11 Outubro 2024
“A BlackRock provou ser uma força poderosa na economia global. A sua capacidade de influenciar governos, empresas e mercados é impressionante. No entanto, o seu foco na maximização dos lucros levanta com frequência desafios éticos e econômicos, especialmente em áreas sensíveis como as aposentadorias”. A reflexão é de Eduardo Luque, em artigo publicado por El Viejo Topo, 10-10-2024. A tradução é do Cepat.
Você não precisa ser um especialista em economia para compreender a natureza de um fundo de investimento. A BlackRock é um deles. E é também um dos maiores fundos do mundo, que consolidou o seu poder e influência de uma forma que poucos compreendem plenamente. Este titã financeiro gere ativos no valor de 10 trilhões de dólares, e a sua presença no mundo é tão extensa que apenas os Estados Unidos e a China poderiam competir com a sua capacidade econômica. Se fosse um país, seria a terceira economia do mundo, atrás apenas dos EUA e da China.
A BlackRock foi fundada em 1988 como uma subsidiária da Blackstone, outro gigante financeiro. O seu objetivo, e não poderia ser outro, é maximizar o retorno dos seus investimentos. Pouco importa o setor em que se investe – armas, petróleo, bancos ou energia –, nem o custo social. Não hesita em apostar nas guerras quando lhe convém. Pressiona os políticos para que mantenham o financiamento para a guerra na Ucrânia. Possui fortes investimentos em empresas de armas como Lockheed Martin, Raytheon Technologies, Northrop Grumman e Boeing, entre outras.
Seus enormes investimentos podem estar comprometidos. Não hesita em negociar com “amigos” ou “inimigos”, com gregos ou troianos. Poucos meses após o início da guerra na Ucrânia (agosto de 2022), veio à tona o investimento de milhares de milhões de dólares na exploração de poços de gás natural na Rússia. A BlackRock, que apoiava o regime ucraniano, pretendia investir no seu inimigo sem qualquer vergonha. Não é surpreendente, uma vez que a megaempresa tinha ações na gigante de energia russa Gazprom. Todo este investimento tem sido questionado pelo desenvolvimento do conflito.
A BlackRock desenvolveu uma capacidade impressionante de se infiltrar nos sistemas econômicos e políticos dos países em que opera. Sua estratégia inclui colocar seus peões nas esferas parlamentar, judicial e legislativa, além de organizar conferências e cursos para influenciar a formação de políticas favoráveis aos seus interesses. Esta capacidade de penetração não se limita à economia, uma vez que também controla grande parte do poder midiático, utilizando a sua influência para conceder punições e recompensas a diferentes operadores políticos. O controle mediático exercido no conselho de administração dos principais meios de comunicação social garante-lhe uma imagem discreta, fora do escrutínio social.
Na Espanha, a presença da BlackRock é notável. Este fundo detém participações significativas (mais de 5%) em diversas empresas do IBEX 35, como o Banco Santander, BBVA, CaixaBank, Naturgy, Iberdrola, Telefónica, Repsol e Enagás. Em junho de 2023, geriu ativos no valor de 47 bilhões de euros no nosso país [Espanha], estando presente em 19 das 35 empresas do IBEX. Estes investimentos não só permitem obter elevados retornos, mas também influenciam as políticas econômicas do país. Não há presidente que não tenha reuniões com Larry Fink (CEO da empresa).
Uma das características mais notáveis deste fundo é a sua capacidade quase camaleônica de se esconder e permanecer nas sombras, ao contrário dos investidores dos países do Golfo, por exemplo. Larry Fink, figura-chave na operação do fundo, mantém um perfil baixo e discreto. Ele possui apenas 0,7% das ações de sua empresa e uma modesta casa em Manhattan, além de uma propriedade também no estado de Nova York. No entanto, seu poder e influência são vastos. Fink é conhecido por sua famosa carta anual aos acionistas e líderes políticos, onde expõe as diretrizes que devem a serem seguidas durante o ano.
Na carta de 2024 centrou-se nos problemas demográficos e na aposentadoria, propondo como solução o aumento da idade da aposentadoria e a promoção de fundos privados. Seus movimentos são menos ostentosos que os de outras empresas, mas muito refletidos. Esta discrição permite-lhe operar sem atrair muita atenção, embora a sua influência seja profunda. A imprensa econômica muitas vezes minimiza o seu poder. Em grande medida, esta imprensa econômica “independente” é parcialmente propriedade deste fundo, o que lhe permite criar uma imagem positiva das suas atividades. Seu lema é a “discrição”; desta forma evita o repúdio e a reação social mesmo sendo um fundo especulativo.
A BlackRock tem uma influência considerável na economia, uma vez que controla 14% dela em todo o mundo. Controla a maior parte das ações de gigantes como Microsoft, Amazon, Apple, Coca-Cola, Twitter e muitos mais. Tem uma influência significativa no setor energético, sendo o maior investidor em centrais a carvão e gerindo milhares de milhões em petróleo. A BlackRock detém 88% das ações das 500 maiores empresas estadunidenses e gere ativos de tanto valor que apenas os Estados Unidos e a China podem competir com esta empresa. A sua influência estende-se a quase todos os principais setores econômicos, da tecnologia à energia e às telecomunicações.
