12 Janeiro 2012
A difusão do cristianismo fora da Europa redesenha as estratégias das Igrejas (sobretudo a católica). Na véspera de um novo consistório, uma entrevista com o sociólogo Rodney Stark.
A reportagem é de Maria Antonietta Calabrò, publicada no caderno La Lettura do jornal Corriere della Sera, 08-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Considerado um dos mais renomados sociólogos da religião, professor de Ciências Sociais da Baylor University e antes da Washington University, professor honorário da Universidade de Pequim, Rodney Stark é autor de mais de 30 livros e também de inúmeros artigos científicos.
Em seu último livro publicado pela HarperCollins (The Triumph of Christianity), ele analisa o crescimento e a difusão do movimento originado por Jesus Cristo, desde o início até os nossos dias. Dos 12 apóstolos até os 2,18 bilhões de pessoas (cerca de um terço da população do planeta) que se definem como cristãs neste início de 2012 e fazem do cristianismo a religião mundial mais difundida e a que parece estar mais adaptada para a era da globalização.
"Talvez, a característica mais marcante da fé cristã – observa Stark – é a sua capacidade de se misturar com qualquer cultura humana. Assim como a Bíblia foi traduzida para muitos milhares de línguas, do mesmo modo há milhares de confissões cristãs, mas cada uma delas é autêntica, porque a mensagem básica é verdadeiramente universal".
Eis a entrevista.
As últimas estatísticas do Pew Forum Research demonstram que a Europa não domina mais a cristandade global como há 100 anos. Hoje, ao contrário, o maior número de cristãos vive no Novo Mundo. As Américas do Norte e do Sul têm juntas o maior número absoluto e a maior porcentagem de cristãos. Quase 40% dos cristãos de todo o mundo (37%) vivem nas Américas, onde quase nove em cada dez pessoas são cristãs (86%). Ao mesmo tempo, os três países com a população cristã mais numerosa, isto é, os EUA, o Brasil e o México, estão na América. Esses dados sugerem que perguntemos a você se Cristo hoje não é, acima de tudo, americano.
Neste momento, o cristianismo europeu carece de fiéis comprometidos. Essa minha afirmação se torna verdadeiramente óbvia quando consideramos as estatísticas sobre os cristãos "ativos", isto é, aqueles que frequentam a igreja regularmente. Se nos basearmos nos números daqueles que vão à igreja, a África é o continente mais cristão, embora a África seja superada pelos dados combinados dos cristãos praticantes nas Américas do Norte e do Sul.
Por que há essa predominância do continente americano dentro do cristianismo globalizado?
Em parte, isso se deve ao extraordinário incremento da prática da fé católica na América Latina, por causa – permita-me usar esta palavra – da "competição" com um protestantismo rapidamente crescente na mesma região, onde o pertencimento protestante é mais forte, assim como a frequência católica à prática religiosa, com o resultado final de que a América Latina é muito mais cristã e observante hoje do que era há apenas alguns anos.
Falemos da América do Norte e, em particular, dos EUA. É impressionante notar que todos os três maiores "desafiadores" republicanos nas primárias sejam muito caracterizados do ponto de vista religioso, o que confirma o peso do cristianismo na vida pública norte-americana. Mas, ao mesmo tempo, eles pertencem a confissões cristãs diferentes: Mitt Romney, mórmon; Rick Santorum, católico; Ron Paul, batista. Por que isso acontece?
O pluralismo é a chave da vitalidade da religiosidade americana, assim como do desenvolvimento da civilização cristã. Esse foi o "milagre" que colocou os americanos em ação em relação à fé, com o resultado de que, se em 1850 cerca de um terço dos americanos pertenciam a uma congregation, isto é, a um grupo religioso organizado localmente, no início do século XX metade dos americanos pertenciam, e hoje esse dado subiu para 70%. Todos os políticos de sucesso em nível nacional dos dois maiores partidos pertencem a uma congregation.
A África subsaariana e a Ásia Oriental têm hoje uma população total de cerca de 800 milhões de cristãos, um número semelhante ao das Américas. A Nigéria é o país africano com o maior crescimento de cristãos e, infelizmente, também de mártires. Se continuarmos usando a imagem de antes e se, hoje, digamos assim, Cristo é americano, amanhã Cristo será africano? E isso é ainda mais importante hoje, às vésperas de um novo consistório que irá redefinir os pesos do Conclave: o próximo papa será negro?
As minhas estatísticas, baseadas em pesquisas da Gallup em cerca de 160 países, mostram que há muito mais católicos na África do que indicam os dados oficiais da Igreja. Aparentemente, o crescimento foi tão rápido que até os padres locais perderam a conta. De fato, abaixo do Saara, o cristianismo está crescendo mais rapidamente do que o Islã. Você me pergunta se isso levará à eleição de um papa negro? Eu respondo: ainda não houve um papa que proviesse do hemisfério ocidental, isto é, das Américas. Mas eu não estou qualificado para fazer previsões sobre questões de política da Igreja.
Do ponto de vista sociológico, o cristianismo europeu realmente acabou? E como avaliar o crescimento da presença islâmica na Europa?
Há uma notável possibilidade de um renascimento religioso no Velho Continente. É bem sabido que as taxas de fertilidade na Europa caíram muito abaixo do nível de substituição. Mas nem todos os grupos têm uma baixa fertilidade. Quem participa ativamente da vida de uma Igreja tem taxas de fertilidade muito acima da cota de substituição. Consequentemente, a população que vai à igreja está crescendo, enquanto a população secularizada declina, e as futuras gerações de quem frequenta a igreja poderá superar em número aqueles que não a frequentam. Assim, as igrejas europeias poderão ficar repletas. Infelizmente, não posso prever o que vai acontecer na relação entre cristãos e muçulmanos na Europa.
Os dados do Pew Forum Research afirmam que a China tem a maior minoria cristã do mundo. Você estudou o incremento do cristianismo na China e o considerou um exemplo do que você chama de "vitória da razão". Pode nos explicar o fenômeno?
O rápido crescimento do cristianismo na China reflete a adequação universal da fé e, especialmente, a sua compatibilidade com a modernidade, ao contrário do que se pode pensar. Fundamentalmente, o cristianismo é uma religião da razão, no sentido de que sempre tentou explicar o seu ensinamento básico. Ele oferece respostas razoáveis a perguntas fundamentais. E o faz com base no fato de Deus ser a essência da razão, e a sua criação é tão racional que pode ser explicada e entendida: essa é a base da ciência. Ao contrário, as religiões orientais não dão explicações, mas só meditações. Os chineses estão verdadeiramente conscientes da compatibilidade do cristianismo com a ciência e a economia modernas. E o cristianismo atualmente é mais forte entre os chineses mais imersos na modernidade, e as melhores universidades chineses são muito mais cristãs, evidentemente, do que as universidades americanas.
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Cenários para um papa americano. Entrevista com Rodney Stark - Instituto Humanitas Unisinos - IHU