12 Mai 2023
"As reflexões desta obra foram divididas em três eixos: 1) Virgem Maria, nossa irmã, na ordem da redenção (p. 13-69); 2) Maria na Igreja sinodal: pastoral (p. 71-151); 3) Rosto mariano do Brasil: dimensão histórica e piedade popular (p. 153-230)", escreve Eliseu Wisniewsk, presbítero da Congregação da Missão (padres vicentinos), Província do Sul, e mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
A obra Maria, nossa irmã: no caminho sinodal da Igreja (Santuário, 2023, 232 p.), organizada por José Ulysses da Silva recolhe os textos das palestras e seminários apresentados durante o XV Congresso Mariológico, promovido pela Academia Marial, de 31 de maio a 3 de junho de 2022, em Aparecida, SP e teve como tema central: Virgem Maria, nossa irmã, no caminho sinodal da Igreja. A Academia Marial de Aparecida foi fundada em 16 de julho de 1985 e vinculada ao Santuário Nacional da Conceição Aparecida (Aparecida, SP), é uma associação pública de fiéis, tendo por objetivo o cultivo da reflexão sobre a Virgem Maria em todos os seus aspectos, com destaque para a pastoral e incluídas a promoção da devoção à Padroeira do Brasil, a pesquisa científica marial e a preservação de um acervo mariológico.
As reflexões desta obra foram divididas em três eixos:
1) Virgem Maria, nossa irmã, na ordem da redenção (p. 13-69);
2) Maria na Igreja sinodal: pastoral (p. 71-151);
3) Rosto mariano do Brasil: dimensão histórica e piedade popular (p. 153-230).
Maria, nossa irmã: no caminho sinodal da Igreja (Foto: Divulgação)
1) Maria, verdadeiramente filha e verdadeiramente irmã (p. 15-33), de autoria de doutora em Teologia Ir. Maria Freire da Silva –, tendo como chão hermenêutico o Antigo Testamento, debruça-se sobre os textos do Novo Testamento, dando-nos o fundamento escriturístico da expressão “Maria, nossa irmã”. A autora salienta ao longo de sua reflexão que reconhecer Maria como nossa irmã, a Filha de Sião, requer o entendimento antropológico como essencial na encarnação do Verbo Divino: o corpo humano a serviço do Projeto de Deus e dá carne ao Filho de Deus encarnado. Ainda exige compreender Maria no interior do Plano de Salvação.
2) Maria, nossa verdadeira irmã na ordem da cooperação da redenção (p. 35-46), escrito pela doutora em Teologia Alzirinha Rocha de Souza, a qual estrutura sua abordagem a partir de três chaves de leitura: a) o tema da fraternidade de Maria conosco: Maria nossa irmã; b) o tema da redenção/salvação; c) o tema da cooperação e da práxis cristã. Nestas páginas a autora mostra é a compreensão da cooperação/colaboração de Maria que nos toca diretamente, porque Ela é efetivamente a Mãe de Deus, a Teotokus, e em igual força nossa irmã. A ação mariana se dá a partir do que ela é: mulher, crente e livre. É o agir de Maria que nos orienta e nos ajuda a construir nosso agir cristão, de modo que nossa práxis se transforme em testemunho para a construção do desvelar do Reino de Deus, no momento histórico em que estamos, e possamos exercer igualmente nossa colaboração.
3) Maria tecida pelos fios veterotestamentários nos mosaicos de Marko Ivan Rupnik, SJ (p. 47-69), elaborado pela doutora em Ciências da Religião Wilma Steagall de Tomasso. Neste capítulo Tommaso apresenta dois mosaicos específicos que prefiguram a Virgem Maria na Fachada Norte do Santuário Nacional de Aparecida, cujo tema é o livro do Êxodo: a) o mosaico da Sarça Ardente (Ex 3,1-10) e o b) mosaico da Tenda do Encontro (Ex 26,1s) – mostrando as razões da presença da Virgem Maria nesses dois mosaicos. A autora pontua como a compreensão de Maria enquanto cooperadora/colaborado na obra da redenção tem suas prefigurações no Antigo Testamento e nada melhor que a arte de Rupnik para nos ajudar a mergulhar neste mistério, ressalatando que Rupnik fiel à linguagem iconográfica da tradição cristã do primeiro milênio, contemporânea aos escritos patrísticos apresenta na fachada Norte do Santuário uma leitura simbólica da narrativa bíblica do Êxodo.
