Publicamos aqui o comentário do monge italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose, sobre as leituras deste 3º Domingo do Advento, 11 de dezembro de 2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
É preciso se alegrar e cantar, porque se cumpre a promessa de que o deserto, terra desolada, se torna uma terra fecunda e luxuriante. É uma alegria cósmica, que envolve não só os seres humanos, mas também o deserto e a estepe. O deserto não só não avança, mas, graças à manifestação da glória do Deus vivo, transforma-se em um bosque como o do Líbano, em uma pradaria florida como os montes do Carmelo e de Saron. O grito que ressoa é, portanto, um convite à coragem para quem tem as mãos fracas, os joelhos vacilantes, o coração partido... Deus vem salvar seu povo, e eis o fim dos sofrimentos e o dom da plenitude, da integridade, da saúde e da paz: a peregrinação rumo a Jerusalém, portanto, pode ocorrer em uma estrada segura e sem obstáculos.
O apóstolo pede à comunidade cristã que não se canse na espera da vinda gloriosa do Senhor. Por três vezes ressoa o verbo makrothyméo, que indica o fato de ser paciente, mas, sobretudo, sentir grandemente. É uma atitude decisiva para poder discernir a parousía, a vinda do Senhor, e não se deter na crônica mundana: essa vinda, de fato, aproxima-se, acelera-se, urge. E o que essa espera do Juiz requer? Que os cristãos não se julguem uns aos outros, mas, na caridade recíproca, confiem na misericórdia do Senhor. O exemplo vem dos profetas, os porta-vozes de Deus, que mostraram submissão (kakopathía) e paciência (makrothymía), perseverando até o fim, até o encontro com Aquele que vem.
Nestes tempos de espera d’Aquele que vem, as tentações são muitas: por que continuamos esperando, enquanto os milênios passam? Quem é Aquele que vem e que será manifestado por Deus? Não estamos enganados nessa espera? Mesmo quem tem uma fé firme pode conhecer essas tentações e não está isento de passar horas de desolação e de escuridão, perguntando-se se não está enganado, se não entendeu mal a promessa do Senhor.
Porque mesmo uma vida que quer ser uma resposta convicta a um chamado de Deus, mesmo uma vida empenhada no seguimento de Jesus pode chegar a se perguntar se toda a aventura não foi uma ilusão... Sobretudo quando se tenta avaliar os frutos do esforço feito e o resultado do caminho percorrido, tudo pode parecer decepcionante, não à altura do que se esperava e se buscava.
No Evangelho segundo Mateus, essa provação também é vivida por João Batista. Ele se sentira chamado por Deus ao deserto, reunira uma pequena comunidade de discípulos à espera do Messias e, por revelação de Deus, vira em um de seus próprios discípulos, Jesus, Aquele que vem, ao qual ele devia preparar o caminho.
Fiel à palavra de Deus contida na profecia e por ele meditada e assimilada, ao anunciar aquela vinda e aquela presença, João tinha se servido de imagens tradicionais: será um homem forte, cheio da força do Espírito Santo, será o Salvador e o Juiz com o machado na mão para cortar as árvores infrutíferas e com o leque para separar a palha, digna do fogo, do bom grão. Ele havia pregado a urgência da conversão, do retorno ao Senhor, para fugir da cólera, a paixão de justiça de Deus que vem visitar seu povo (cf. Mt 3,1-12). Depois de ter imerso Jesus também no Jordão e de o ter indicado a Israel (cf. Mt 3,13-17), João havia sido preso por Herodes (cf. Mt 4,12): então, Jesus tinha abandonado o deserto da Judeia para dar início a seu ministério de pregação do Reino na Galileia (cf. Mt 4,17).
Precisamente enquanto está na prisão na fortaleza de Maqueronte, perto do Mar Morto, João recebe notícias da atividade e do estilo de Jesus: é a hora da prova. No cárcere, abandonado por todos, prisioneiro entre quatro paredes, à espera da própria condenação de Herodes, consciente de que seu fim não pode ser diferente do dos profetas, João se interroga perplexo e talvez até confuso: quem ele teria anunciado? O Messias? Mas o Messias liberta os prisioneiros, enquanto ele apodrece na prisão, acorrentado. Ele havia anunciado o Enviado de Deus? Mas Jesus não parece cumprir o juízo dos ímpios e dos justos. Não acontece nada do que havia sido previsto pelos profetas para o dia do Senhor.
