16 Abril 2024
Na noite de sábado, Azar Nafisi estava com um mau pressentimento. Quando a CNN deu a notícia do ataque dos aiatolás a Israel, não foi uma surpresa para a escritora iraniana de Lendo Lolita em Teerã: “Imaginei que mostrariam os músculos”. De sua casa em Washington DC, porém, ela diz que não está mais preocupada do que estava há uma semana, um mês ou um ano atrás.
Lendo Lolita em Teerã (Foto: Divulgação)
A entrevista é de Greta Privitera, publicada por Corriere della Sera, 15-04-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Por quê está tensa?
Porque fico sempre tensa pelo meu povo. Vivo em constante angústia pela brutalidade desse regime que mata, tortura e, não contente, também rouba dinheiro dos cidadãos para dá-lo ao Hamas.
Você já falou com amigos no Irã?
Sim, contatei-os imediatamente. Ninguém quer uma guerra contra Israel, não só porque a maioria de nós não tem nenhum problema com o povo israelense, como o regime quer dar a entender, mas porque os homens e mulheres iranianos já têm uma guerra em curso: aquela contra o ditador Ali Khamenei.
Um homem que vê o mal absoluto em Israel e nos Estados Unidos.
Claro, porque são os principais obstáculos para alcançar o seu sonho: dominar toda a região. O Líder Supremo sempre utilizou a questão palestina para sua própria conveniência. O problema é que estamos superconscientes disso. A nossa batalha não é contra os palestinos ou os israelenses, mas contra as ditaduras que oprimem."
A partir de uma pesquisa que circula no X, pode-se deduzir que alguns iranianos veem um ataque externo como uma chance mais rápida de derrotar os aiatolás, para sempre. “Entendo que se possa pensar nesse atalho, mas nós somos um povo de revoluções e deveríamos ter entendido que para mudar o sistema devemos contar apenas com as nossas próprias forças. Não será um país estrangeiro que derrubará a ditadura. As democracias ocidentais podem ajudar-nos, deixando de fazer negócios com o regime de uma vez por todas. Deveriam promover as lutas das garotas e dos rapazes do Irã - assim como aquelas dos ucranianos e dos afegãos - não porque causam compaixão, mas porque neste momento histórico são eles que estão na linha da frente das democracias do mundo. Devemos compreender que a defesa da liberdade desses povos é a defesa da liberdade de todos.
Nós, habitantes do planeta democracia, nos acomodamos à frágil segurança dos nossos privilégios: há muito que aprender com as garotas iranianas.
O quê?
A coragem, o amor à vida. No Irã, protestar como fez o movimento Mulher Vida Liberdade, praticar a desobediência civil é um ato heroico. As adolescentes que todos os dias deixam os hijabs em casa são valorosas guardiãs do mundo livre: elas me comovem. São as filhas simbólicas das minhas estudantes de Lendo Lolita em Teerã. São o resultado da nossa evolução. Quando eu vivia no Irã (ela saiu o país em 1997, ndr), eu usava um pouco de batom, pode parecer um nada na Itália ou nos Estados Unidos, mas na minha época era visto como uma arma de destruição em massa.
Não acredita que para derrubar o regime em algum momento serão necessários métodos não-pacíficos?
Acho que não. Essa nova geração coloca Khamenei em crise mais do que as outras precisamente porque não fala a sua língua. Ele os mata e eles dançam na sua cara. Ele os tortura e eles cantam na sua cara. A música, a poesia, a cultura são as únicas coisas que passam pelas grades das suas prisões.
E se Israel atacasse?
Seria um grande problema. Viver no Irã já é muito difícil, a situação econômica também é terrível: a guerra é sempre um desastre para o povo. Mas admito que nunca tive tanta esperança como hoje: acredito que as coisas irão mudar.
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“Meu povo está sendo usado, ninguém quer lutar contra o estado judeu”. Entrevista com Azar Nafisi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU