“O peso da castidade na vida dos padres”. Entrevista com Marco Marzano

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28 Outubro 2022

Marco Marzano, professor titular de Sociologia na Universidade de Bérgamo, há anos escuta histórias de tormento e solidão no mundo sacerdotal. No livro 'A casta dos castos, sacerdotes, sexo e amor" revela um universo que precisa de reformas urgentes, “um sistema de mentiras e segredos que produz consequências dramáticas para o próprio clero e para toda a comunidade cristã".

A entrevista com Marco Marzano é de Chiara Ponchia, publicada por Quotidiano Nazionale, 27-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis a entrevista.

Professor, o Papa transferiu um velho problema para o plano digital. O diabo entra no seminário através de pornografia na web para roubar as almas consagradas. Também das freiras. Um surpreendente grito de alarme.

E por que você está surpreso? O Pontífice fala de uma realidade que verifiquei em campo em dezenas de entrevistas. Os padres fazem uso maciço da pornografia. Antigamente nos seminários se dava a caça às revistas pornográficas, hoje basta um celular. Francisco nos acostumou a observações improvisas que não são matéria de doutrina, mas o problema é sério porque mais uma vez leva de volta à afetividade e à sexualidade do clero, às necessidades primárias que a Igreja continua a não querer enfrentar.

Celibato obrigatório. A promessa solene de uma vida casta. Mas que você, no entanto, confirma não ser a regra.

Minhas pesquisas mostram que a vida sexual do clero é muito diferente do que gostaria o Papa, mas a questão continua a não ser abordada. A castidade serve à Igreja para preservar seu caráter sacro, a ideia do padre puro está profundamente arraigada em nossa cultura que, bem no fundo, insiste em considerar o sexo algo sujo. A castração simbólica, não ter desejos, é ainda sinônimo de santidade. Assim, nem mesmo se toma em consideração que a santidade possa passar por um amor vivido de forma transparente e respeitosa.

No que se refere ao amor, tudo bem. Mas os padres que consomem pornografia continuam sendo uma imagem forte.

E a advertência que vem de cima banaliza, ridiculariza o que para muitos é um drama. Resistam às tentações, não olhem para as mulheres nuas. Como o padre que no confessionário adverte o menino contra a masturbação. Anacrônico. Eu gostaria que o Papa se debruçasse sobre o desejo de autenticidade de muitos jovens. Isso está além da pornografia, que é apenas uma das explicitações da sexualidade, aquela da imaturidade e da aprendizagem. Conheci sacerdotes que tinham intensa atividade sexual, muitas vezes feita de múltiplas relações. Muitas vezes vividas com inadequação e enormes sentimentos de culpa, mas às vezes também com serenidade. Precisamos de uma reviravolta, não de uma piada.

Na Alemanha, estão pedindo isso há tempo.

E se toma tempo. Porque se a Igreja enfrenta o problema abertamente, cai.

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