25 Novembro 2025
"O espectro se estende ao longo de linhas evidentes, como o nexo entre Bíblia e liturgia, ou ecumênico e inter-religioso, ou o uso pastoral da mensagem bíblica 'Lâmpada para os meus pés é a tua palavra, e luz para o meu caminho' (Salmo 119,105)", escreve Gianfranco Ravasi, ex-prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado por em Il Sole 24 Ore, 23-11-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Naquela espécie de "corte dos milagres" que povoa o romance Notre-Dame de Paris (1831), de Victor Hugo, há também um alquimista: em seu laboratório, entre outras coisas, encontra-se uma inscrição grega, mega biblíon mega kakón, "grande livro, grande mal". O lema, que remonta ao poeta Calímaco (século III a.C.), havia sido adotado por um movimento literário que privilegiava epigramas curtos, elegantes e incisivos, ao contrário da epopeia expansiva de tradição homérica. Obviamente, esse princípio nem sempre é fundamentado, e é correto desmistificá-lo.
Isso se aplica a um livro que chegou recentemente às livrarias: fazia anos que eu não recebia um tomo tão monumental, com quase 2.200 páginas em formato grande e texto densamente pautado, apresentando por um dos últimos prefácios assinados pelo Papa Francisco. O título designa explicitamente o gênero: trata-se de um comentário completo sobre os 73 livros da Bíblia, não, porém, no rodapé da página (o texto sagrado, de fato, não é reproduzido, de forma que será necessário um exemplar da Bíblia ao lado), mas em um discurso contínuo de grande eficácia.
O formato, portanto, torna-se quase narrativo; contudo, todos os dados exegéticos são evidentes nas entrelinhas, assim como a instrumentação preliminar das introduções que delineiam as coordenadas e o equipamento necessário para empreender a subsequente jornada textual. Essa impressionante operação, que herda e transforma um experimento anterior intitulado mais explicitamente Grande Comentário Bíblico (1968) reuniu cerca de noventa estudiosos católicos de língua inglesa, de acordo com suas diversas competências.
As originalidades dessa obra são múltiplas e é difícil documentá-las em poucas linhas. Os levantamentos que realizei, selecionando os livros bíblicos mais "utilizados" para leitura pessoal ou comunitária, mas também incluindo algumas incursões nos "menores" (por exemplo, o profeta Obadias propõe um texto com apenas 291 palavras hebraicas, ao contrário de Jeremias, que chega a 21.819, e o mesmo ocorre com alguns livros do Novo Testamento), revelam uma significativa capacidade de transmitir todo o conteúdo e os dados que fundamentam a escrita dos diversos textos sagrados.
A abrangência da obra também se expressa também nas introduções já mencionadas: para exemplificar, tente folhear as premissas dos Evangelhos Sinópticos em sua totalidade e dos Evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas.
Uma adicional originalidade indiscutível deve ser descoberta no conjunto igualmente monumental de contribuições monográficas, postas nas duas extremidades do volume. Na abertura são esperados os mapas preliminares de geografia, arqueologia, história e vários contextos. Mais são inesperados os "Artigos Gerais" finais, nos quais gostaríamos de nos debruçar por constituírem uma espécie de livro autônomo de teologia e temática bíblica. Assim, temos um texto realmente novo que abrange a gama de múltiplas questões, especialmente hermenêuticas, que frequentemente afligem o leitor das Sagradas Escrituras. Para ilustrar, apresentamos aqui algumas abordagens, começando com a trilogia lexical e ideal que define a originalidade dos textos sagrados: revelação, inspiração e cânone. Quantas vezes, de fato, nos questionamos sobre o entrelaçamento entre divino e humano nas páginas da Bíblia, ou nos sentimos constrangidos diante do perímetro obrigatório dos livros bíblicos e perguntamos: por que estes 73 e não outros, ricos em espiritualidade, como o Evangelho apócrifo de Tomé, por exemplo?
O espectro se estende ao longo de linhas evidentes, como o nexo entre Bíblia e liturgia, ou ecumênico e inter-religioso, ou o uso pastoral da mensagem bíblica "Lâmpada para os meus pés é a tua palavra, e luz para o meu caminho" (Salmo 119,105). Mais desafiadora é a aplicação ética dessa mensagem: interessantes são as propostas metodológicas examinadas aqui e formuladas há seu tempo por Fritz Tillman, William C. Spohn e Yiu Sing Lúcás Chan, este último falecido em 2015 com apenas 47 anos e também completamente desconhecido para mim, mas interessante principalmente por sua obra Biblical Ethics in the 21st Century e pela rica variedade de suas pesquisas.
Em relação aos questionamentos inéditos que a contemporaneidade dirige ao texto sagrado, que continua sendo — como se costuma dizer — "o grande código da cultura ocidental", não faltam as análises da abordagem feminista, da abordagem social (cara à teologia da libertação), da referência contextual (africana e afro-americana, asiática e latino-americana) e da atenção cada vez mais viva à dimensão literária da Sagrada Escritura (sugestivas as leituras "retóricas" de algumas passagens bíblicas), desenvolvidas com grande criatividade.
Como qualquer um que nos tenha acompanhado até aqui compreenderá, é compreensível tanto a necessidade dessa multidão de estudiosos (infelizmente, devido a um hábito autárquico, suas bibliografias estão apenas em inglês), quanto a enorme massa do volume: quem o adquire, na verdade, adquire uma biblioteca inteira de comentários e análises das diversas disciplinas bíblicas, da qual se pode extrair material para as mais diversas questões e indagações.
Ainda nessa linha e com a mesma imponência (quase mil páginas), mesmo que com uma abordagem específica, podemos enfim destacar, da mesma editora, o Novo Testamento lido pelos judeus, organizado por M. Z. Brettler e A.-J. Levine (2023), uma obra surpreendente que conta com o envolvimento de cerca de oitenta estudiosos judeus.
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