25 Mai 2018
Para Olav Fykse Tveit, do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), a visita do Papa Francisco a Genebra, prevista para acontecer no dia 21 de junho de 2018, equivale a reconhecer seus membros como verdadeiras “Igrejas”. O pastor luterano explica as questões desta “peregrinação ecumênica” do Pontífice à cidade internacional.
Cath.ch encontrou-se com Olav Fykse Tveit na sede do CMI em Genebra no dia 15 de maio de 2018. A entrevista foi realizada nesta ocasião e de maneira ecumênica, em parceria com a agência de notícias protestante Protestinfo.
A entrevista é de Raphael Zbinden e Joël Burri, publicada por Cath.ch, 22-05-2018. A tradução é de André Langer.
O que mudará com a visita do Papa?
A visita do Papa vem reforçar, na verdade, algo que já existe. Porque a excelente cooperação e relação com a Igreja Católica Romana é desde muito tempo uma realidade. É um parceiro muito importante para o CMI. Mas é verdade que esta visita será um acontecimento maior, um “umbral”, a partir do qual não será mais possível retroceder. A partir desse ponto, nós teremos que fazer ainda mais coisas juntos, mostrar de maneira mais clara que temos a mesma fé e uma agenda comum por um mundo melhor, por mais justiça e paz. Não apenas em Genebra, mas no mundo inteiro. Queremos fazer isso com um foco especial nos mais necessitados, nos mais pobres e nos mais marginalizados.
O lema da visita é “caminhar, rezar, trabalhar juntos”: isso também se materializará no campo teológico?
Nós discutimos os temas teológicos na nossa Comissão Fé e Constituição, da qual a Igreja Católica Romana é membro pleno. E os textos que foram produzidos também foram influenciados por uma teologia católica muito positiva. Gostaria de mencionar especialmente um documento assinado em 1982 sobre o batismo, a eucaristia e o ministério (BEM). Foi um trabalho muito minucioso para compreender o que ensinam as várias Igrejas nessas áreas. Houve com isso uma grande convergência. As Igrejas conseguiram encontrar uma expressão comum muito maior do que se poderia esperar.
A partir de então, nós nos concentramos na maneira como compreendemos a Igreja (universal). E é uma questão difícil. O principal obstáculo é a questão do primado do Papa. Deveríamos estar em comunhão com o Papa para fazer parte da Igreja universal? Essas discussões continuam, não apenas no CMI, mas também bilateralmente. Alguns desses diálogos avançaram muito mais em alguns países do que em outros.
Mas, para você, quem é o Papa? Ele é o bispo de Roma, o chefe da Igreja Católica, o garante da unidade dos cristãos...?
Como secretário-geral do CMI, vejo-o como o líder da maior comunidade cristã do mundo. Com uma responsabilidade especial de preservar o vínculo entre as várias comunidades, de conectar os fiéis à fé e manter vivo o apelo aos cristãos para que sirvam ao mundo. Assim, ele tem o papel de inspirar as outras Igrejas e de insistir na unidade dos cristãos.
Mas também para se concentrar naquilo que é importante. E o Papa Francisco faz isso de uma maneira muito atraente para os membros das nossas Igrejas. Especialmente na maneira como tornar a Igreja relevante para as pessoas, em relação à preocupação com os mais necessitados e os esquecidos. Nós temos um grande respeito e uma imensa gratidão por ele. Ele é o representante cristão mais conhecido e que goza de maior audiência. Em muitas questões, penso que ele fala em nome de todos os cristãos.
O objetivo final desta peregrinação é uma adesão da Igreja Católica Romana ao CMI?
Não necessariamente. O CMI não é uma Igreja, ao contrário da Igreja Católica. Nesse sentido, nós não somos entidades realmente comparáveis. Para o CMI, o objetivo é fortalecer os vínculos entre as Igrejas e não tornar-se uma grande instituição. Existem muitas expressões de unidade, para além da fusão institucional.
Esta reaproximação entre Igrejas é talvez fácil quando vista de Genebra ou de Roma, mas pode ser menos fácil de ser vista em algumas partes do mundo...
Você sabe, quando eu era jovem, muitos luteranos noruegueses pensavam que os católicos não eram cristãos, ou pelo menos não eram cristãos verdadeiros. Hoje, não é mais o caso. Então, mesmo na Europa, as coisas mudaram muito. Mas em muitas partes do mundo, há situações em que a Igreja Católica é majoritária em relação a pequenas Igrejas Protestantes, por exemplo, na América Latina. Claro que aí a coabitação é um desafio. Mas em regiões onde as confissões são mais paritárias, como em alguns países da África, as Igrejas trabalham intensamente juntas, às vezes mais do que na Europa, especialmente pela paz. Nem sempre foi óbvio que estejamos onde estamos hoje.
Por que a viagem do Papa é descrita como uma “peregrinação”?
O próprio Papa Francisco queria considerá-la assim. Eu penso que ele vê isso como uma visita de fé, inspirada por Deus. Esta não é uma visita “de negócios”, mas uma visita a irmãos. Essa metáfora da peregrinação também reflete a nossa vontade de estar em movimento, de mudar, essa abertura para os outros.
Em 2000, o Vaticano publicou o documento Dominus Iesus, que afirmava que as outras denominações cristãs não eram “Igrejas”, mas “comunidades eclesiais”. Um dos objetivos da visita é dar outra dimensão a este documento?
Em primeiro lugar, existem várias maneiras de interpretar a Dominus Iesus. Alguns veem este texto como um documento interno da Igreja Católica Romana, destinado a fortalecer a coesão. Lido de fora, o documento teve uma ressonância certamente maior do se espera.
Seja como for, a “linguagem corporal”, por assim dizer, da visita do Papa a Genebra é, em relação a isso, significativa: o Papa vem de Roma, para se encontrar conosco, com o CMI, uma comunidade de Igrejas. É para nós um grande reconhecimento do fato de que somos realmente Igrejas e que temos algo em comum. Para o grande público, isso certamente terá uma forte ressonância nesse sentido e permanecerá nas mentes. E, em contrapartida, nós também reconhecemos a Igreja Católica Romana como uma Igreja completa. Um aspecto que para alguns membros do CMI pode não ser tão óbvio.
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Francisco no Conselho Mundial de Igrejas - "Através da sua visita, o Papa reconhece que somos Igrejas”. Entrevista com Olav Fykse Tveit - Instituto Humanitas Unisinos - IHU