4) Com Maria, ser uma Igreja sinodal na comunhão e participação de autoria de Celia Soares de Souza, mestre em Teologia (p. 73-94). Retomando aspectos relevantes das Conferências Episcopais da América Latina e Caribe, pós Vaticano II, os quais fundamentam a importância da sinodalidade na Igreja, o presente artigo apresenta algumas considerações acerca da vida e do testemunho da Virgem Maria, nossa irmã, no caminho sinodal da Igreja, destacando a contribuição de Maria, como, ao se deixar moldar pelo Espírito Santo de Deus, sai apressadamente para servir; participa da verdadeira festa de comunhão eclesial e se coloca a serviço da Igreja nascente como Mãe e irmã que nos precede na fé.
5) Maria, nossa irmã, na comunhão dos santos: contribuição de Elizabeth Johnson para uma Igreja fraterna e participativa elaborado pelo doutor em Teologia Ir. Afonso Murad (p. 95-119). Tendo como ponto de partida a obra: Nossa verdadeira irmã: teologia de Maria na comunhão dos santos de autoria de Elizabeth Johnson – neste capítulo –, o intento de Teologia Ir. Afonso Murad é contribuir com a reflexão sobre a relação de Maria com a comunidade eclesial, que seja simultaneamente fiel às origens cristãs e às demandas de nosso tempo. Para isso, o referido autor mostra que tal elaboração teológica, com viés teórico e operacional, auxilia a edificar uma Igreja caracterizada por relações de irmandade em vários níveis e várias instâncias, suscitando a participação ativa de todos os batizados: uma Igreja marcada pela sinodalidade.
6) Maria na Sagrada Escritura: a serva, protótipo dos discípulos missionários de Jesus Cristo, em uma Igreja sinodal elaborado pelo mestre em Teologia Diego Willian dos Santos (p. 121-136). Neste capítulo o autor analisa três textos bíblicos: a anunciação, a visitação e as bodas de Caná, nos quais se encontram a solicitude de Maria aos desígnios de Deus e sua dedicação a serviço do próximo. O texto versa também sobre como a Igreja deve agir, cumprindo as exigências do batismo, para ser verdadeiramente missionária e profética. E por fim, aborda-se a fachada norte do Santuário Nacional de Aparecida, tendo como referência a saída operada no Êxodo, caminho de libertação – como interpelação/impulso a servir aqueles que encontramos pelos caminhos da vida.
7) É possível conciliar a visão de Maria de Nazaré, “nossa verdadeira irmã”, com a da Senhora Gloriosa “a mulher mais poderosas do mundo”? –, escrito pelo mestre em Teologia Joaquim Francisco Batista Resende (p. 137-151). Neste capítulo o autor parte de uma matéria de uma importante revista que traia como matéria de capa na apresentando relatos de fé e milagres que consagram a mãe de Cristo como a mulher mais poderosa do mundo. Diante disso pergunta-se: Como devemos acolher essas informações e aproximá-las da Virgem escolhida por Deus, em sua humildade e pequenez? Estamos construindo uma Imagem distorcida e distante da serva do Senhor? Há exagero no afeto e amor devocional que impossibilitam resgatar a figura humana de Maria? Diante disso, Resende com uma reflexão bíblico-patrística permite-nos entender a interface da mulher mais poderosa do mundo com a humilde mãe em Nazaré – No entanto, observa que Maria se tornou a mulher mais importante do mundo porque foi escolhida para ser a Mãe do Filho de Deus e sua importância não está relacionada com os valores terrenos, mas os critérios do Reino de Deus.
8) A presença histórica de Maria na Igreja Povo de Deus elaborado pelo doutor em História Eclesiástica Dilermando Ramos Vieira (p. 155-174). Nesta reflexão percorrendo a história Vieira chama a atenção para o afeto do Povo de Deus por Maria, traduzido em devoção e piedade em diferentes tempos, contextos e lugares. Mais especificamente destaca-se/faz-se um balanço geral do papel que Maria teve na Igreja nos séculos I ao III, o povo cristão e o culto mariano entre o século IV e VII, a piedade mariana popular entre os anos 1000 e 1942, a figura de Maria entre os fiéis da idade moderna, a fé mariana do povo católico na idade contemporânea.
