26 Abril 2019
A religião voltou depois de décadas de marchas fúnebres e obituários que haviam anunciado seu definitivo desaparecimento. Pelo menos é o que certificou o respeitado Pew Research Center nas quarenta e quatro páginas que compõem o dossiê intitulado A Changing World: Global Views on Diversity, Gender Equality, Family Life and the Importance of Religion (Um mundo em mudança: visões globais sobre diversidade, igualdade de gênero, vida familiar e importância da religião). Tabelas, dados e, acima de tudo, entrevistas (trinta mil) realizadas em vinte e sete países do mundo para demonstrar que - exceto a Europa, embora ali também haja algumas exceções notáveis - em toda parte a religião é considerada uma parte decisiva da própria existência que mereceria um maior espaço na sociedade.
Baixe o estudo do Pew Research Center aqui.
A reportagem é de Matteo Matzuzzi, publicada por Il Foglio, 25-04-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
O grande sociólogo Rodney Stark já havia analisado o fenômeno anos atrás, negando algumas das falsas historinhas transmitidas de geração em geração - não é verdade que, por exemplo, nos séculos passados se frequentasse a igreja mais do que agora - e profetizando que o crescimento exponencial do cristianismo irá estancar na África subsaariana, mas continuará na Ásia, especialmente nos países mais avançados. E de qualquer maneira, enfatizava Stark, o crescimento de uma religião não é um fenômeno linear e contínuo: vive de fases, uma hora cresce, outra cai.
Massimo Introvigne, sociólogo e diretor do Cesnur (Centro de Estudos sobre as Novas Religiões), está perplexo: "Costumo ser mais cauteloso que outros em aceitar integralmente tudo que o Pew Research Center produz, que estuda a religião com pesquisas aleatórias, método que certamente não dá respostas definitivas neste campo", afirmou ele ao Foglio.
"Os sociólogos estão bem cientes da grande diferença de dados que se obtêm, por exemplo, quando se pergunta a uma amostra representativa de italianos se frequentam a missa regularmente (estamos acima de 30%) ou quando se contam aqueles que efetivamente entram nas igrejas no fim de semana em áreas representativas do território (estamos abaixo de 20%). Os dados são semelhantes em outros países. Posta essa premissa, os dados do Pew Research Center podem, por sua vez, induzir ao erro. O que está crescendo é a opinião segundo à qual a religião é hoje mais importante na vida social do que vinte anos atrás. Os dados são óbvios: a mídia fala mais sobre isso e, em geral, por motivos negativos, como a pedofilia dos padres católicos ou o terrorismo de matriz islâmica. Mas essa opinião não significa que o entrevistado pense que isso seja algo bom. De acordo com a pesquisa, nos Estados Unidos, 57% têm uma opinião negativa sobre esse retorno à religião, assim como 40% na Itália contra os 28 que têm uma opinião positiva (pode ser lido na página 37 do relatório)”, observa Introvigne.
"Bastante diferente - acrescenta - e, na minha opinião, mais significativo, é a pergunta feita ao entrevistado se, em sua experiência pessoal e concreta, a religião é importante (p. 40-44). Na realidade, o número de pessoas que consideram a religião "muito importante" em suas vidas caiu quase em todo o Ocidente se olharmos para os dados de 2002 (o próprio Pew nos diz que olhar os dados 2017 é enganoso, a diferença é muitas vezes mínima e a oscilação é esperada): nos Estados Unidos - um país muito mais religioso que a Europa - de 59% para 47, na Itália de 27 para 19, na Polônia de 38 para 26. Permanece substancialmente estável em níveis baixos nos outros países da Europa Ocidental e estável em altos níveis na América Latina. Cresce na África e na Ásia, com exceção do Japão, onde os escândalos relacionados a grupos religiosos e o processo e execução dos responsáveis pelo atentado terrorista no metrô de Tóquio perpetrado pelo novo movimento religioso Aum Shinri-kyo em 1995 desferiu um golpe decisivo contra a religião. Em essência, os entrevistados pelo Pew Research Center notam que as mídias falam muito mais sobre religião do que há vinte anos atrás, mas não estão satisfeitos com o fato que a religião tenha um papel maior no mundo e o percebem mais como uma ameaça e um perigo - exceto na África e em alguns países asiáticos”.
