30 Novembro 2023
Todas as COPs são importantes. As emissões de gases poluentes não conhecem fronteiras e, portanto, o marco multilateral é a nossa única esperança de oferecer uma resposta global e eficaz a semelhante desafio colossal. Contudo, esta COP28, que logo começará, é o evento mais importante na diplomacia climática, desde a assinatura do Acordo de Paris.
A reportagem é de Fernando Rejón, publicada por Agenda Pública/El País, 29-11-2023. A tradução é do Cepat.
Temos 7 anos para manter vivo o objetivo de limitar o aumento das temperaturas a 1,5 grau e, pela primeira vez, nesta COP28 se constatará a realidade que, há anos, a ciência do clima alerta com propriedade: os compromissos assumidos até o momento nos condenam a uma trajetória de aumento das temperaturas de ao menos 2,8 graus, excedendo vastamente o limite de segurança climática acordado em Paris.
1,5 grau não é um objetivo político, nem um marco discricionário, mas o limite estabelecido pela evidência científica para evitar a desestabilização irreversível de nosso sistema climático e mitigar a nocividade dos impactos da emergência climática. A diferença entre 1,5, 2 e 2,5 graus poderá ser medida no número de mortes provocadas por ondas de calor cada vez mais intensas e duradouras, nas colheitas arruinadas pelo flagelo das secas prolongadas, nas espécies de animais e plantas que os nossos filhos nunca conhecerão, nos hectares reduzidos a cinzas pelo avanço de incêndios incontroláveis e pela velocidade em que nossas florestas sucumbem ao avanço desenfreado da desertificação.
E temos de ser claros: a deterioração de nosso planeta não caminha em uma via paralela ao desenvolvimento econômico e a prosperidade humana. O economista Nicholas Stern já fez esta ressalva quando descreveu a crise climática como a maior falha de mercado da história da civilização. Movimentos negacionistas e retardadores a nível internacional pretendem transformar a agenda climática em um aríete cultural para a luta partidarista, confrontando a ambição climática com a aspiração legítima à prosperidade humana, o bem-estar e a segurança.
Nada pode estar mais longe da realidade: a agenda verde representa uma oportunidade histórica para reconciliar o crescimento econômico, a coesão social e a proteção ambiental. A agenda climática é uma agenda de reindustrialização para o mundo do trabalho do amanhã, uma agenda de saúde pública e ar limpo, uma agenda contra a pobreza e a desigualdade. O negacionismo quer lucrar com o medo e a incerteza diante das profundas mudanças que se aproximam. Temos motivos de sobra para encararmos a ação climática como um horizonte de bem-estar social e vidas mais dignas para todos.
A insuficiência dos compromissos climáticos adotados até o momento não pode nos fazer cair no derrotismo e na resignação. A desesperança é um exercício de egoísmo geracional que não podemos nos permitir. O avanço vertiginoso na implantação de energias renováveis, nos últimos anos, mantém viva a possibilidade de cumprir os objetivos do Acordo de Paris, que representou um antes e um depois na ambição climática global, passando de uma trajetória de aumento das temperaturas de 3,5 graus de 2015 para a atual, em torno de 2,8 graus.
Agora, aqueles países que nunca acreditaram no papel do multilateralismo e da cooperação internacional pretendem colocar o Acordo de Paris no tiroteio. Devemos proteger a validade de seus mecanismos de governança como a nossa melhor ferramenta para promover uma ambição maior em nível global.
Por isso, a próxima COP28 deve dar um sinal claro para colocar fim, de uma vez por todas, à era dos combustíveis fósseis, após séculos de desenfreada extração em que os limites planetários foram flagrantemente omitidos em nosso esquema de crescimento e desenvolvimento. O vício da queima incansável de gás, petróleo e carvão deve acabar para alcançarmos, antes do final da década, o pico na demanda de combustíveis fósseis e nos alinharmos com a via traçada em Paris.
Para isso, a próxima COP28 deve trazer à tona um acordo para triplicar a capacidade renovável e duplicar as melhorias na eficiência energética daqui até 2030. Contudo, a aceleração na implantação de tecnologias renováveis não pode servir de desculpa para não reduzir, sem demora, a oferta de combustíveis fósseis por parte da indústria do gás e petróleo. Não agir assim, nas palavras do diretor-geral da Agência Internacional de Energia, seria como se preparar para uma maratona ao mesmo tempo em que fumamos três maços de cigarro por dia. Chegou o momento de acabar com o nosso vício.
Os governos precisam oferecer um calendário claro e consistente para a substituição de todos os combustíveis fósseis – também o gás – por tecnologias limpas, viáveis e acessíveis que já possuímos. Alguns interesses pretendem atenuar a transformação da indústria fóssil apelando a um trilema capcioso entre descarbonização, preços acessíveis e segurança no abastecimento.
A crise energética que atravessamos nos demonstra que as energias renováveis oferecem energia mais barata, mais segura e, sobretudo, mais limpa. Para a Espanha, também representa uma oportunidade histórica de se aprofundar em uma vantagem competitiva industrial baseada no fornecimento de grandes quantidades de energia verde. Não há desculpas válidas.
Existem certos setores industriais de difícil eletrificação para os quais as tecnologias existentes podem não ser uma solução viável. Por isso, o investimento em novos vetores energéticos, como o hidrogênio verde, é um elemento crucial. No entanto, não podemos permitir que as barreiras tecnológicas em determinados setores sejam instrumentalizadas para atrasar a descarbonização em setores onde contamos com tecnologias maduras, especialmente a geração de eletricidade. E devemos alertar sobre a aposta em tecnologias como a captura de carbono, um véu verde para manter o business as usual da indústria fóssil, mais do que uma opção eficiente e viável de descarbonização.
Diz um provérbio indiano que a terra não é a herança de nossos pais, mas, sim, o empréstimo de nossos filhos. A próxima COP28 deve servir para patrocinar um futuro de bem-estar, distante, finalmente, dos combustíveis fósseis. Temos todas as tecnologias que precisamos. Devemos agir para garantir a habitabilidade de nosso planeta, mas, além disso, para construir um horizonte de prosperidade para todos.
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COP28: por um futuro de bem-estar longe dos combustíveis fósseis - Instituto Humanitas Unisinos - IHU