Ucrânia: a corrupção e as Igrejas. Artigo de Lorenzo Prezzi

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21 Novembro 2025

O Conselho Ucraniano das Igrejas e das Organizações Religiosas, que reúne as 16 principais comunidades de fé (incluindo judeus e muçulmanos), tomou uma posição dura contra os escândalos de corrupção que envolveram algumas das altas esferas do Estado, inclusive pessoas muito próximas ao presidente Volodymyr Zelensky (16 de novembro).

O artigo é de Lorenzo Prezzi, teólogo italiano e padre dehoniano, publicado por Settimana News, 18-11-2025.

Um golpe duro

Enquanto o povo esgota suas forças para derrotar a agressão russa, manifestações de corrupção sem precedentes não são apenas prova de um profundo declínio moral, mas também uma traição à confiança do povo e ao Estado cometida por aqueles que se tornaram culpados desses crimes. A corrupção é sempre particularmente perigosa nos níveis mais altos do poder e em papéis-chave que garantem a capacidade defensiva do Estado, e isso é ainda mais verdadeiro hoje. Tais ações, de fato, ajudam o agressor porque minam a capacidade da Ucrânia de se defender, causando desmoralização.

Elas são um insulto àqueles que estão empenhados na luta contra as tropas de invasão russas. Consequentemente, as Igrejas exigem uma investigação rigorosa e uma punição justa para os culpados. Só uma resposta resoluta, honesta e responsável – tanto por parte dos órgãos e funcionários do Estado quanto da sociedade civil como um todo – pode ajudar a curar a ferida infligida, restaurar a confiança e demonstrar que o Estado defende a verdade e a justiça, e que é capaz de resistir não apenas às agressões externas, mas também aos desafios internos destrutivos.

O escândalo de corrupção, que envolve dezenas de milhões de euros, atingiu responsáveis por áreas estratégicas como energia nuclear, empresas de eletricidade e gás. Os ministros da Justiça e da Energia renunciaram, assim como oito altos funcionários. Também estão implicados o ex-vice-presidente O. Chernishov e o amigo pessoal do presidente, T. Mindich. Alguns já fugiram para o exterior. O escândalo ameaça colapsar um país já exausto após três anos de guerra.

A gravidade do caso também se deve ao envolvimento direto da sociedade civil no conflito. A surpreendente capacidade de resistência diante do enorme poder militar russo tem sido motivada pela inventividade e autonomia com que os cidadãos-soldados reagiram, criando formas locais de contenção e resposta às tropas estrangeiras, depois adotadas pelos responsáveis militares. Isso em continuidade com a participação civil nas “revoluções coloridas” das últimas décadas.

Sair do impasse

A reação firme e prudente das Igrejas está ligada ao antigo problema da corrupção, do qual elas próprias não estão isentas, mas sobretudo ao preço que estão pagando na construção de um sentimento nacional de uma democracia plena.

A divisão interna entre as Igrejas ortodoxas, causada pela autocefalia concedida por Constantinopla e aceita apenas por parte das comunidades (metropolita Epifânio), agravou-se pela indefinição quanto à situação das comunidades ainda formalmente ligadas a Moscou (metropolita Onufrio), alvo de uma lei que exige um esclarecimento definitivo sobre o tema.

Contra elas, foram abertos, nesses três anos de guerra, 78 processos criminais, envolvendo 27 hierarcas (incluindo metropolitas e arcebispos). Quarenta já foram condenados, entre eles quatro arcebispos. Dezenove altos hierarcas foram privados da cidadania, incluindo o metropolita Onufrio. No total, as medidas disciplinares envolvem 208 pessoas. A pressão administrativa e legislativa tornou-se pesada. Há centenas de processos civis e administrativos em curso contra mosteiros, comunidades e indivíduos consagrados acusados de conivência com o inimigo russo.

Nesse contexto, surgem tentativas, discussões e hipóteses para superar o impasse atual.

Registro duas. A primeira vem do teólogo Paul Pavel Liberman, que escreveu sobre isso no Orthodox Times (4 de novembro). Para evitar que a política determine o futuro das Igrejas ucranianas e sem violar as disposições do tomo de autocefalia já concedido, Liberman propõe um exarcado “temporário” para acolher aquela parte da Igreja “pró-Rússia” que deseja cortar definitivamente os laços com Moscou, mas que, por razões canônicas e teológicas, se recusa a unir-se à Igreja liderada por Epifânio.

O exarcado deveria ser acolhido pelo patriarca de Constantinopla em razão da economia pastoral e para evitar que Moscou ou o governo ucraniano conduzam o conflito eclesial. Ele constituiria um espaço de transição para aqueles dispostos a sair voluntariamente do Patriarcado de Moscou, aqueles que estão prontos para rever definitivamente seus vínculos com Moscou, mas que, por razões pessoais ou históricas, não podem reconhecer a autoridade do metropolita Epifânio.

Menos explícita, mas não contraditória, é a posição do arcebispo Silvestre (Stojčev) de Belgorod, reitor da academia de Kiev e vigário da metrópole da capital. Em um podcast publicado em 18 de setembro, o bispo, pertencente à Igreja não autocefala, defende a possibilidade de um reconhecimento pleno de autocefalia para a Igreja de Onufrio, a ser obtido mediante diálogo com Moscou e Constantinopla. Partindo das decisões radicais aprovadas pelo Concílio de Feofaniya (Kiev), celebrado em 27 de maio de 2022, o prelado considera que, após a “venda” da Igreja russa em favor de Putin, não há outro caminho senão avançar em direção à plena autonomia.

A posição desencadeou um tumulto e fez emergir aquela parte da Igreja de Onufrio que ainda está alinhada com Cirilo de Moscou, que denuncia perseguição e considera intolerável dialogar com quem apoia o cisma provocado por Bartolomeu de Constantinopla. Uma postura que, na prática, considera o Concílio irrelevante e deslegitima a condenação explícita de Onufrio à agressão russa. Além disso, ela justifica indiretamente a recente lei e as decisões canonicamente incorretas tomadas pelo Sínodo de Moscou sobre as dioceses dos territórios ocupados, contradizendo a prática de Igrejas próximas, como as polonesa, sérvia, búlgara e georgiana, que, embora não aceitem a autocefalia de Epifânio, continuam em plena comunhão com Constantinopla.

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