28 Agosto 2025
Inicialmente, seu nome constava na lista de mortos. Mas Jamal Badah, fotógrafo do Palestine Today, é um dos três repórteres que sobreviveram na segunda-feira ao ataque do exército israelense ao Hospital Nasser de Khan Younis, que matou vinte pessoas, incluindo cinco jornalistas. Entre os sobreviventes estão também seu colega Hatem Omar e Mohammed Fayeq. Ele nos responde por vídeo, de uma maca meio destruída no hospital bombardeado. No rosto os sinais das bombas.
A entrevista é de Greta Privitera, publicada por Corriere della Sera, 27-08-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis a entrevista.
O que aconteceu?
Eram cerca de 10h15 da manhã quando fomos atingidos. Já estávamos no Nasser, que é uma das nossas bases onde dormimos e recarregamos os equipamentos. Após o primeiro bombardeio, subimos correndo as escadas para transmitir tudo o que estava acontecendo, mesmo que entre os mortos desta vez estivesse um nosso colega que trabalhava para a Reuters, o amigo Hossam Al-Masri. Como sempre, queríamos ser os primeiros a contar a verdade. Quando colocaram Al-Masri no saco preto para levá-lo para os andares de baixo, ligamos nossos celulares e continuamos filmando, apesar da tristeza. Naquele momento, veio o segundo ataque, desta vez dirigido contra nós.
Do que você se lembra?
Foi como se o mundo tivesse escurecido. Quando recobrei a consciência, abri os olhos e vi que todos ao meu redor estavam mortos, pedaços de seus corpos estavam sobre o meu. Fiquei preso por cerca de dez minutos, até que conseguiram me retirar dos escombros. Gritei por socorro, queria sair, mas todos estavam com medo. A situação era confusa. Os socorristas me viram e, graças a Deus, me tiraram e me salvaram.
O que vocês estavam fazendo antes do ataque?
Estávamos trabalhando. Entre nossas tarefas diárias está ir nas zonas atingidas, tirar fotos e filmar. Aquele dia foi difícil. Estávamos chocados com a morte de Hossam Al-Masri. Ele era um colega mais velho, que gostava da gente, se importava conosco, os mais jovens. Todas as manhãs passava um tempo junto, brincava, vinha nos fazer companhia. Hoje não consigo fechar os olhos.
Por quê?
Fico revendo a cena. Revejo Muaz Abu Taha sem cabeça. Ou Mohammed Salama cortado ao meio. Não tenho ideia de onde Mariam Abu Dagga foi parar. Naqueles longos minutos, temi um terceiro ataque, porque o segundo já tinha sido anômalo, então poderia acontecer de novo.
Ninguém esperava.
Não, sempre trabalhamos logo após um bombardeio; é claro que, se vier um segundo golpe, vai matar a gente, os homens das ambulâncias, os socorristas, os médicos. Ninguém pensava que estava em perigo: o ataque parecia ter acabado. Mesmo com os drones sobrevoando o hospital.
Como está agora?
Tanto o corpo quanto a alma estão doendo. É difícil, mas graças a Deus somos fortes e resistentes. Continuaremos a levar nossa mensagem ao mundo. Esperamos que a justiça chegue.
O exército israelense informou que os civis não são alvos.
Nós, jornalistas, somos civis. Meus colegas que morreram eram civis. Não temos fuzis, nem pertencemos a nenhum grupo armado. Não somos do Hamas nem da Jihad Islâmica. Somos apenas repórteres. Esse é o nosso trabalho. Não estamos combatendo o Estado sionista. As imagens são tudo o que nos resta, as imagens que mostram as crianças e as mulheres mortas. Os israelenses querem cobrir nossas objetivas; detestam que a verdade seja revelada. É por isso que Hossam Al-Masri e todos os outros morreram.
Você voltará a trabalhar no campo?
Sim, Inshallah. Não nos deixem sozinhos nessa injustiça. Todos vocês sabem que estamos ocupados; não temos armas nem facções; só temos nossos celulares e câmeras. Mesmo que queiram nos impedir de mostrar o mal que está acontecendo em Gaza e silenciar a nossa voz, não vamos parar.
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