9) Maria no caminhar do povo: piedade mariana e literatura de autoria do doutor em Teologia Jonas Nogueira da Costa (p. 175-193). Afirmando ser possível utilizar-se da literatura em uma reflexão teológica, o autor dá destaque à pesquisa realizada neste âmbito pelo teólogo Karl-Josef Kuschel através do método da analogia estrutural. Esse método viabiliza considerar as correspondências e as diferenças entre o discurso literário e o discurso teológico. Apresentando as razões pelas quais a teologia pode buscar o diálogo com a literatura, Nogueira da Costa elege a obra: O auto da Compadecida de autoria de Ariano Vilar Suassuna – escrita em 1955 para fala da relação entre literatura e piedade popular- convencido de que este texto, enquanto literatura brasileira é o que melhor expressa nosso amor, nossa piedade e confiança em Maria. Nogueira da Costa observa que o Auto da Compadecida, além de ser valioso testemunho da devoção mariana registrado em forma de literatura, muito ajuda na superação de preconceitos que alguns teólogos possuem com relação à piedade mariana, uma vez que, nessa obra, foi narrado o amor e a compreensão popular da figura de Maria com beleza e abrindo diferentes perspectivas de análises teológicas.
10) Com Maria, no caminho sinodal e a vida moral dos cristãos elaborado pelo doutor em Teologia Moral Mário Marcelo Coelho (p. 195-213). Se o caminho sinodal é o discernimento progressivo de todos os batizados, sobre a vontade de Deus para com o povo a caminho, Coelho mostra nestas páginas como o itinerário de vida de Maria nos ensina a ler os sinais de Deus na vida do povo à luz da fé e a perceber como Deus age na Igreja. Observa que o grande mistério cristão da encarnação no seio de Maria, do Verbo de Deus, revela não só o diálogo entre Deus e Maria, mas também o diálogo de Deus com o seu povo. Frente a isso, o caminho sinodal, dentre tantos outros temas importantes e urgentes, também deverá abordar o ensinamento sobre a vida moral dos cristãos. A sinodalidade designa principalmente uma forma de viver e agir na Igreja, por isso, faz parte da missão da Igreja, à luz do Espírito Santo, trazer os cristãos, Povo de Deus, de forma sinodal, não apenas no sentido de caminharem juntos, mas para discernir juntos uma ação. O caminho sinodal deve ajudar a encontrar os caminhos possíveis de resposta a Deus e de crescimento no meio dos limites.
11) Literatura e fé: a Compadecida de Ariano Suassuna como símbolo de resistência e libertação de autoria de Josimar Diogo da Silva (p. 215-230). Através da análise de comentários específicos da teoria e /ou crítica literária, bem como de estudos teológicos mais estritamente aos que se referem ao campo teológico conhecido como Teologia da Libertação, com a finalidade de estabelecer uma maior interação entre a obra literária investigada e a reflexão teológica – a presente reflexão aponta a possibilidade de abordar a personagem Compadecida sob a ótica literário-teológica como representação de um ideal teológico sociolibertador. O autor esclarece que na obra saussuriana a realidade social é constantemente interpelada pela fé – confirmando a hipótese de que a Compadecida é compreendida como aquela que realiza a passagem do ethos à práxis, fazendo referência a valores éticos ao enfatizar temas como a exploração do pobre sua marginalização, abuso de poder por parte das autoridade religiosas, subordinação da mulher ao homem e a violência doméstica – parecem conferir à personagem um simbolismo que expressa seu protagonismo ainda maior de resistência cultural, valorização da mulher, sua liberdade, emancipação e afirmação de sua identidade cultural em seu mais diversos aspectos.
Olhar Maria como nossa irmã... Sabedores que Maria constitui a expressão religiosa mais onipresente, mais diversifica e popular e, em sintonia com o sínodo sobre a sinodalidade que está em marcha na Igreja Católica –, a riqueza desses textos, fruto da XV edição do Congresso Mariológico possibilita ao leitor refletir sobre a Virgem Maria, nossa Irmã, no caminho sinodal e entender que Ela é plenamente nossa Irmã, por ser mulher e participar da nossa humanidade redimida pelo mistério pascal. Ela é nossa Mãe, porque se tornou a cooperadora do mistério da Redenção para todas as gerações. Por isso, Maria sempre foi uma cristã sinodal, no sentido de que caminha junto com seu Povo, desde Pentecostes até a consumação da história da nossa salvação.
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Maria, nossa irmã no caminho sinodal da Igreja. Artigo de Eliseu Wisniewski - Instituto Humanitas Unisinos - IHU