João talvez tinha entendido mal a palavra do Senhor que lhe havia sido dirigida ou havia se iludido de que a sentia em seu próprio coração? Há um evidente contraste entre o que ele havia anunciado e o que está se realizando por meio de Jesus! E, depois, alguns dos discípulos de João também se escandalizaram com o comportamento de Jesus, que não jejua mais como eles (cf. Mt 9,14-17), que não desdenha de se misturar com os pecadores (cf. Mt 9,9-13). A separação dos pecadores e uma vida ascética no deserto não parecem ser traços distintivos de Jesus.
Por essas razões, do cárcere, João envia alguns de seus discípulos para interrogar o próprio Jesus: “És tu aquele que há de vir (ho erchómenos) ou devemos esperar um outro”. Eis a grandeza de João: na escuridão da provação, ele não decide por si mesmo, não dá a si mesmo uma resposta, mas deixa que Jesus a dê. Ainda que não veja uma correspondência entre a própria visão d’Aquele que vem e sua realização prática por parte de Jesus, no meio de suas dúvidas, deixa que Jesus mesmo as explique e decida.
E Jesus não responde diretamente: “Sou eu”, mas responde com o testemunho de sua obra, em conformidade com a missão do profeta anônimo anunciado por Isaías (cf. Is 61,1-3). Escolhendo alguns textos proféticos em detrimento de outros (cf. Is 25,19; 29,18-19; 35,5-6), ele indica que tipo de Messias ele é, não um justiceiro, não um poderoso triunfante, mas alguém que cura, faz o bem, consola e sobretudo se dirige aos pobres: “Ide anunciar (apanghéilate) a João o que estais ouvindo e vendo: os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados. Feliz aquele que não se escandaliza por causa de mim”.
Jesus só pode dizer a João que suas obras são a realização das promessas de Deus, mas, mesmo vendo essas obras, é possível ficar decepcionado com quem as faz: por isso, é bem-aventurado quem consegue ter fé em sua humilde, mansa e pobre pessoa.
Mas, se o profeta Jonas havia sido desiludido por Deus, João não fica assim com as palavras de Jesus e adere a elas, reconhecendo a ele a autoridade última e decisiva. Nesse ponto, Jesus sente o dever de dizer uma palavra à multidão sobre João. Quem era ele verdadeiramente? Um homem firme e convicto que não tremia diante dos poderes deste mundo (cf. Jr 1, 17-19): o contrário de um caniço que se bate a cada sopro de vento.
Um homem rochoso, com uma postura ereta, que não se curvava perante ninguém, exceto o Senhor. Um homem que sempre se manteve distante dos palácios dos reis e dos sacerdotes. Um homem que não conhecia as vestes deslumbrantes, preciosas ou macias: não frequentava salões e sabia se manter distante daqueles que usam seu poder para contaminar e escravizar os outros. João era um profeta, um porta-voz de Deus, o mensageiro e precursor do Senhor.
Verdadeiramente – como testemunha Jesus – “de todos os homens que já nasceram, nenhum é maior do que João Batista”, pelos seus dons e pela sua qualidade humana e ética. Porém, “o menor”, isto é, o próprio Jesus, tendo se abaixado até ao último lugar, rejeitado até à condenação na cruz, julgado não como mártir, mas como excomungado, “no reino dos céus é maior do que ele”. E, se João não encontra em Jesus um motivo de tropeço, de obstáculo, então é bem-aventurado!
Por isso – como Jesus conclui com uma palavra de traços até misteriosos – “desde os dias de João Batista até agora, o Reino do Céu sofre violência, e são os violentos que procuram tomá-lo” (Mt 11,12). É a violência pacífica de João, é seu discernimento sofrido, mas firme, que é a chave para ter acesso ao Reino e para acolher aquele que é o Reino feito pessoa: Jesus, Aquele que vem, cuja boa notícia está tão distante de nossos esquemas religiosos!