Sheinbaum aposta na visita do Papa em 2026 para fortalecer seu plano de paz contra a violência no México

Foto: @claudiashein/Fotos Públicas

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16 Dezembro 2025

A Secretária do Interior, Rosa Icela Rodríguez, está intensificando os esforços para facilitar a visita do Papa ao país, após quase 10 anos.

A reportagem é de Zedryk Raziel Inigo Dominguez, publicada por El País, 13-12-2025.

A última vez que um Papa visitou o México foi há quase 10 anos. Durante sua estadia, o então Papa Francisco visitou a cidade fronteiriça de Ciudad Juárez (Chihuahua), que anos antes havia sido a cidade mais violenta do mundo. Naquele dia de fevereiro de 2016, não houve um único homicídio na cidade. Real ou simbólico, tal é o poder do Papa no México, um país onde 78% da população se identifica como católica. O governo da presidenta Claudia Sheinbaum busca uma visita de Leão XIV, Papa desde maio, ao México já em 2026. O Vaticano, no entanto, indica que esse destino não está na agenda imediata do Papa, embora não o descarte. A iniciativa de Sheinbaum, além de satisfazer a fé dos fiéis, tem uma profunda dimensão política. Grande parte do plano de paz da presidenta se baseia nos valores de comunidade, solidariedade e família inerentes ao catolicismo. Na doutrina do Morena, partido governante, esses valores são como antídotos para aliviar um tecido social fragmentado, que intensifica a violência e amplia o domínio do crime organizado.

É fato também que a Igreja e seus representantes chegam a lugares onde o governo não tem alcance. No México, existem regiões inteiras controladas por cartéis, apesar das negativas oficiais. Ali, de norte a sul, de Chihuahua a Chiapas, passando por Guerrero, Michoacán e Tamaulipas, líderes religiosos atuam como mediadores entre o crime organizado e comunidades vulneráveis. São acordos de paz precários em meio à onda de violência que assola cada vez mais a população. Os representantes da Igreja, contudo, não estão imunes ao flagelo do narcotráfico, que já assassinou diversos padres locais. O clero tem se manifestado exigindo a ação do Estado e, apesar dos riscos, permanece na linha de frente, pregando o perdão, o amor ao próximo e a esperança.

Andrés Manuel López Obrador, fundador do Morena e antecessor de Sheinbaum na presidência, incorporou ao seu programa político uma visão de moralidade pública intimamente ligada à perspectiva católica. Independentemente de professar ou não essa religião — definindo-se como um "seguidor de Jesus Cristo" —, ele estava muito consciente das profundas raízes do catolicismo entre os mexicanos. O ex-presidente argumentava que enfrentar a crise da violência exigia combater suas causas profundas. Ele fortaleceu a abrangência dos programas de auxílio aos setores vulneráveis, principalmente os jovens, ao mesmo tempo em que distribuía um Manual de Moral nas escolas, um apelo contra a corrupção individual e o "comportamento antissocial".

Sheinbaum deu continuidade a essa linha, com uma mudança significativa na abordagem do uso da força estatal. Enquanto López Obrador se recusava a atacar diretamente os cartéis, um paradigma que ele denominou "abraços, não balas", Sheinbaum se baseou em investigações e inteligência para desferir golpes decisivos contra o crime organizado. A presidenta acredita no equilíbrio entre a força estatal e os fatores culturais. Nos últimos seis meses, a Secretária do Interior, Rosa Icela Rodríguez, realizou reuniões com representantes de diversos grupos religiosos, principalmente católicos, para fortalecer a estratégia do governo no combate às causas profundas da violência.

Fontes do governo federal confirmaram ao EL PAÍS que Rodríguez intensificou as negociações no Vaticano para garantir uma visita do Papa Leão XIV no próximo ano, a pedido da presidenta Sheinbaum. Caso isso se concretize, o México sediará dois grandes eventos internacionais em 2026: a Copa do Mundo e a visita do Papa às Américas. "Um Papa não pode ignorar o México", comentaram as fontes. Em números absolutos, o país latino-americano tem a maior população católica do mundo hispânico, com quase 98 milhões de pessoas, segundo dados oficiais. Esse número não inclui os milhares de migrantes que atravessam o México rumo aos Estados Unidos e que também professam a fé católica.

Agenda papal indefinida

Embora a importância do México no mundo católico seja inegável, a agenda de viagens do Papa para o próximo ano permanece em grande parte incerta. Robert Prévost, que nasceu nos Estados Unidos, mas passou quatro décadas na diocese do Peru, fez a primeira viagem de seu pontificado há duas semanas para a Turquia e o Líbano. A agenda de Leão XIV foi um dos principais assuntos de interesse para a imprensa que o acompanhava no avião papal, incluindo o jornal El País, e as perguntas de jornalistas de língua espanhola sobre se ele visitaria em breve a América Latina e a Espanha revelaram algumas pistas.

Em 27 de novembro, durante o voo para Ancara, ele disse aos enviados espanhóis que eles poderiam ter “mais do que esperança” de que ele visitaria a Espanha em breve. E em 2 de dezembro, no voo de volta de Beirute para Roma, ele afirmou estar considerando uma viagem às Américas, uma possibilidade que tem sido amplamente discutida, mas esclareceu que “o plano ainda não está finalizado”. Ele especificou que seria em 2026 ou 2027, se acontecer: “Estamos analisando a possibilidade”. “Obviamente, eu gostaria muito de visitar a América Latina. Argentina e Uruguai, que esperavam a visita do Papa. Peru, onde acredito que também serei bem recebido, e se eu for ao Peru, também visitarei outros países vizinhos”, acrescentou. Ele não mencionou o México, mas é possível que uma viagem à América Latina inclua esse país. É um projeto que ainda está sendo elaborado.

A única coisa que ficou clara foi que a próxima viagem internacional de Leão XIV será à Argélia, embora ele não tenha especificado a data. "Pessoalmente, espero ir à Argélia para visitar os lugares associados à vida de Santo Agostinho. Também para continuar o diálogo, a construção de pontes entre os mundos cristão e muçulmano", explicou o Papa, que pertence à ordem agostiniana. Ele acrescentou que também aproveitará a oportunidade para fazer paradas em outros países africanos, que não especificou, embora Camarões tenha sido mencionado.

A viagem de Robert Prevost à América Latina era considerada certa desde sua eleição, visto que ele não só é americano, como também cidadão peruano, tendo servido no Peru durante uma parte significativa de sua carreira eclesiástica. Primeiro, de 1980 até 1999, e depois novamente como bispo da cidade peruana de Chiclayo, a partir de 2014. No Peru, ele testemunhou em primeira mão os problemas da região, da pobreza e violência aos desastres naturais, e trabalhou em estreita colaboração com as pessoas mais vulneráveis, incluindo imigrantes.

Ele permaneceu no Peru até ser enviado ao Vaticano em 2023 como prefeito do Dicastério para os Bispos, cargo que ocupou até sua eleição como sucessor de Francisco em maio passado. No voo de volta a Roma, conversou com jornalistas sobre o impacto que sentiu no dia de sua eleição, mas mencionou especificamente que os anos que passou na América Latina o ajudaram a confiar em Deus: “Essa foi a minha espiritualidade por muitos anos, em meio a grandes desafios, vivendo no Peru durante os anos do terrorismo, sendo chamado a servir em lugares que eu jamais imaginaria ir”. Por essa razão, sua compreensão dos problemas da América Latina é muito profunda, e ele nutre grande empatia pelo continente.

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