Publicamos aqui o comentário do monge italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose e da Casa della Madia, sobre o Evangelho deste 26º Domingo do Tempo Comum, 1º de outubro de 2023 (Mt 21,28-32). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Jesus terminou sua viagem rumo a Jerusalém, a cidade santa onde entrou aclamado como Messias, filho de Davi, pelos discípulos que o acompanhavam e pelas multidões; expulsou do templo aqueles que impediam que ela fosse uma casa de oração e simbolicamente secou a figueira que não dava frutos (cf. Mt 21,1-22).
Essas ações provocam uma profunda indignação por parte das autoridades religiosas legítimas, mas perversas, “sacerdotes e anciãos” que intervêm publicamente perguntando a Jesus com que autoridade ele realiza esses gestos provocativos. Mas Jesus não responde, antes faz-lhes uma pergunta sobre a missão de João Batista: missão desejada por Deus ou missão que João inventou por conta própria?
Essa interrogação, porém, não recebe uma resposta (cf. Mt 21,23-27), e então Jesus lhes dirige três parábolas: a dos dois filhos, a dos vinhateiros assassinos e a dos convidados ao banquete nupcial (cf. Mt 21,28-22,14). De fato, são três parábolas com as quais ele tenta causar um arrependimento naqueles seus adversários que, em pouco tempo, serão seus acusadores e seus condenadores.
Para Jesus, as parábolas são justamente um instrumento para mudar os pensamentos e as atitudes daqueles a quem são dirigidas. Mas aqui acontecerá exatamente o oposto. Em vez de se interrogarem e de se converterem, sacerdotes e anciãos se indignarão ainda mais e, compreendendo que tais relatos se dirigem precisamente a eles, endurecerão ainda mais seus corações, aumentando sua oposição e seu ódio contra Jesus.
Escutemos, portanto, a primeira parábola, em obediência ao ordo litúrgico que a prevê para este domingo: “Que vos parece?”, uma introdução que é um convite a pensar e a fazer discernimento, porque no fim haverá outra pergunta de Jesus, que exigirá uma resposta clara e decisiva.
“Um homem tinha dois filhos. Dirigindo-se ao primeiro, ele disse: ‘Filho, vai trabalhar hoje na vinha!’ O filho respondeu: ‘Não quero’. Mas depois mudou de opinião e foi.”
A resposta inicial é irreverente, sob a insígnia da desobediência consciente. Mas esse filho que ousa resistir ao pedido do pai e lhe nega a obediência, em seguida (hýsteron) muda de ideia, muda de opinião (metameletheís) e vai trabalhar na vinha. Assim ele mostra que se arrependeu: ao pensar, mudou de ideia, e sua falta de vontade se transformou em obediência possível para ele.
Depois, entra em cena o segundo filho. O pai se dirige a ele da mesma forma que o outro, e a resposta que recebe é positiva: “Sim, senhor (Kýrios), eu vou!”, mas depois não foi. Estamos diante de um filho que respeita o pai, que até o chama de senhor. É respeitoso talvez por medo, por ser incapaz de dizer um “não” a seu pai. Ou é respeitoso porque se alimenta do formalismo: diz “sim” ao pai, como exige a lei e a práxis, mas depois não cumpre sua vontade. Talvez pense que o pai não se dará conta de que ele não pôs em prática o que disse... Não conhecemos as motivações da não execução do convite: resta o fato de que a vontade do pai não é cumprida. Esse segundo filho se contenta em fazer uma declaração verbal conforme o desejo do pai e não percebe sua própria incoerência: assim como um cego, ele não vê, não lê a si mesmo...
É evidente que o que acontece nessa parábola acontecia no tempo de Jesus, entre os fiéis judeus, mas acontece ainda hoje nas comunidades dos discípulos, na Igreja. Sempre houve, há e haverá aqueles que dizem: “Senhor! Senhor!”, invocam-no e muitas vezes têm seu nome nos lábios, mas depois não fazem a vontade de seu Pai que está nos céus (cf. Mt 7,21). As palavras de Jesus querem desmascarar esses fiéis que confiam no fato de frequentarem as assembleias nas quais ressoa a palavra do Senhor, que participam de refeições com o Senhor, comendo e bebendo à sua mesa (cf. Mt 7,22-23; Lc 13,25- 27), mas na verdade sem serem concretamente discípulos no seguimento de Jesus, na tentativa de conformar sua vida à dele. Militantes, é claro, mas sem serem discípulos!
