31 Outubro 2025
"A ausência do Estado, aliada à indiferença das elites e à omissão de lideranças políticas e econômicas, gera um sistema que marginaliza, exclui e mata lentamente", escreve o Coletivo Padres da Caminhada, 29-10-2025.
Eis a nota.
O Coletivo Padres da Caminhada, formado por mais de 500 padres, diáconos e bispos de todo o Brasil, manifesta sua profunda solidariedade às famílias das vítimas da chacina ocorrida no Rio de Janeiro em 28 de outubro de 2025 e repudia a gestão arbitrária do Governo do Estado do Rio de Janeiro, responsável por mais este episódio de violência que ceifou vidas inocentes — inclusive de servidores públicos.
Inspirados no Evangelho — “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10) — reafirmamos que nenhuma política pública pode ser edificada sobre o sangue dos pobres. Toda forma de violência institucional fere o Evangelho e os princípios de um Estado Democrático de Direito.
As comunidades populares não são territórios inimigos, mas espaços de vida, fé e esperança. A verdadeira segurança nasce da justiça social e da presença transformadora do Estado, não da força das armas. A bala “não é perdida”: tem destino, cor e CEP, e continua a atingir, sobretudo, corpos negros, pobres e periféricos.
Onde reina o crime organizado é porque já não há presença do Estado como organizador da vida social e promotor de políticas públicas que viabilizem projetos de vida reais. Não é possível aceitar que vidas inocentes, tiradas em meio a uma guerra entre facções e forças policiais, sejam reduzidas a “erros residuais”, como afirmou o governador.
A ausência do Estado, aliada à indiferença das elites e à omissão de lideranças políticas e econômicas, gera um sistema que marginaliza, exclui e mata lentamente.
E é necessário perguntar, com coragem evangélica e compromisso social: de quem é a responsabilidade por tanta desigualdade que faz nascer os marginalizados?
Quem lucra com a dor e a miséria que se perpetuam nas periferias do Rio e de tantas outras cidades do Brasil?
Clamamos por investigação rigorosa e punição dos responsáveis, e por uma conversão social e política que priorize o diálogo, o perdão e o compromisso com a vida. A vida se defende com políticas públicas, não com armas.
Em comunhão e oração, unimo-nos às vítimas — civis, policiais e familiares — e reafirmamos nosso compromisso profético e pastoral com a justiça, a paz e a dignidade humana.
Basta de política de morte. Que a vida, dom de Deus, prevaleça.
“…chega de ser subjugado, subtraído, subnutrido,
um sub-bandido de um sub-lugar,
um subtenente de um sub-país, sub-infeliz…
mas essa história eu volto a repetir:
aconteceu numa cidade muito longe daqui,
que tem favelas que parecem as favelas daqui,
que tem problemas que parecem os problemas daqui.
E o bandido:
‘E se eu morrer, vem outro em meu lugar…’
Polícia:
‘E se eu morrer, vão me condecorar…
E se eu morrer, será que vão lembrar?
E se eu morrer, será que vão chorar?’”
- Canção de Acyr Marques/Arlindo Cruz/ Franco)
Leia mais
- Massacre no Rio de Janeiro: “Quanto tempo uma pessoa precisa viver na miséria para que em sua boca nasça a escória?”. Entrevista especial com José Cláudio Alves
- No combate ao crime, o pobre é subumano e descartável. Artigo de Ynaê Lopes dos Santos
- Governador chama operação com mais de cem mortes de sucesso
- Do CV ao PCC, como opera o crime organizado no Brasil?
- Como a guerra entre grupos criminosos fez a violência explodir na Zona Oeste do Rio
- Oposição usa chacina no RJ para defender lei que facilita intervenção dos EUA no Brasil
- O Comando Vermelho, grupo carioca focado no narcotráfico, conta com 30 mil membros e está em expansão
- Megaoperação expõe disputa sobre gestão da segurança pública
- Rio de Janeiro: o desfile macabro da barbárie na passarela de sangue da Penha. Entrevista especial com Carolina Grillo
- Do Carandiru ao Rio de Janeiro: a dor que se repete. Nota pública da Pastoral Carcerária Nacional
- Rio de Janeiro: o desfile macabro da barbárie na passarela de sangue da Penha. Entrevista especial com Carolina Grillo
- O desastre de uma megaoperação no Alemão e na Penha de um governo que terceiriza o seu comando. Artigo de Jacqueline Muniz
- MPF e DPU cobram explicações de Cláudio Castro por operação letal no Rio
- Sensação de insegurança e medo leva Rio a noite de silêncio com bairros boêmios vazios
- Lula retorna ao Brasil e convoca reunião urgente para discutir crise de segurança no Rio
- Megaoperação no Rio tem saldo de 64 mortos, sendo 4 policiais: Bope permanece na mata à procura de corpos
- MPF e DPU cobram explicações de Cláudio Castro por operação letal no Rio
- EUA emitem alerta para viajantes no Rio após megaoperação contra o Comando Vermelho
- Volta para casa vira desafio no Rio após retaliação: sem ônibus, cariocas caminham quilômetros
- Megaoperação no Rio: Defensoria denuncia abusos na Penha e no Alemão
- ‘É uma violência injustificável’, diz pesquisadora sobre operação mais letal do Rio
- ONU pede ‘investigações rápidas’ após repercussão internacional de ação policial no Rio de Janeiro
 
                         
                         
                        