17 Janeiro 2019
O teólogo Eugen Drewermann foi suspenso a divinis, perdeu a autorização para pregar e ensinar e, por fim, saiu da igreja. Para o Bispo de Hildesheim, Heiner Wilmer, no entanto, Drewermann é um profeta.
A entrevista é de Madeleine Spendier, publicada por Katholisch.de, 14-01-2019. A tradução é Luisa Rabolini.
O Bispo de Hildesheim, Heiner Wilmer, recentemente fez referência a Eugen Drewermann em suas afirmações sobre o escândalo dos abusos. Sua obra em três partes "Estruturas do mal" foi, a seu dizer, de acordo com a maneira de ver atual, profética como seu livro "Funzionari di Dio. Psicogramma di un ideale” (Funcionários de Deus. Psicograma de um ideal, em tradução livre).
O que Drewermann diz sobre isso? Katholisch.de fez essa pergunta a ele - e falou com ele sobre o clericalismo e a crise da igreja.
Professor Drewermann, o Bispo de Hildesheim, Heiner Wilmer, recentemente definiu o senhor um profeta. O que pensa disso?
Parece um conceito exagerado. Conheço pessoas que em nome da verdade foram ao encontro da morte. Não sei se eu o faria. De qualquer forma, eu não me veria como um profeta.
Em seus livros escreve que o clericalismo seria a porta de entrada para os abusos. O bispo Wilmer pensa da mesma forma?
Os sacerdotes deveriam ser uma ponte entre o céu e a terra, em vez disso cometem crimes horríveis. O discurso autoritário, de cima para baixo, na Igreja não funciona mais. A santidade do estado clerical acabou. Quando um bispo leva essas reflexões a sério, tem consequências de longo alcance. O bispo Wilmer não terá vida fácil se as aplicar às estruturas eclesiais. Alguns de seus coirmãos já estão de olho. Mas ele será capaz de suportá-lo.
O senhor o encoraja?
Sim, com certeza. Eu suponho que ele tem refletido muito sobre isso e que não o tenha dito apenas por capricho. Ele é um lutador e um homem que inspira confiança, e ainda é jovem. Ele deveria continuar a dizer claramente o que pensa e o que vê. E não deveria se deixar dissuadir pelos outros bispos ou ser intimidado por eles.
O que deve mudar na preparação dos sacerdotes para restabelecer a confiança em relação a eles?
Algumas coisas. O número de sacerdotes estão caindo e, portanto, também o que se pretende daqueles que são ordenados. A Igreja exige a continência sexual do clero como ideal. Os protestantes já criticaram enfaticamente este ideal. Somente a Igreja católica acredita que pode ainda se permitir manter sob controle pulsões e inclinações. Toda sensação de prazer é declarada pecado mortal e deve ser reprimida. Como pode um sacerdote desenvolver uma sexualidade saudável? A fixação neurótica que se segue é até mesmo definida como uma específica eleição para o presbiterado. A maioria dos crimes sexuais são cometidos contra garotos, isso é suficientemente alarmante.
Qual é a sua explicação?
Eu só posso explicar desta forma: para os sacerdotes, e para aqueles que querem se tornar padres, os contatos com as mulheres ou com as garotas são proibidos, mas não os contatos com os garotos. Então se coloca em movimento um desenvolvimento errado que pode dar origem a profundos sentimentos de culpa. Poucos são os sacerdotes que no início de suas preparações cometeriam abusos contra crianças. Geralmente um crime assim se desenvolve lentamente e depois escapa a qualquer controle. Pessoas que vivem essas pulsões neuróticas não podem ser desviadas delas por transferências. Elas estão doentes! Se ao contrário um sacerdote desenvolve uma sexualidade normal e tem sentimentos por uma mulher ou por um homem, e reconhece isso, então ele é expulso. Eu acho isso duplamente estranho.
O senhor acredita que a obrigação do celibato deveria ser tirada?
