01 Outubro 2018
“A leitura do mundo juvenil pressupunha uma leitura dolorosa, mas real – como o Papa Francisco insiste muitas vezes – do mundo atual.”
A opinião é de Vinicio Albanesi, padre e professor do Istituto Teologico Marchigiano, presidente da Comunidade de Capodarco desde 1994 e fundador da agência jornalística Redattore Sociale e, junto com o Pe. Luigi Ciotti, da Coordenação Nacional das Comunidades de Acolhida (CNCA) da Itália.
O artigo foi publicado em Settimana News, 30-09-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Com experiência limitada aos jovens “difíceis” (toxicodependentes, migrantes, mulheres solitárias, crianças abandonadas...), a minha leitura dos documentos preparatórios do Sínodo não desperta nem alegria nem curiosidade.
Lendo o documento preparatório e o Instrumentum laboris, as sensações são ambivalentes.
O esforço, depois da Evangelii gaudium do Papa Francisco e dos dois sínodos sobre a família, de se ocupar com os jovens certamente é louvável.
Os jovens fazem parte do futuro e, mesmo que hoje tenham responsabilidades limitadas, proporcionais à sua idade, o futuro depende deles; quando se tornarem adultos, terão que enfrentar a vida e também... os jovens que sobreviverem. Portanto, era justo que um Sínodo da Igreja universal se ocupasse deles.
O esforço de leitura da condição juvenil é completo e correto. O único limite é que parece uma leitura anônima; também científica, como o evento Sínodo permite; infelizmente, o diálogo com os jovens assim estabelecido nunca funcionará: isso não significa que a reflexão sobre a idade juvenil não ajude os adultos e toda a Igreja. O diálogo pressupõe a relação. Nesse caso, por um lado, o solene aparato da Igreja Católica e, por outro, o imenso grupo de jovens que habitam o mundo.
Descrever esse mundo não é suficiente; no máximo, uma atenção “devida”, mesmo que apreciada para alguns.
Não se pode falar de outros sem um feeling mínimo com os interlocutores, construído com humildade e disponibilidade: prevendo também a rejeição.
Os adultos do Sínodo nunca falam de si mesmos. São descritas as condições de dificuldade daqueles que devem enfrentar a vida, sem uma referência de responsabilidade àqueles que prepararam esse mundo difícil para eles.
Os jovens estão em linha direta com aqueles que os fizeram nascer, cuidaram deles e lhes prepararam o mundo que conhecemos.
Eu acredito que seja correto pedir perdão por aquilo que não foi feito ou foi feito mal. É um passo indispensável para quem deve enfrentar a vida.
Os âmbitos são muitos: da família à escola, da cidade à nação, do próprio país ao mundo inteiro.
Menciona-se nos documentos a internet. Como um jovem conectado da África ou do Extremo Oriente pode aceitar que, na nossa Europa, exista um bloqueio das entradas? Esse/a jovem busca um futuro melhor que lhe é negado por aqueles que – tendo-se declarado cristãos – fazem de tudo, até mesmo às custas de vê-lo/a morrer, para não ajudá-lo/a.
Que dor sofre um/a jovem que vê os próprios pais se separando, quando precisam de apoio e de proximidade?
Como é possível aceitar a evolução do último iPhone de mais de mil euros, diante de pobrezas extremas até a morte?
A leitura do mundo juvenil pressupunha uma leitura dolorosa, mas real – como o Papa Francisco insiste muitas vezes – do mundo atual.
A subestimação dos escândalos dentro da Igreja, pouco mencionados, não predispõe ao diálogo jovens-adultos. O jovem, precisamente pelo seu jeito de viver as coisas, quer clareza, distinguindo claramente entre o bem e o mal.
Na segunda parte, dedicada à fé e ao discernimento vocacional, não se pode responder citando Santo Irineu de Lyon, Jeremias ou o Livro dos Provérbios.
Não é um ultraje à doutrina ou à Sagrada Escritura: é apenas situar mal referências que estão ao alcance apenas de alguns milhares de rapazes e moças orientados à vida religiosa.
A observação nua e crua é que a Igreja atual não tem propostas precisas. Reconhece-se isso nos documentos. Quando alguém falou de “Jesus jovem”?
A preocupação teológica é orientada por sínteses antropológicas já relegadas entre os “adeptos aos trabalhos”.
Jesus é sacerdote, profeta e rei. Essas abordagens são simplesmente desconhecidas para as gerações mais jovens, porque a linguagem verdadeira e autêntica da tradição cristã foi elaborada em contextos hoje inexistentes. Basta pensar no conceito de pessoa utilizado para o mistério da Trindade.
O medo (e a preguiça) da proposta de fé, adequada ao mundo que muda, impediu a leitura vital do grande sonho do cristianismo.
Por fim, a proposta. Acredito que se deva recomeçar a partir das virtudes esquecidas ou contrapostas à cultura dominante. Afinal, o cristianismo é uma religião única porque não propõe nenhum mandamento. Ele faz uma proposta: amar a Deus e aos outros.
O Deus cristão é um pai amoroso, paciente e benigno. Criou o mundo como uma maravilha, embora limitado. Doou dois dons infinitos: a dignidade de cada criatura e a liberdade: do universo à terra, das plantas aos animais, oferecendo ao homem e à mulher o cuidado da vida, deles e daqueles que estão ao seu redor.
Em relação às outras criaturas humanas, ele recomendou que se comportassem como cada um espera para si mesmo: ser escutado, acolhido, ajudado, com mansidão, gratuidade, reconhecimento, perdão. Afinal, ele ditou regras de uma convivência pacífica e justa.
Descobrir esse rosto dá sentido ao porquê as pessoas se comportam de outro modo. Nesse ponto, é possível falar de Jesus, da história que o precedeu e da Igreja que se inspira na sua mensagem.
É um sonho porque as contradições são infinitas, embora acompanhadas de heroísmos e de testemunhas exemplares.
Que o Sínodo seja uma oportunidade para todos, cristãos ou não, para prometer que não se percam as indicações do grande Mestre, convocando aqueles que desejam o bem da humanidade.
Seria bonito, ao término do Sínodo, um apelo sincero e leal, indicando temas que são caros às gerações mais jovens: o ambiente, a paridade, os recursos para todos, o respeito recíproco.
Um último detalhe: se se quer falar com os jovens, é preciso se adequar ao seu esquema mental e às suas linguagens. A preocupação da completude e da ortodoxia não deve prevalecer sobre uma abordagem amorosa e benevolente.
Que a mudança de estilo e de conteúdos não seja apenas para os jovens interlocutores do Sínodo, mas também para todos os cristãos.
Afinal, somos os únicos – apesar das contradições – a querer agir gratuitamente pelo bem-estar de qualquer um. Não é pouca coisa em um mundo globalizado e mercantilizado que deixa pouco espaço para as emoções e as afetividades.
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Sínodo: existe uma proposta para os jovens? Artigo de Vinicio Albanesi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU