"Fati Dosso e a pequena Marie fugiam da Costa do Marfim. Elas morreram de fome e sede antes que pudessem realizar seu sonho de um futuro melhor", escreve Antonella Napoli, jornalista, em artigo publicado por Settimana News, 26-07-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
A mãe e a filha, símbolo da tragédia que se desenrola no deserto na fronteira entre a Líbia e a Tunísia, têm nomes e rostos. Na qualidade de Focus on Africa tínhamos assumido isso como um compromisso humano, antes mesmo que profissional.
Fati Dosso e a pequena Marie fugiam da Costa do Marfim. Elas morreram de fome e sede antes que pudessem realizar seu sonho de um futuro melhor. Dar uma identidade às enésimas vítimas de políticas antimigrantes desumanas era um dever e graças aos colegas da Libye Actualité e da ONG Refugees in Lybia foi possível dar-lhes dignidade.
De momento sabemos que Fati tinha 30 anos e nasceu no oeste da Costa do Marfim, numa pequena aldeia chamada Man. Quando os seus pais morreram, mudou-se para a Líbia onde viveu durante 5 anos com o marido, também com trinta anos, Meengue Nymbilo Crepin, apelidado de Pato, pai de Marie que tinha apenas 6 anos.
Depois de várias tentativas de cruzar o Mar Mediterrâneo, mudaram-se da Líbia para a Tunísia, onde planejavam criar sua filha. Pato estava com a mulher e a pequena Marie quando foram expulsos do acampamento, onde viviam há um ano, e forçados a fugir rumo à fronteira entre a Tunísia e a Líbia. Só podemos supor que ele não estava com elas no momento da morte de Fati e Marie porque havia ido procurar água antes de perdê-las de vista. Pato ainda está desaparecido ou poderia ter sido resgatado pelos guardas de fronteira da Líbia.
Eram pessoas, não "invasores" a serem detidos.
Como as dezenas de milhares de migrantes que morrem tentando cruzar a fronteira entre a Líbia e a Tunísia, os 461 km de areia e arbustos que se estendem desde o mar Mediterrâneo, ao norte, até a tríplice fronteira com a Argélia, ao sul. Uma árida região desértica onde os sonhos se transformam em pó.
Mulheres, homens e crianças que, procurando uma alternativa à fome, violências e guerra, encontram um destino inefável. Para a maioria dos que tentam chegar às costas do Mediterrâneo, para embarcar rumo à Europa, as esperanças se esfacelam antes mesmo de cumprir a metade da viagem.
Em sua maioria, são africanos subsaarianos em busca de uma vida melhor, engolidos por uma terra de ninguém, onde as fronteiras se dividem e se transformam em barreiras. Eles são deixados à mercê de um sol assassino, condenados à morte certa porque suas vidas não significavam nada para os politiqueiros.
A morte desses seres humanos sem alternativas, porque é isso que eles são, vem com uma lenta e dolorosa desidratação, um fim cruel e trágico. Seu grito por misericórdia se perde no deserto enquanto as nações ocidentais que eles anseiam alcançar tentam manter por todos os meios suas esperanças e sonhos sob controle.
Hoje lamentamos não apenas Fati e Marie, mas uma multidão de almas sem rosto, um número sem fim, vítimas de um mundo que as decepcionou. Um mundo que perdeu toda fagulha de compaixão.