03 Abril 2024
Quase 4.000 palestinos procuraram refúgio médico no Egito em meio ao conflito de Gaza, enfrentando um futuro sombrio, sem um caminho claro de volta para casa nem perspectivas estáveis no Egito ou fora dele.
A reportagem é de Martin Dumas Primbault, publicada em La Croix International, 02-04-2024. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Sozinho no Cairo, Wala Jawad fala abertamente sobre seu sentimento de extrema vulnerabilidade. “Eu me sinto fraca, destroçada e abandonada”, partilha a ganesa de 21 anos com uma voz suave e frágil. No Egito desde o dia 7 de novembro, ela acompanhou sua mãe, gravemente ferida em uma explosão em meados de outubro no hospital Ahli-Arab, na cidade de Gaza.
“Depois de mais de três meses de cuidados intensivos, minha mãe faleceu, tornando-se uma mártir. De certa forma, bendito seja Deus. Não aguentava mais vê-la sofrer”.
Morando em um modesto apartamento de dois cômodos em um bairro nobre no sul da capital egípcia com três outros compatriotas, Wala se pergunta sobre seu futuro. “A embaixada palestina nos fornece moradia e alimentação, mas é isso. Não sabemos quanto tempo poderemos ficar aqui. Minhas economias estão começando a acabar”, suspira a estudante do bairro de Zaytoun, agora devastada pelo Exército israelense.
Today I met with Palestinian civilians at the General Hospital in Al Arish, Egypt.
— António Guterres (@antonioguterres) March 23, 2024
It’s impossible not to feel heartbroken by the accounts of those injured or separated from their families.
It’s time for an immediate humanitarian ceasefire.
It’s time to silence the guns. pic.twitter.com/y0gQijjNol
Milhares de habitantes de Gaza, como ela, cruzaram a fronteira sul do enclave para procurar tratamento médico ou acompanhar um ente querido. O Egito é a porta de entrada essencial para todos os indivíduos evacuados pelo Crescente Vermelho. Em 22 de março, o Ministério da Saúde egípcio contabilizou 3.953 pacientes crônicos ou feridos acolhidos em 84 hospitais desde 7 de outubro, junto com mais de 5.300 cuidadores.
“Atualmente, estamos cuidando de 1.521 pacientes, um número significativo no norte do Sinai”, elaborou um porta-voz do ministério. “O sistema de saúde egípcio está ao lado do povo de Gaza e continuará estando, mesmo que a guerra termine amanhã. É por isso que estamos abertos a qualquer ajuda material que possamos receber da comunidade internacional”.
No norte do Sinai, os palestinos relatam tensões. Em Al-Arich, a capital regional mais próxima de Gaza e a cerca de 50 quilômetros da fronteira, Khaled (nome fictício), 44 anos, não vê nenhuma perspectiva. Ele chegou no início de novembro com sua esposa, que sofreu graves lesões hepáticas durante um bombardeio.
“Ela passou por uma cirurgia em um hospital do Cairo durante três dias antes de voltar para cá, mas não vejo melhora, e aqui não há remédios para ela. Tudo o que fazem é fisioterapia”, lamenta o taxista. Junto com uma centena de outros habitantes de Gaza, ele está alojado em um centro juvenil transformado em refúgio. “Em meados de janeiro, disseram-nos para virmos a Al-Arich para receber cuidados hospitalares, mas era uma mentira. Estamos aqui neste abrigo de emergência que lembra uma escola”, conta Khaled.
Esse pai já perdeu dois filhos para as bombas israelenses. “Agora, quero encontrar os outros dois, de 8 e 12 anos. Eles ainda estão lá em Rafah. Assim que estiverem conosco, vou levá-los para outro país, para o bem-estar deles”, planeja o palestino natural de Ramallah.
Mas as perspectivas são escassas para os habitantes de Gaza confinados no Egito. Até hoje, as autoridades não estão emitindo autorizações de residência, temendo um afluxo massivo de refugiados.
“Aqui todo mundo quer ir embora, para os Emirados, para o Catar ou para outro lugar. Mas não podemos nos mover, porque tudo funciona com base em conexões e contatos com as embaixadas ou com o Ministério da Saúde. De outra forma nada é possível”, lamenta Khaled. Wala, por outro lado, não quer seguir o caminho do exílio. “Tenho muitas saudades do meu pai e das minhas irmãs. Por isso, assim que a guerra acabar, voltarei para o lugar de onde vim, no norte de Gaza”, promete a jovem.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
No Egito, a provação dos feridos de Gaza - Instituto Humanitas Unisinos - IHU