No entanto, olhando para os dados relativos à Europa, surge a pergunta: estamos realmente certos de que aqui a secularização domine e que sob a espessa camada de secularismo (declinada de acordo com as formas próprias de cada país) não resista uma espécie de alma religiosa? Não seria porque a laïcité serve como uma explicação mais simples e banal para uma realidade muito mais complexa?
Afinal, continua fresca na memória a imagem dos milhares de jovens que se ajoelharam nas calçadas de Paris diante da fogueira da catedral de Norte-Dame, entoando a Ave Maria e elevando orações a Sainte-Geneviève, a padroeira da capital, para que protegesse a igreja. "As teorias da secularização clássicas (mais modernidade significa automaticamente menos religião) foram abandonadas pela grande maioria dos sociólogos já há mais de vinte anos, embora existam bolsões de resistência e ‘últimos suspiros’ na Europa e até na Itália", explica Massimo Introvigne.
"Na verdade, o que está diminuindo na Europa é a influência social e política da religião, e também há menos pessoas que participam dos ritos religiosos (é a chamada macro-secularização). Mas não há, ou há muito menos, a micro-secularização, no sentido que uma sólida maioria de europeus continua a cultivar uma vasta constelação de crenças religiosas - a maioria derivada do cristianismo, mas às vezes com contribuições exóticas, como a teoria de reencarnação - que não os leva a ir à missa ou a um culto protestante, e talvez nem sequer se declararem religiosos quando o Pew Research Center os entrevista, mas certamente influencia sua vida cotidiana de maneiras inclusive bastante importantes”.
Entre os países que mostram um mais ativo "retorno aos religiosos", há vários asiáticos. Considerando a complexidade deste continente, extremamente diferente em seu interior, é um exagero dizer que esse "retorno" poderia exacerbar os problemas de convivência no mesmo território entre diferentes crenças? Vamos considerar o caso do Sri Lanka e suas 359 mortes – balanço ainda provisório, mas suficiente para tornar o massacre da manhã de Páscoa o mais grave, em termos de número de vítimas, desde os atentados de 11 de setembro de 2001. Ali, a presença budista, não certamente terna no que diz respeito à minoria cristã, se faz sentir.
Assim como é útil pensar sobre a situação delicada no Mianmar e no Paquistão. "Já mencionei a exceção japonesa", ressalta Introvigne, que continua: "Se olharmos para os dados - para mim mais relevantes - do papel da religião na vida pessoal do entrevistado (não sobre a sua opinião quanto à presença da religião na sociedade, que aliás é a sua opinião sobre a presença da religião na mídia), o nível permanece constante na Índia, nas Filipinas e na Indonésia, em padrões muito elevados em relação aos ocidentais. Sabemos como o hinduísmo na Índia, o catolicismo - e em algumas regiões o islamismo - nas Filipinas e o islamismo na Indonésia têm um papel central e influente também na vida política. Os dados mostram um crescimento da religião na Coreia do Sul, que é bem conhecido dos estudiosos e se deve principalmente ao avanço do cristianismo e ao florescimento de novos movimentos religiosos. Certamente, onde quer que os números sejam muito altos, sinal do que os antigos sociólogos chamavam de ‘efervescência religiosa’, as chances de choque entre as religiões crescem. O choque pode ser simplesmente midiático, como acontece na Coreia, onde os cristãos tradicionais atacam com uma virulência que seria impensável no Ocidente os novos movimentos religiosos, ou violentos como no Sri Lanka ou no Paquistão, ou em certas áreas da Índia".
Há uma ausência bastante significativa, observa o diretor da Cesnur: "É surpreendente que falte a China, onde as pesquisas estatísticas estão sujeitas a fortes restrições do governo. Eu administro um jornal sobre a religião na China publicado em oito línguas, Bitter Winter. Documento cotidianamente como sob a presidência do sorridente Xi Jinping, a repressão contra as religiões seja a pior desde a morte de Mao. Mas também documente como, apesar da repressão, as religiões continuem a crescer".
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