A sua capacidade econômica tem correlação com a sua intervenção política. Na Grécia, a BlackRock desempenhou um papel significativo durante a crise da dívida, gerindo carteiras de investimento e participando de processos de reestruturação. Na Ucrânia, é um grande credor, instando o governo a pagar os empréstimos com juros. É um investimento que pode ser ruinoso, por isso exige que o governo Zelensky mantenha um conflito que está perdido há meses. No Parlamento Europeu, não hesitou em agir como lobista em questões como o Plano Pan-Europeu de Pensões Privadas ou o fracassado Plano de Recuperação, Transformação e Resiliência.
Estas ações mostram a capacidade da BlackRock de influenciar as políticas econômicas dos países em crise. O caso argentino é o mais imediato. O presidente Javier Milei reuniu-se de maneira virtual com Larry Fink para discutir investimentos no país. A conversa centrou-se na privatização de empresas públicas e na exploração de oportunidades de investimento a longo prazo. O fundo demonstrou interesse em setores estratégicos como a energia (YPF, Vaca Muerta e principalmente lítio) e a tecnologia. A empresa já possui participações em empresas argentinas como Pampa Energía e Edenor.
Os diretores do fundo mantêm relações estreitas com governos e políticos de todo o mundo. Os membros do seu conselho, como Brian Deese, foram conselheiros de presidentes dos EUA como Obama e Biden. Além disso, a BlackRock recruta para as suas fileiras ex-altos funcionários do governo, como Stanley Fischer, ex-vice-presidente do Federal Reserve, banco central americano. Esta relação bidirecional permite-lhes influenciar as políticas econômicas e as decisões governamentais em vários países, incluindo as reestruturações de dívidas e as políticas de investimento.
O fundo fixou seus olhos nos fundos de pensão. A BlackRock oferece ETFs (1) (iShares) que replicam o comportamento de diversas ações e índices de ações, permitindo que os administradores de pensões na América Latina diversifiquem seus investimentos. Apesar das aparentes vantagens promovidas pelas suas campanhas publicitárias, a BlackRock não tem escrúpulos – tem sido criticada por investir em empresas que violam os direitos humanos e pela falta de transparência nos investimentos em fundos de pensões. No México, por exemplo, lançaram o ETF iShares ESG MSCI Mexico, que levantou 450 milhões de dólares em apenas 60 dias, mas incluiu empresas com graves violações dos direitos humanos. No Chile, as AFPs investiram no ETF iShares MSCI Chile, que inclui empresas com gravíssimas violações ambientais.
Na Espanha, a influência da BlackRock estende-se a 71 empresas da bolsa espanhola (35 do IBEX e 36 do contínuo). Afeta também o sistema de pensões. Com um investimento potencial de 60 bilhões de euros, a BlackRock pretende chegar a 130 bilhões de euros das pensões espanholas. A gestão das pensões tem sido uma questão crítica nas atividades da BlackRock. O projeto de privatização das pensões, lançado no nosso país desde a era Zapatero, faz parte do projeto geral da BlackRock. Ao condicionar os governos (o atual e os anteriores) pode reorientar os objetivos econômicos em função dos seus interesses, controlando a vida econômica do país. Os sistemas públicos de pensões dependem de entidades privadas que procuram maximizar os seus lucros.
Larry Fink, na sua carta anual, salienta que o envelhecimento da população coloca em risco os sistemas públicos de aposentadoria. Fink propõe adiar a idade da aposentadoria e promover os fundos privados como solução para os chamados “desafios demográficos”, que não são como o movimento previdenciário demonstrou. Esta posição reflete a estratégia da BlackRock de influenciar as políticas de pensões para promover os seus próprios interesses. Infelizmente, o nosso “governo progressista” cedeu parcialmente aos interesses do fundo. A resistência popular e a mobilização dos aposentados arrefeceram, em alguns casos, a velocidade das reformas e, em outros, condicionaram o seu alcance. A mobilização mostra a sua utilidade social.
A BlackRock provou ser uma força poderosa na economia global. A sua capacidade de influenciar governos, empresas e mercados é impressionante. No entanto, o seu foco na maximização dos lucros levanta com frequência desafios éticos e econômicos, especialmente em temas sensíveis como as aposentadorias. A influência da BlackRock no sistema de pensões espanhol é um exemplo claro de como este gigante financeiro tenta moldar as políticas públicas para servir a seus interesses, levantando questões importantes sobre o futuro da seguridade social e da soberania econômica na Espanha.
1. A grande maioria de ETFs (Exchange Traded Funds) ou fundos negociados em bolsa reproduz o comportamento de um determinado índice no mercado de ações; se o índice subir, o fundo também sobe e vice-versa. Por exemplo, o índice IBEX 35 inclui as 35 maiores empresas da Espanha. Outro índice poderia ser de empresas de tecnologia ou empresas de luxo como Louis Vuitton, Ferrari, Hotéis Hilton...
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BlackRock: o poder na sombra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU