24 Março 2023
Desta vez, o símbolo da paz não é uma pomba, mas um leopardo das neves. Um felino em risco de extinção que o papa gostaria de visitar na Rússia siberiana, um expediente para manter vivas as relações com Moscou em meio a tanta turbulência.
A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por La Repubblica, 23-03-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
Um cenário a meio caminho entre visão onírica e história de espionagem cuja fonte – única – é um personagem que por sua vez parece sair de um romance: Leonid Sebastianov, presidente da “União Mundial dos Velhos Crentes”, marido de Svetlana Kasyan, uma cantora de ópera que tem alguma familiaridade com o papa. Tanto que – é uma das poucas provas documentais de todo o caso – nos últimos meses, Francisco enviou ao casal um bilhete de próprio punho. “Falei com o embaixador russo e disse a ele que estava disposto a viajar para Moscou”, escrevia o papa na nota publicada em maio pela Askanews: “Estou disposto a trabalhar pela paz".
Agora, segundo Sebastianov, Francisco teria "adotado" um leopardo do parque nacional de Vladivostok, rebatizando-o com o nome de Martin Fierro, o falecido gaúcho argentino século XIX que se opunha orgulhosamente aos colonizadores europeus. O leopardo como metáfora de orgulho russo e manifestação de empatia por suas reivindicações? Em declaração à Tass, Sebastianov, homem com sólidos contatos no círculo íntimo de Putin, declarou que o Papa teria até expressado o desejo de fazer uma etapa em Vladivostok no próximo mês de setembro em seu retorno de uma viagem à Mongólia. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, ficou surpreso: “Não sei de nada, aguardamos uma declaração do Vaticano”. Mais que uma desmentida, uma meia-abertura.
O Palácio Apostólico, por sua vez, manteve-se em silêncio: nem mesmo a visita à Mongólia, de resto, já está decidida. Certamente Bergoglio, desde o início da guerra, tentou intervir sobre Putin, mas sem resultados. No entanto, a tentação de mostrar um Papa que está do lado da Rússia, e de seus leopardos, pode fazer parte dos planos de Moscou. Só que o WWF – há anos engajada no repovoamento do felino – acaba de ser expulsa da Rússia, tachada como "agente estrangeiro". Quem sabe, porém, se manter os canais abertos com a "diplomacia do leopardo" no momento oportuno não possa ajudar a mediação para a paz do Pontífice.
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Francisco e a “diplomacia do leopardo” para conter Moscou - Instituto Humanitas Unisinos - IHU