10 Janeiro 2025
As crianças e os jovens deslocados agora vivem em Deir al Balah, em tendas.
A reportagem é de Fabrizio Geremicca, publicada por Il Manifesto, 09-01-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
“O pior é que as crianças perderam irremediavelmente a infância. Ela foi apagada pela guerra sem esperança e sem qualquer possibilidade de recuperação. Aos sete, oito anos de idade, já são adultas. Você observa seus rostos enquanto se esforçam para ajudar os pais e os irmãos mais velhos a buscar água, enquanto ficam na fila do pão, enquanto carregam pesos maiores do que eles ou pedem esmolas. Não choram mais. Vivem e pensam como adultos, não há mais nada que relembre a criança que eram antes da invasão israelense. Se eu tivesse que descrever o drama pelo qual Gaza está passando com uma imagem, essa seria a imagem. Depois, é claro, há as sirenes, os prédios destruídos com a poeira enchendo o ar, o fedor do lixo que ninguém recolhe e os esgotos. Há os funerais frequentes e inaturais dos jovens, as favelas formadas por centenas de milhares de pessoas acampadas em tendas sem eletricidade e, às vezes, até sem água potável e para se lavar”.
Essas são as palavras de Jamil Almajdalawi, 36 anos, nascido em Jabaliya, Gaza. Até março do ano passado, ele nunca havia saído da Faixa de Gaza. Quando o fez, foi para fugir com a dor no coração, o horror nos olhos e nenhuma certeza de que um dia poderia voltar. Ontem, Jamil estava em Nápoles para trazer seu testemunho sobre o massacre que está ocorrendo em sua terra e para contar uma história extraordinária e simples de resistência, aquela das crianças e dos jovens do Al Haddaf, time de futebol que reúne jovens palestinos, com idades entre 6 e 17 anos, vindos da cidade de Beit Lahiya, no norte de Gaza, agora totalmente destruída.
O Spartak San Gennaro, um time formado por garotos do popular bairro de Montesanto, da cidade napolitana, por meio do contato de um educador que esteve em Gaza no passado, fez uma parceria com o Al Haddaf. Em meio às muitas dificuldades de conexão com uma zona de guerra, eles trocaram vídeos dos treinamentos. Eles conversam quando podem e esperam um dia poder se desafiar no campo de jogo.
O testemunho de Jamil é o de um palestino que viveu por cinco meses em Gaza, primeiro bombardeada e depois invadida pelo exército israelense. “Em meados de outubro de 2023 - contou ele - alguns dias após o início das incursões aéreas, mudei-me com dezenas de milhares de outras pessoas para o campo de refugiados de Deir al Balah, no sul. Em março do ano seguinte, consegui atravessar para o Egito e de lá cheguei a Omã.”
Os cerca de 150 dias que passou na Gaza ocupada foram um desafio diário com a morte. “Lá - disse ele - não há zona segura porque Israel bombardeia em todos os lugares, mesmo nas áreas que afirma serem destinadas aos chamados corredores humanitários. Viver ou morrer é uma questão de sorte, de circunstâncias mais ou menos favoráveis. Em suma, um acaso. Das 78 pessoas de minha grande família, entre parentes próximos e distantes, 38 já foram mortas. Não são militantes do Hamas, são pessoas comuns. Vi sendo bombardeados um carro em que viajava uma família e um micro-ônibus com civis. Eles estavam atravessando uma rota que Israel havia indicado ser garantida, transitável pela população em fuga das áreas mais afetadas pelo conflito.”
E acrescentou: “Não há salvação nem mesmo nos campos de refugiados, porque mesmo lá, durante o período em que eu ainda estava em Gaza, foram lançadas bombas e foram realizadas operações de guerra pelo exército israelense. As pessoas morrem por causa das bombas, das balas, das doenças e do frio. Quando eu estava em Gaza, estavam em falta os medicamentos mais banais e aqueles necessários para pacientes cardíacos, diabéticos e pacientes com câncer eram indisponíveis.” O sonho de Jamil? “Gostaria de voltar a Nápoles um dia com as crianças e os garotos do Al Haddaf para jogar uma partida de verdade com o Spartak San Gennaro.”
De acordo com os dados fornecidos pela Federação Palestina de Futebol, atualizados até dezembro de 2024, 359 jogadores foram mortos desde o início da invasão israelense na Faixa de Gaza. Entre os mais recentes está Mohamed Khalifa, que perdeu a vida com pelo menos sete membros da família em um bombardeio no campo de Nuseirat. Vinte e quatro jogadores de futebol foram detidos. O número de instalações esportivas que foram destruídas de outubro de 2023 a dezembro de 2024 foi de 287.
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“Nem choram mais, as crianças de Gaza perderam a infância” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU