11 Dezembro 2024
No dia 25 de novembro, o Papa Francisco nomeou um novo bispo auxiliar para a arquidiocese de Manaus, o frei Samuel Ferreira de Lima que será ordenado bispo no dia 1º de fevereiro em Rodeio (SC). Ele diz estar “indo como irmão que quer caminhar junto, que quer aprender, que na experiência de vida que tenho, quero estar a serviço”, para uma missão “muito abrangente, uma nova realidade, com novas exigências, num contexto bem diferente daquele que estou vivendo”.
Ele vê a Igreja de Manaus como “uma igreja muito dinâmica, muito viva, engajada no profetismo, na vivência de fé”, onde espera vivenciar a relação com a natureza, com as criaturas, com a Casa Comum, com a diversidade de culturas presente na Amazônia, uma interculturalidade que ele já experimentou em seus dez anos como missionário em Angola.
Em uma Igreja marcada pela sinodalidade, o bispo eleito vê fundamental, “a gente perceber que nós somos parte de um todo e somos instrumentos, e que o Espírito de Deus sopra em todo batizado”, vendo no caminhar juntos algo que faz que sejamos “muito mais podemos ser efetivos na nossa missão”. Ele pede muitas orações para que a gente possa se abrir cada vez mais à ação do Espírito e se colocar realmente como instrumento de Deus naquilo que for necessário, naquilo que o povo espera e assim poder somar forças nessa caminhada junto ao povo de Deus nessa experiência de fé e vida”.
Dom Samuel Ferreira de Lima (Foto: Luis Miguel Modino)
A entrevista é de Luis Miguel Modino.
O senhor acaba de ser nomeado bispo auxiliar da arquidiocese de Manaus, como está vivenciando este serviço que o Papa Francisco lhe pediu recentemente?
É um processo de assimilação, pois a gente não espera na nossa vida como frade tamanha responsabilidade e missão. Então, como mestre de noviços, a gente está muito focado no trabalho formativo, na dinâmica própria de uma casa de formação. E com essa nova missão, tudo se amplia de uma forma muito abrangente, uma nova realidade, com novas exigências, num contexto bem diferente daquele que estou vivendo. Então tudo isso leva a gente a ter um turbilhão de ideias, sentimentos, e ao mesmo tempo se abandonar em Deus, porque só Ele que pode nos qualificar e dar condições de responder ao chamado que nos é feito.
O senhor fala de uma nova realidade, o que espera encontrar em Manaus, o que espera encontrar na igreja da Amazônia?
Pelo pouco que já vi, já li, é uma igreja muito dinâmica, muito viva, engajada no profetismo, na vivência de fé, creio que vou me enriquecer muito com essa experiência. Uma Igreja de uma caminhada longa, principalmente com os povos originários. É o Brasil raiz.
O senhor é franciscano e São Francisco inspirou o Papa Francisco em sua vida e em seu Magistério, especialmente no cuidado da Casa Comum, como mostra a Laudato si'. O que representa para um franciscano chegar na Amazônia e o que essa Casa Comum, ainda preservada na região de Manaus, representa em sua vida como frade e em seu futuro serviço como bispo auxiliar?
Francisco sempre tem essa percepção do Cântico das Criaturas, da Casa Comum, como essa vivência e experiência do amor de Deus que tudo criou e tudo dispôs para nós. Viver agora na Amazônia vai ser encarnar concretamente essa busca de celebrar esse grande dom que é a natureza, os animais, toda a realidade que está ali presente e ao mesmo tempo tomar consciência dessa relação que não é apenas uma relação apenas antropológica, social, política, cultural, mas é uma relação de fé porque é relação com o próprio Deus.
Todas as criaturas são parte de nós. Então, o cuidado com a natureza é cuidado conosco mesmo. É perceber que fazemos parte de um todo e que isso deve ser motivado não só pela preservação nossa, mas no respeito e numa reverência à dimensão da grandeza de Deus que tudo criou e tudo que fez é bom. Então nós devemos trabalhar para salvaguardar esse bom que nos é dado e que dignifica o ser humano nessa relação.
O senhor iniciou sua vida presbiteral como missionário na África, em Angola. A interculturalidade é uma dimensão muito presente no magistério do Papa Francisco. Chega numa região muito marcada pela interculturalidade, onde a igreja tenta levar essa diversidade cultural para sua vida pastoral, para a sua vida celebrativa. Por que é importante a convivência com culturas diferentes, e o que o senhor, ao longo do seu ministério presbiteral, foi descobrindo nessas culturas diversas?