Sim, urgentemente. Conheço homens maravilhosos que poderiam ser ótimos curadores de almas porque são casados. A Igreja deveria valorizar isso.
O que o senhor faz atualmente?
Neste momento, trato de uma perspectiva cristã sobre o direito penal: como devemos nos comportar com pessoas que se tornaram culpadas sem querer isso? Isto também se aplica a muitos sacerdotes. Eles próprios são vítimas de uma tragédia. Não existem perpetradores de crimes que não tenham se tornado eles próprios vítimas. Como devemos nos comportar com eles? Esta é uma questão importante para mim. Jesus diz: "Não julgais." Mas se assim fosse, por que precisaríamos de um direito penal?
Neste ponto, acredita na ressurreição?
Estou convencido de que a morte nos abre a barreira à eternidade de Deus e nos fará encontrar em um movimento de amor.
Pensa que no céu o senhor também poderá se reconciliar com o arcebispo Johannes Degenhardt, que tirou sua autorização para ensinar e pregar e suspendeu-a a divinis?
Até mesmo os bispos são para mim apenas pessoas obrigadas, forçadas e limitadas. Eu não gostaria de estar em seu lugar nem por um dia. Eu não tenho absolutamente nenhum rancor contra o falecido arcebispo Degenhardt. Nunca tive problemas com ele. Ele foi colocado sob pressão pelo então Cardeal Joseph Ratzinger e, portanto, teve que me condenar. Posso entender isso. Mas o comportamento dele me mostra o quanto medo ele deve ter sentido. Ele nunca leu os meus livros, tenho certeza disso. É uma tragédia, como o medo pode mudar as pessoas. Na minha opinião, isso também aconteceu com Ratzinger. Certamente ele pensava que estava agindo corretamente. É muito culto, escreve muitos livros, mas ele precisaria urgentemente de experiências reais com as pessoas. O problema é que este pensamento nunca é posto psicologicamente em questão. Todo o inconsciente é removido unilateralmente da razão.
O que o senhor pensa sobre o Papa Francisco?
É uma pessoa correta, honesta. Mas quando em uma conferência de imprensa no avião uma vez ele disse: "Quem sou eu para julgar os outros?" teve que, em um curto espaço de tempo, recuar quanto à sua afirmação. A Congregação para a fé claramente assinalou a ele: "Você não é uma pessoa qualquer, Sr. Bergoglio, não tem opinião privada, você é o Papa. A homossexualidade é um pecado mortal, você precisa ensinar isso e nada mais." Considero a sua humanidade comovente. Espero que continue assim. Mas ele também precisa urgentemente de bons conselheiros.
Gostaria de assumir este compromisso?
Entendo dizer, primeiramente, teologicamente - toda a teologia sobre os temas principais deveria mudar. Estou tentando fazer isso há 40 anos. De um ponto de vista psicoterapêutico, não se pode aconselhar alguém que não escolha pessoalmente ser aconselhado. E para isso, é preciso uma boa razão. Geralmente por trás há sofrimentos reais ou uma crise que se torna muito difícil em um nível pessoal. Mas aqui, depois do abuso por parte do clero, trata-se do ato de silenciar, de transferir, de impedir o acesso à justiça do estado. Os bispos locais são aqueles que, agindo desta forma, permitiram a continuação de comportamentos criminosos. Manter o silêncio sobre os abusos sexuais já tinha sido ordenado pelo Papa João Paulo II. Inclusive seu sucessor continuou nessa linha, para afastar danos para a igreja. Não foi um erro apenas dos bispos individuais, era o estilo da igreja. O Papa Francisco reconheceu isso agora e está comprometido a opor-se. Nisso eu o apoiaria.
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"Drewermann, 'suspenso a divinis', é um profeta", afirma bispo alemão. Entrevista com Eugen Drewermann - Instituto Humanitas Unisinos - IHU