Graças a essa parábola, somos convidados a discernir no nosso hoje aqueles que de fato, sem saber, são representados pelo primeiro ou pelo segundo filho: homens religiosos que se orgulham da pertença confessional e falam, falam...; dizem “sim” à vontade de Deus, mas no dia a dia não a realizam, porque, para eles, é mais importante aparecer do que ser e fazer.
Por outro lado, aqueles que parecem dizer constantemente “não” a Deus porque não se mostram religiosos, porque não proclamam sua pertença religiosa, vivem-na no anonimato, na cotidianidade, realizam a vontade do Senhor sem nomeá-lo e às vezes sem conhecê-lo. Perfeitos anônimos para nós, mas que simplesmente “praticam a justiça, amam a misericórdia e caminham humildemente com Deus” (cf. Mi 6,8).
Eis então, pontualmente, no fim da parábola, a pergunta de Jesus: “Qual dos dois fez a vontade do pai?”, seguida da resposta óbvia dos sacerdotes e dos anciãos: “O primeiro!”.
E então Jesus os convida a tirar as consequências, comentando: “Em verdade vos digo, que os cobradores de impostos e as prostitutas vos precedem no Reino de Deus”. Palavras de Jesus duras como pedras, porque constituem o julgamento proferido sobre esses ouvintes. Mas por quê? Não é paradoxal? Mas é assim, porque aqueles que publicamente se apresentam como pecadores e são considerados assim por todos são vítimas da vergonha e sentem dentro de si o desejo, mais ou menos escutado, de mudar de vida: desejam sair de sua vida de pecado, que outros desprezam e condenam.
Já os homens religiosos (aqui os sacerdotes e os anciãos, interlocutores de Jesus), que parecem observantes, mas têm pecados ocultos, já que todos os veneram e todos olham para eles pelo seu status, não querem de forma alguma mudar de vida.
Uns, portanto, estão abertos a um convite a se converterem, enquanto os outros se sentem bem e acham que não precisam de nenhuma conversão: daí nasce a sua hipocrisia, a sua rigidez, o seu julgamento e espionagem dos outros, sem nunca se interrogarem sobre si mesmos; estão sempre prontos a absolver-se, porque, aos olhos das pessoas, parecem justos e até exemplares...
Repito, para que fique bem claro. Quem peca às escondidas nunca é estimulado à conversão por uma repreensão que vem dos outros, porque continua sendo venerado e estimado por aquilo que aparece de sua pessoa no exterior: essa é a doença da maioria das pessoas, incluindo justamente aquelas que são religiosas e devotas, que acham que devem servir de exemplo para os outros...
Aqueles que, pelo contrário, são pecadores públicos encontram-se constantemente expostos ao julgamento e à culpabilização dos outros, e de tal modo são induzidos a um desejo de mudança. Somente animado por tal desejo, somente no arrependimento que nasce de um coração quebrantado – é isso etimologicamente que significa “contrito” (cf. Sl 34,19; 51,19; 147,3) – é que o ser humano pode se tornar sensível à presença de Deus.
E assim Jesus anota que, quando João Baptista veio pedir a conversão, os pecadores públicos responderam ativamente ao convite e se converteram, enquanto os sacerdotes e as autoridades religiosas, apesar de terem visto, não mudaram nada em seu comportamento para aderir à sua mensagem.
Com essa parábola, portanto, Jesus interroga a cada um de nós, se queremos ouvi-lo. E cada um de nós, quanto mais for reconhecido pela sua profissão de fé, mais deve se interrogar: diz “sim” a Deus apenas com palavras ou realiza sua vontade sem alarde e sem ostentação, humildemente?
Em suma, “no último dia, o dia do juízo” – como diz uma afirmação tradicionalmente atribuída a Agostinho, que deveríamos ter bem em mente – “muitos dos que achavam que estavam dentro serão encontrados fora, enquanto muitos que achavam que estavam fora serão encontrados dentro do reino dos céus”.