A interculturalidade é uma grande riqueza, é uma possibilidade de a gente ampliar a percepção da vida, das pessoas, das relações, dos valores, e aprender cada dia com a vivência e a partilha dos conhecimentos, das vivências de fé. É uma experiência muito rica, porque Deus está em todos os lugares, a gente não vai levar Deus, a gente vai buscar Deus aonde a gente está indo, aonde a gente está sendo enviado. Cada povo, cada cultura, por sermos seres humanos, que tem na sua raiz esse desejo da transcendência, cada povo, cada grupo humano está, de alguma forma, fazendo essa busca, confrontando e partilhando suas vivências.
Em Angola, a gente vivia um tempo de guerra e foi muito importante conhecer o diálogo inter-religioso, a interculturalidade, a compreensão da vida através das várias etnias. Tudo isso vai mostrando, na diversidade a beleza e a grandeza de Deus se revelando. Muitas vezes, a gente quer reduzir muito a apenas uma cultura, uma visão religiosa e não percebe que é na diversidade que as coisas se complementam e se enriquecem e se tornam belas. Então eu vejo que vai ser uma experiência muito rica, da qual eu vou poder aprender muito e também poder partilhar um pouco que já vivi e experienciei no tempo de missão.
A sinodalidade é uma dinâmica muito presente na Igreja da Amazônia, na Igreja daqui de Manaus. A Arquidiocese de Manaus realizou o Sínodo arquidiocesano, atualmente está realizando o Sínodo com a juventude e também a Igreja, especialmente através do seu arcebispo, o cardeal Leonardo Steiner, participou da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade. Como essa dinâmica, que não é nova na vida da igreja, mas que o Papa Francisco tem se empenhado em impulsionar, pensa que pode condicionar, dinamizar seu ministério episcopal na Igreja de Manaus?
Vai ser fundamental, a gente perceber que nós somos parte de um todo e somos instrumentos, e que o Espírito de Deus sopra em todo batizado. Então, quanto mais a gente partilhar, refletir, buscar juntos caminhos, soluções, respostas para, de forma mais autêntica, viver a nossa fé, anunciar a boa nova do Evangelho, muito mais poderemos atingir, muito mais podemos ser efetivos na nossa missão.
Eu fico muito feliz que a Igreja Particular da Arquidiocese esteja de uma forma bem avançada nessa dinâmica da sinodalidade, porque isso abre muitas perspectivas e caminhos para incluir e valorizar o dom de cada um, as possibilidades que cada um tem, como Igreja, como Povo de Deus, como povo que está caminho. Nós não temos resposta para tudo, mas estamos num caminho de busca, de reflexão, de caminhada entre erros e acertos. Estamos caminhando e se ajudando mutuamente. Eu me sinto feliz e esperançoso de partilhar e caminhar junto com essa experiência que a Igreja da Arquidiocese já está fazendo.
A pouco menos de dois meses para sua chegada em Manaus, o senhor será acolhido no dia 9 de fevereiro numa celebração na catedral, o que o senhor gostaria de dizer à Igreja e ao povo de Arquidiocese de Manaus?
Que eu estou indo como irmão que quer caminhar junto, que quer aprender, que na experiência de vida que tenho, quero estar a serviço. Essa é a nossa vocação, servir, é o ministério do serviço, da doação, da entrega, do lava-pés. Vou com esse espírito e desejo, anseio, poder corresponder àquilo que o povo espera de um pastor que quer ter o cheiro das ovelhas, que quer caminhar junto com a caminhada que o povo já está fazendo. Eu tenho que me inserir nessa caminhada que o povo já está fazendo há muito mais tempo do que eu. Então eu vou com esse espírito e com essa perspectiva de ser irmão e ser pastor. E ao mesmo tempo pedir muitas orações para que a gente possa se abrir cada vez mais à ação do Espírito e se colocar realmente como instrumento de Deus naquilo que for necessário, naquilo que o povo espera e assim poder somar forças nessa caminhada junto ao povo de Deus nessa experiência de fé e vida.
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“Estou indo em Manaus como irmão que quer caminhar junto, que quer aprender, estar a serviço”. Entrevista com frei Samuel Ferreira de Lima - Instituto Humanitas Unisinos - IHU