"A Palavra de Deus deste domingo nos coloca em atitude humilde, esperançando para não desistir, resistindo para não desanimar: Como entoar em família os cantos ao Senhor e como caminhar na sua presença, trilhar teus caminhos, quando as diversidades se tornam divergência e na comunidade não caminhamos na mesma direção?"
A reflexão é de Carmem Lussi. Casada, mãe de 2 filhos, ela é doutora em teologia pela Pontifícia Universidade Católica do rio de Janeiro PUC-Rio (2013) e Mestre em Missiologia pela Pontifícia Universidade Urbaniana (2002). Ela tem graduação em Teologia - Facoltà Teologica dell'Italia Settentrionale (1997), com pós-graduação em sociologia-economia pela Universidade Carlo Bò de Urbino - Itália(2004) e em sociologia-pedagogia por projeto especial CARITAS Italiana-UE (1998). É assessora do CSEM - Centro Scalabriniano de Estudos Migratórios, Brasília - DF, Brasil.
Leituras do dia
A liturgia de hoje nos coloca ao redor de uma mesa, ou numa varanda de família, quem sabe num quarto de casal, onde pais cristãos, onde mães com fé se perguntam, do fundo de suas dores e de seu coração: Pai do céu, o que queres de mim? Como faço para construir uma família cristã? Como é ser mãe com fé, na vida do meu filho, participando concretamente da vida que ele vive hoje? Como ser um pai cristão, vivendo com minha filha, os desafios que ela está enfrentando hoje?
A quais respostas nos chamas, Senhor, para ser casal com fé, ser filho ou filha de pais adultos ou já idosos, saudáveis ou doentes, com ou sem saúde mental, com ou sem dinheiro para pagar suas contas ... o que nos pedes diante da viva difícil com irmãos e irmãs que cresceram tão diferentes, apesar de terem nascido no mesmo berço? De família que já não reconhecemos, mas que não abrimos mão de amar e abraçar com fé?
O que Tua Palavra nos diz hoje, sobre temas que não conseguimos entender? .... respeito a pessoas que não sabemos tratar ... e pensando a situações que não somos capazes de acolher de coração aberto e livre, livre de preconceitos ou julgamentos...
Lucas nos narra no Evangelho de hoje que podemos aprender de Maria: ela “conservava no coração todas estas coisas”. Nós, mães de filhos que surpreendem, também guardamos no coração essas coisas. E todos os dias, não há dia que não seja assim, todos os dias entregamos a Deus nossa prece e nosso desejo que nossos filhos cresçam em sabedoria, como crescem em estatura e em graça, porque disso não duvidamos, Deus não deixa faltar sua graça.
Mas nos inquietamos. Sim, diferentemente do resto de Israel que vivia a menos de 2 séculos antes do nascimento de Jesus Cristo, vivendo em ambiente onde a cultura grega predominava, com valores, costumes e tradição que divergia da fé dos hebreus, onde foi escrita a primeira leitura, hoje admiramos a narrativa do texto bíblico, que nos consola, nos anima em nossa dedicação, mas não é receita. Queremos que a Palavra de Deus se encarne em nossas vidas, mas nossos terrenos são tão estranhos aos padrões que a pregação nos acostumou a crer e reconhecer!
Não deixamos de nos perguntar: existe uma missão que vem com a maternidade cristã? E com a paternidade? Nós olhamos para esta geração que nos segue, que vem junto, mesmo cronologicamente atrás e mesmo assim, por vezes, segue em nossa frente nos ritmos dos tempos que nos atravessam: como, Pai de Jesus, como podemos amar sem impor, respeitar sem desrespeitar? O que significa trilhar teus caminhos, como cantava o salmista?
A Palavra de Deus deste domingo nos coloca em atitude humilde, esperançando para não desistir, resistindo para não desanimar: Como entoar em família os cantos ao Senhor e como caminhar na sua presença, trilhar teus caminhos, quando as diversidades se tornam divergência e na comunidade não caminhamos na mesma direção?
Aprendemos que a família é chamada a ser igreja doméstica: amar a Deus, acolhê-lo no domus onde vivemos no dia a dia, mas sobretudo, ser espaço casa onde ensinar o amor, através da acolhida, do perdão, do serviço e do cuidado da vida. Mães e pais de hoje, como José e Maria no templo, seguimos “sem compreender as palavras” que os filhos nos dizem, tantas vezes... como Lucas nos testemunha no Evangelho deste dia: mas seguimos. Seguimos sendo as colunas da comunidade cristã, mesmo sendo famílias frágeis, cheias de contradições, limitadas, porque na fraqueza é que está a nossa força, e a força da igreja. Seguimos para Nazaré depois das surpresas que Jesus prepara para nós, na rua ou na igreja, guardando tudo no coração, por vezes pesado, outras vezes esperançoso, sempre aberto ao que o Espírito faz acontecer em nossas vidas, não sem nosso ouvido aberto e nosso dia a dia disponível para o novo, para as alteridades que a fé na vida dos outros pode fazer acontecer. Não menos que nas nossas. Por isso concordamos com papa Francisco, que com fé construímos uma sociedade e uma comunidade cristã melhor, na base da cultura do encontro.
As três frases que escutamos na liturgia de hoje, da Carta que Paulo escreveu de Roma aos cristãos da cidade de Colosso, na Grécia, para orientá-los na compreensão e vivência da fé cristã, entre 2 e 3 décadas depois da morte e ressurreição de Jesus Cristo, colocam maridos e esposas, filhos, irmãos e pais todos no mesmo nível, igualmente convocados a amar e seguir a Jesus Cristo, na obediência que Jesus tinha por José e Maria, como nos narra o evangelista Lucas, uma obediência em Cristo Jesus, que não tem receitas nem procedimentos ou leis pré-estabelecidas, mas que se caracterizam por uma criatividade leve e formada pela sabedoria instruída pela Palavra e pelo Espirito. Uma sabedoria e vidas cotidianas que se reconhecem por traços de misericórdia, bondade, humildade, mansidão, paciência, compreensão, perdão recíproco, gratidão, ação de graças, oração, serviço, delicadeza, obediência.
Col. 3, Versículo 16: “Que a palavra de Cristo, com toda a sua riqueza, habite em vós. Ensinai e admoestai-vos uns aos outros com toda a sabedoria.”