28 Outubro 2015
A líder de um grupo mundial com cerca de 600 mil religiosas católicas disse, na esteira do Sínodo dos Bispos deste mês, que as mulheres são chamadas a levar a cabo o trabalho pastoral que a Igreja oficial às vezes não tem condições de fazer.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada por National Catholic Reporter, 26-10-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
A Irmã Carmen Sammut, natural de Malta e que participou no Sínodo 2015 como uma das 32 mulheres participantes sem direito a voto junto dos 270 prelados, falou que as religiosas deveriam se envolver com aquelas pessoas que as instituições eclesiais podem nem mesmo saber que precisam de ajuda.
“Acho que não devemos desistir do nosso papel nas fronteiras da Igreja”, declarou Sammut, que preside a União Internacional de Superioras Gerais – UISG.
“Com as pessoas (…) que estão necessitando de um acompanhamento pastoral – e que recebem ele muitas vezes não da Igreja oficial, mas de nós”, descreveu ela o trabalho das irmãs, propondo que as religiosas se façam a pergunta: “Como estamos nos envolvendo com as pessoas que a Igreja oficial não está vendo?”
Com a publicação do documento final do Sínodo, Sammut disse que uma outra pergunta a se fazer é: “Como podemos ter certeza de que estas palavras não serão esquecidas e como estamos realizando-as em nossas realidades?”
“Creio que podemos pressionar nesse sentido”, disse.
Sammut, que também é a Superiora Geral das Irmãs Missionárias de Nossa Senhora da África, falava na segunda-feira numa sessão pública com membros da UISG para apresentar uma visão geral de sua experiência de servir como auditora no encontro dos bispos. A sessão intitulava-se: “O Sínodo sobre a Família visto do Banco de Trás”.
Os auditores e as auditoras podiam se fazer presentes e participar nos debates sinodais, mas não possuíam direito a voto. No evento deste ano estavam 17 indivíduos e 17 casais. Treze dos auditores individuais eram mulheres, incluindo Sammut e duas outras irmãs representavam a UISG.
O grupo internacional das religiosas é uma organização com cerca de 1.800 líderes das congregações católicas femininas.
Na segunda-feira, Sammut falou sobre o processo pelo qual ela e duas outras irmãs foram nomeadas como auditoras, explicando que ele não ocorreu de forma fácil. A religiosa disse que o seu grupo não havia tido nenhuma inclusão oficial no último Sínodo dos Bispos, ocorrido em 2014.
A líder da UISG disse que ela e um grupo de líderes religiosas abordaram a questão primeiramente numa reunião com o secretário de Estado do Vaticano, o Cardeal Pietro Parolin, há alguns meses. Elas então levantaram a questão em um encontro com o Cardeal Lorenzo Baldisseri, chefe da Secretaria Geral do Sínodo, antes de serem convidadas.
“Não acho que este convite foi automático”, contou Sammut às religiosas no encontro sobre a sua participação no Sínodo. “Tivemos de ir em busca dele”.
Um grupo parecido, que representava as ordens religiosas masculinas, tinha 10 participantes presentes no Sínodo deste ano, todos eles com pleno direito a voto. Pela primeira vez nos últimos 50 anos do Sínodo, um desses representantes não era sacerdote: o Irmão Herve Janson, da Congregação dos Pequenos Irmãos de Jesus.
Sammut mencionou o papel de Janson, dizendo: “Esta foi a primeira vez que uma pessoa não ordenada [ao sacerdócio] tem direito ao voto no Sínodo, então algumas coisas podem mudar com o tempo”.
A líder da UISG igualmente mencionou que ela teve uma oportunidade, durante o Sínodo no dia 16 de outubro, para se encontrar em privado por uns instantes com o Papa Francisco.
Disse que perguntou se ele havia recebido uma série de cartas que o seu grupo havia lhe escrito e que se focavam especialmente em manifestar a disponibilidade delas em fornecer subsídios caso ele quisesse considerar mais profundamente o seu desejo expresso de papéis mais amplos às mulheres na Igreja.
Francisco, disse Sammut, indicou que não recebeu as cartas. A religiosa então falou que ela convidou o papa a participar na próxima assembleia geral trienal, a acontecer em maio de 2016.
Sammut informou ter recebido uma nota escrita a mão de Francisco no dia seguinte, na qual o pontífice prometia uma audiência geral com cerca de 800 religiosas que vinham a Roma para o encontro. A carta fora escrita em espanhol, com o envelope endereçado pelo próprio papa, que registrou o seguinte endereço: “F., Casa Santa Marta, Città del Vaticano”.
No decorrer da apresentação de segunda-feira, a líder religiosa recapitulou o processo de três semanas do Sínodo, mas também trouxe alguns insights de como são os bastidores do encontro.
Sammut disse que uma coisa “um pouco difícil” de acompanhar na sequência das intervenções dos bispos durante as sessões abertas do Sínodo era quando cada um dos prelados tinha a oportunidade de falar por três minutos.
“As intervenções eram extremamente diferentes”, disse. “Podíamos ouvir uma coisa e o seu oposto”.
“Isso se tornou uma experiência bastante frustrante e confusa, e não havia jeito de compreender, eu que vivi todos os meus 30 anos de experiência missionária fora do centro de Roma, em uma pequena e periférica comunidade no norte da África”, contou.
Sammut também disse que o processo sinodal não permitiu que houvesse tempo o suficiente para a reflexão ou oração de maneira que os prelados pudessem considerar os diferentes pontos de vista que escutavam.
“Papa mim, o ponto fraco desse método foi que não havia tempo suficiente para um processo de discernimento verdadeiro”, falou ela às religiosas.
“Quando se têm diferenças muito grandes, como se pode juntar todas elas?”, perguntou-se.
Os prelados precisavam de “mais tempo de oração para digerir tudo aquilo e para distinguir os movimentos do Espírito, também para não falar do que se deseja pessoalmente (...) mas o que o Espírito parece estar dizendo à Igreja”, disse.
A líder da UISG também falou de sua experiência em participar de um dos 13 pequenos grupos de discussão do Sínodo, divididos segundo a preferência linguística. O tempo no grupo em que participou foi “uma das melhores partilhas” no Sínodo, segundo a religiosa.
“Dentro de meu grupo, todos os tipos de famílias estavam presentes, com as suas alegrias e problemas”, falou. “Não existe um ideal, uma família perfeita”.
“A imagem que me veio depois desta partilha foi a do Cristo Ressuscitado mostrando-nos as suas feridas”, completou. “Achei importante para mim deixar os meus olhos da fé encontrar o Cristo ferido e ressuscitado em cada uma das famílias sobre as quais estávamos falando”.
Os debates mais difíceis no Sínodo aconteceram quando os prelados estavam considerando algumas questões tais como a forma como a Igreja trata as pessoas divorciadas e recasadas, disse Sammut.
“Durante esta parte do encontro, percebi o quanto é difícil ser um bispo. Fiquei sentida pelos bispos. É a primeira vez em minha vida que sinto isso”.
“Eles precisam sustentar a doutrina da Igreja ao mesmo tempo dando conta das necessidades pastorais de cada pessoa em suas dioceses”, continuou ela, dizendo que eles querem “mostrar um rosto acolhedor de Deus enquanto ainda mantêm a disciplina da Igreja”.
“Como se tornar livre o suficiente para ir além do medo?”, disse ela sobre as considerações dos bispos.
Os católicos divorciados e recasados estão atualmente proibidos de receber a Comunhão na Igreja, a menos que recebam a anulação do casamento anterior.
Ainda que o documento final do Sínodo proponha que tais pessoas devam discernir sobre as decisões a respeito de suas vidas espirituais de forma individual, juntamente com a orientação de sacerdotes, Sammut disse que as deliberações aqui foram difíceis.
“Uma coisa que me chocou bastante é que algumas pessoas estavam falando em não abrir o Sacramento da Penitência aos divorciados e recasados”, disse. “Um dos motivos que às vezes era apresentado (...) era que outros católicos ficariam escandalizados se vissem estas pessoas indo para a Comunhão, ou em vê-las readmitidas aos sacramentos”.
“Que tipo de cristãos, então, estamos fazendo dos bons cristãos?”, perguntou-se Sammut. “Como pode um bom cristão querer privar os demais daquilo que é importante e necessário para a vida alheia?”
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Líder religiosa pede a Irmãs que façam o serviço inacabado do Sínodo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU