de políticas para o ressarcimento das vítimas.
E algum prelado terá que renunciar ou ser “convidado” a isso, não acha?
Depois de ter apurado as responsabilidades precisas, os passos para trás são um dos caminhos a percorrer. Mas de qualquer forma não será suficiente: nós bispos com todos os sacerdotes e fiéis devemos ler esse dossiê dos horrores, e depois trabalhar juntos para sairmos sem ambiguidades dessa dolorosa crise de proporções memoráveis e impressionantes.
Além das ações criminosas, entre as tantas questões que emergem do trabalho da comissão, qual é a que mais lhe entristece?
A profunda indiferença, inclusive cruel, para com as vítimas. É vergonhosa. A recusa em ver, em ouvir, o desejo de esconder, a relutância em denunciar. A Igreja em muitas das suas personalidades não foi capaz - ou não quis - ouvir, ver, perceber o grito desesperado de milhares de crianças e jovens. E isso é o exato contrário da ternura de Deus.
Se o senhor se encontrasse com uma das milhares de vítimas, o que lhe diria?
A primeira coisa é que estou tentando compartilhar, ‘fazer meu também’ algo do seu padecimento. Tive a oportunidade de algumas conversas com pessoas violentadas, trabalhei com elas nesses três anos, e hoje sinto que tenho uma certa percepção de seu tormento. Mas nunca vou deixar de expressar minha vergonha, o meu sofrimento. E de pedir a elas perdão. Peço perdão a cada uma e a cada um deles. Mesmo sabendo que não é suficiente. É necessário que toda a Igreja da França peça perdão.
O senhor falou com o Papa sobre esta situação?
Sim. Ele me disse que é a minha e a nossa cruz. Depois acrescentou que mais tarde pode tornar-se também luz: o Pontífice pensa que quando esses crimes aberrantes vêm à luz, começa o caminho para a purificação.
Qual é a luz nesta escuridão em que afundou a Igreja da França?
Só existe uma: a palavra das vítimas. A partir daí temos que recomeçar, para tentar reparar os danos atrozes causados e evitar novos escândalos.
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França. A amargura do presidente dos bispos: “Uma atrocidade, peço mil vezes perdão” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU