21 Outubro 2025
A organização ECA, que representa sobreviventes de 30 países, escreveu ao pontífice solicitando uma audiência e acredita que o encontro foi "esperançoso".
A reportagem é de Lorena Pacho, publicada por El País, 20-10-2025.
O Papa Leão XIV recebeu nesta segunda-feira no Vaticano um grupo de seis vítimas de abusos cometidos por clérigos católicos de diferentes países e vários membros do Conselho Global de Vítimas de Abuso (Ending Clergy Abuse, ECA).
As vítimas consideram que este encontro, que durou cerca de uma hora, foi "histórico" e "esperançoso" para uma maior cooperação com a Igreja Católica no futuro. Este é o primeiro encontro deste tipo que o pontífice realiza em seu curto pontificado, iniciado em maio passado, ou pelo menos isso se sabe, com uma foto e um comunicado oficial enviados pela Sala de Imprensa da Santa Sé.
Esta organização, que representa vítimas de abuso sexual clerical de mais de 30 países, enviou uma carta ao pontífice solicitando uma audiência privada, e Leão XIV respondeu convidando-os para o Vaticano. O grupo enfatizou que o encontro "marca um momento significativo de diálogo com a Igreja Católica".
Sergio Salinas Giordano, membro do conselho de administração da organização, advogado criminalista argentino que representou vítimas de abuso clerical em tribunais e que participou do encontro com o Papa, enfatiza em entrevista a este jornal que o encontro ocorreu em um clima "de diálogo, completamente cordial". Ele observa: "O Papa foi muito empático, muito gentil com todos e muito bem informado". Salinas conversou com ele sobre o "Caso Próvolo", no qual trabalhou como advogado e que é um dos escândalos de abuso sexual mais graves da história recente da Argentina. As vítimas são menores com deficiência auditiva que estudavam no Instituto Antonio Próvolo para crianças surdas, e alguns dos acusados já haviam recebido denúncias de abuso na Itália e fugido para a Argentina. "O Papa tinha conhecimento do caso, o que me surpreendeu", observa Salinas. E acrescenta: “Há alguns anos, viajei ao Vaticano com três surdos. Batemos à porta da Congregação para a Doutrina da Fé [órgão do Vaticano que trata de casos de abuso] e eles não nos deram atenção. A Igreja deveria ser um lugar seguro, mas hoje não é.”
Esta organização internacional decidiu escrever ao Papa Leão XIV logo após sua eleição, encorajada pelo histórico do agora pontífice na luta contra os abusos no caso Sodalício, no Peru. Quando era bispo no país andino, começou a ouvir as vítimas e a promover investigações oficiais. "Quando soubemos da sua história, começamos a acreditar neste Papa. Confiamos nele", observa Salinas.
A presidente da ECA e vítima canadense de abusos contra o clero, Gemma Hickey, enfatizou que o encontro com o Papa foi muito positivo. "Foi uma conversa profundamente significativa. Reflete um compromisso compartilhado com a justiça, a cura e a mudança real. As vítimas há muito buscam um lugar à mesa, e hoje nos sentimos ouvidas", disse ela em um comunicado. "Viemos não apenas para expressar nossas preocupações, mas também para explorar como podemos colaborar para garantir a proteção de crianças e adultos vulneráveis em todo o mundo", disse Janet Aguti, de Uganda, vice-presidente do conselho da ECA.
Tim Law, cofundador e membro do conselho da ECA USA, explicou que o objetivo da organização "não é o confronto, mas sim a responsabilização, a transparência e a vontade de trabalhar em conjunto para encontrar soluções".
Sergio Salinas explica que, durante o encontro, pediram ao pontífice três coisas, com as quais Leão XIV concordou: “Queríamos tirar uma foto com ele que servisse como imagem oficial, o que implica nos reconhecer como organização e reconhecer o problema; é uma mensagem para o mundo. Pedimos também que mantivesse uma comunicação direta com ele e que o contato fosse contínuo.” O objetivo é a colaboração. “Queremos estabelecer um diálogo construtivo com a Igreja, para além do confronto”, enfatiza Sergio Salinas.
Durante a reunião, representantes da ECA Global também compartilharam com o Papa sua iniciativa Tolerância Zero, que defende a expulsão da Igreja de pessoas envolvidas em abusos, mais sanções em vez de recomendações e um aumento na prevenção. Eles também enfatizaram "a importância de padrões globais consistentes e políticas centradas na vítima".
"Como sobrevivente de abuso em escola residencial, carrego o fardo do trauma intergeracional causado por instituições que deveriam nos proteger. A reunião de hoje é mais um passo no caminho em direção à verdade e à reconciliação", disse a vítima canadense Evelyn Korkmaz.
Matthias Katsch, da Alemanha, explicou em uma declaração que eles pediram ao pontífice "esperança por justiça, esperança por uma compensação justa e esperança por melhores salvaguardas para crianças e adultos vulneráveis".
A organização concluiu a reunião enfatizando "a necessidade urgente de diálogo contínuo, compaixão e colaboração para construir um futuro onde a segurança, a responsabilização e a dignidade não sejam apenas defendidas, mas onde as vozes dos sobreviventes liderem o caminho".
“A Igreja tem a responsabilidade moral de apoiar os sobreviventes e prevenir danos futuros”, disse Tim Law, cofundador da ECA e membro do conselho de diretores da organização nos EUA. Ele acrescentou: “Nosso objetivo não é o confronto, mas sim a responsabilização, a transparência e a disposição de caminhar juntos para encontrar soluções.”
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