02 Dezembro 2025
"A questão crucial, portanto, é esta: se entrarmos em guerra com a Rússia, os Estados Unidos se juntarão a nós ou nos tratarão como os ucranianos — vamos lhes fornecer armas para enfraquecer os russos, não para derrotá-los? A segunda opção parece menos improvável", escreve Luca Caracciolo, jornalista e analista geopolítico italiano, diretor da revista Limes, em artigo publicado por La Repubblica, 30-11-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Tambores de guerra ecoam na Europa. O ministro alemão da Defesa, Pistorius, alerta que a Rússia poderia atacar seu país e outros países da OTAN antes de 2029. O chanceler Merz afirma que a Alemanha ainda não está em guerra, mas também não está em paz. A Bundeswehr está deixando vazar detalhes sobre a mobilização de 800 mil soldados para conter uma potencial agressão de Moscou.
Nos países escandinavos e bálticos, e especialmente na Polônia, a sensação é de que uma invasão russa poderia ser iminente. Na França, Alemanha e Itália, estão planejando o retorno a alguma forma de serviço militar obrigatório ou o aumento das reservas, apesar da impopularidade de tais medidas. Nessa situação de emergência, até mesmo os cálculos eleitorais estão sendo deixados de lado em nome da segurança nacional.
Esse clima não diz respeito apenas à preparação das forças armadas, mas também à conversão da opinião pública à pré-guerra. Porque o conflito seria travado em todos os domínios estratégicos, a começar pelas comunicações, e envolveria a população civil em todos os sentidos. Acima de tudo, a condição de vitória seria a eliminação do front interno do inimigo antes de sua derrota no campo.
Nesses aspectos, nos quais partimos do zero, já estamos em modalidade bélica. Mas onde se situa a linha divisória entre prudência, prevenção de riscos e o acionamento de um mecanismo bélico semiautomático? Em outras palavras, é possível que, após oitenta anos de paz, um conflito devastador possa assolar a Europa sem que ninguém tenha decidido, de fato, desencadeá-lo? A resposta é sim. A história das duas únicas guerras mundiais, ambas eclodindo em solo europeu e — sinistra coincidência — ambas com a Ucrânia como campo de batalha estratégico, informa que a linha divisória entre guerra e paz foi cruzada por "sonâmbulos" ou agressores inconscientes de estarem desencadeando um conflito mundial.
E, nos duelos de propaganda e contrapropaganda, até que ponto podemos distinguir a desinformação da realidade? Sem mencionar os interesses industriais e financeiros que na atmosfera belicista veem incentivados programas de reconversão industrial de civil para militar. Muitos daqueles que anunciam publicamente a iminente agressão russa na frente oriental da OTAN, em privado, a descartam como provável, considerando as capacidades de Moscou antes que suas intenções. No entanto, não é preciso um diploma em psicologia para perceber que, de tanto martelar constantemente a iminência da guerra, pode-se acabar acreditando nela. E cair na armadilha. De ambos os lados.
A diferença é que o outro lado já está em guerra. Resta saber por que os europeus, temendo se tornarem alvos da Rússia, tenham ficado à margem das negociações informais para pôr fim, ou pelo menos amenizar, a guerra da Ucrânia. Assim contribuindo a convencer russos e estadunidenses da inutilidade de envolver os europeus em seus comércios semissecretos e nos quais a futura estrutura do que restará da Ucrânia é corolário de uma negociação global, como é costume entre potências que aspiram a um status mundial.
Portanto, o destino dos ucranianos e de nós outros, europeus, dependerá dos acordos ou desacordos entre Washington, Moscou e, por extensão, Pequim. Não somos donos do nosso destino, mas ficamos pensando que podemos decidi-lo. Muito se tem discutido nos últimos anos sobre uma nova Guerra Fria. Uma tese enganosa, especialmente após a explosão da verdadeira guerra em 24 de fevereiro de 2022. A paz europeia, conhecida como Guerra Fria, baseava-se na dissuasão, EUA-URSS, inimigos que se conheciam bem e reconheciam a esfera de influência bem delimitada um do outro.
A novidade é que hoje os Estados Unidos e a Rússia não são mais inimigos. Enquanto isso, nós, europeus, ficticiamente reunidos pela queda do Muro, requentamos memórias e estereótipos que ao longo dos séculos nos retrataram como opostos uns aos outros, a ponto de nos reduzir de impérios transcontinentais a atores não protagonistas. Feitos para se submeter, não determinar o próprio futuro.
A questão crucial, portanto, é esta: se entrarmos em guerra com a Rússia, os Estados Unidos se juntarão a nós ou nos tratarão como os ucranianos — vamos lhes fornecer armas para enfraquecer os russos, não para derrotá-los? A segunda opção parece menos improvável. É hora de apresentar soluções de negociação realistas e exigentes, participando assim voluntariamente para a prevenção da grande guerra na Europa.
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