10 Outubro 2023
"É sobretudo a essas pessoas [os negacionistas] que se dirige o Papa com a exortação Laudate Deum, Louvai a Deus, ou seja, não coloquem o homem e a tecnologia no centro de tudo, mas a Criação, da qual o homem é parte fundamental, mas não exclusiva", escreve Riccardo Luna, jornalista italiano, em artigo publicado por La Repubblica, 05-10-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Em 24-05-2015, o Papa Francisco publicou a sua segunda encíclica e mudou o mundo. Ele a chamou de Laudato si', como a abertura do Cântico das Criaturas, mas a sua homenagem não era apenas ao santo de quem tomou o nome pontifical: era uma virada. Pela primeira vez na história milenária da Igreja uma encíclica tratava da relação entre os seres humanos e a natureza. Alguns meses mais tarde em Paris quase todos os países do mundo, reunidos para esses eventos anuais que se chamam COP, aprovaram um acordo histórico em virtude do qual estamos agora empenhados em reduzir as emissões poluentes, especialmente as causadas pela queima de petróleo e carvão, de forma a conter o aumento da temperatura da Terra.
Aquele acordo ainda hoje é a nossa estrela-guia para combater o aquecimento global; e aquela encíclica continua a ser o documento político mais importante que explicar as suas motivações profundas, a urgência. Na última quarta-feira o Papa Francisco quis atualizá-la com uma "exortação a todos os homens de boa vontade", que visa sacudir as consciências dos poderosos do mundo em vista do próximo encontro global, a COP28, que será realizado em Dubai no início de dezembro.
As coisas não parecem boas para os ambientalistas: na pauta global parece sempre haver um problema mais premente a resolver do que a transição ecológica, enquanto se adensam as fileiras dos negacionistas, daqueles que dizem que sempre fez calor, que sempre teve furações e inundações, que as geleiras derreteram e depois se reformaram por milhões de anos. Em suma, estamos fazendo muito barulho por nada. É sobretudo a essas pessoas que se dirige o Papa com a exortação Laudate Deum, Louvai a Deus, ou seja, não coloquem o homem e a tecnologia no centro de tudo, mas a Criação, da qual o homem é parte fundamental, mas não exclusiva.
Aos negacionistas das mudanças climáticas o Papa dirige um texto de uma clareza exemplar: não há o tom austero na doutrina da Igreja; não há as inevitáveis complexidades da ciência; e não há nem sequer as injúrias dos ambientalistas mais preocupados, daqueles que recorrem a ações extremas para tentar chamar a nossa atenção. A Laudate Deum mesmo assim mantém juntas todas essas exigências e as resume de forma acessível a qualquer um. É um texto cientificamente muito sólido, o que poderia animar os debates nas escolas, que poderia acabar nos stories de uma rede social compartilhadas milhares de vezes. Talvez aconteça. Talvez a COP no Dubai não será o fracasso que muitos temem. Em todo caso, não creio que já tenha havido um Papa no papel de divulgador científico.
O Papa Francisco não está falando aos bispos, está falando a todos nós que não estamos fazendo o suficiente e que os danos das mudanças climáticas já estão sendo pagos pelos mais pobres, forçados a deixar os seus países. Ele está nos dizendo para pararmos de fazer falsas promessas e realmente tentarmos mudar o mundo.
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A lição de ciência do Papa ambientalista. Artigo de Riccardo Luna - Instituto Humanitas Unisinos - IHU