"Diante do ressurgimento da moderna guerra total, e em particular diante da ameaça de catástrofe nuclear, o princípio claramente enunciado por Bento XV se tornaria de fato imediatamente aplicável".
O artigo é de Daniele Menozzi, historiador do cristianismo e professor emérito da Normale di Pisa, em artigo publicado por Settimana News, 20-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
A definição da guerra, então em curso há quatro anos, como "massacre inútil" é encontrada em uma carta que em 1º de agosto de 1917 Bento XV dirigiu aos líderes das nações beligerantes.
Não é fácil compreender o real significado da expressão usada pelo pontífice. As interpretações que foram dadas ao longo do século que nos separam de seu uso pesam muito.
Depois de ter sido vilipendiada como derrotista após sua publicação, ridicularizada durante o fascismo e no início da era republicana confinada ao esquecimento, voltou a aparecer nas últimas décadas. Aplicada não só à Primeira Guerra Mundial, mas a todo embate bélico, passado, presente e futuro, hoje sofre um evidente processo de banalização.
Gostaria, portanto, de tentar esclarecer o seu sentido efetivo. Proponho atingir esse objetivo por meio de sucessivas aproximações à compreensão histórica do documento em que aparece.
Parto de alguns aspectos do contexto internacional em que o papa amadureceu a decisão de redigi-lo. No verão de 1917, a Santa Sé, que em 1914 havia proclamado sua neutralidade e imparcialidade, parecia ter amadurecido condições favoráveis para uma iniciativa destinada a favorecer o início de uma negociação.
Do lado dos Impérios Centrais, o imperador austríaco Carlos I havia suavizado a rigidez de seu antecessor, Francisco José, em relação a qualquer concessão à Itália.
Na Alemanha, a assunção da chancelaria pelo moderado Michaelis – sobre cuja fraqueza política em relação aos ambientes militares prussianos Roma não tinha conhecimento - parecia oferecer a oportunidade de dar seguimento à moção de paz aprovada pelo Reichstag em 19 de julho.
Por outro lado, o anúncio de uma conferência, marcada para Londres por volta de 10 de agosto, de todos os governantes dos países aderentes à Entente fornecia a oportunidade para acordos rápidos e diretos.
À conjuntura favorável da política internacional somavam-se outros elementos que pareciam mostrar a oportunidade de uma intervenção romana. Em ambos os campos, os comandos militares registravam o cansaço dos soldados devido a uma guerra que, estagnada durante anos nos confrontos de trincheiras, parecia não ter outra saída senão um rastro interminável de destruição, ruínas e morte.
Além disso, também eram crescentes as preocupações das autoridades civis com a manutenção da ordem interna. A impaciência das populações, que em toda parte se deparavam com uma dramática escassez de alimentos, podia levar a uma crise social no inverno do quarto ano da guerra.
Não era desprovido de fundamento o temor de vários governos de que, nessa situação, a propaganda subversiva dos círculos revolucionários socialistas poderia encontrar sucesso. Testemunhava isso a primeira revolução russa, que ocorreu entre 12 e 15 de março daquele ano.
Um elemento de geopolítica religiosa também contribui a explicar a decisão do papa.
O arcebispo luterano de Uppsala, Söderblom, depois de ter lançado a proposta de uma conferência de paz dos representantes das Igrejas protestantes, que teria lugar no final do ano, havia assinado no Pentecostes de 1917, juntamente com dois coirmãos, o bispo de Oslo e o bispo de Copenhague, um apelo aos cristãos de todos os países. Afirmavam que, como intérpretes da mensagem evangélica de paz, se ofereciam como intermediários para a retomada das relações entre os povos dilacerados pela guerra.
Obviamente, Roma, que proclamava seu papel primordial sobre todo o cristianismo, não podia assistir passivamente ao desenvolvimento de iniciativas de pacificação promovidas por Igrejas cristãs separadas.
No entanto, um impulso decisivo veio, com toda a probabilidade, do papel desempenhado pelos Estados Unidos. Em seu discurso ao Senado em 22 de janeiro de 1917, o presidente estadunidense Woodrow Wilson, prospectando uma "paz sem vitória", havia especificado as regras políticas, mas também morais, que as relações internacionais deveriam seguir.
No início de abril, a entrada na guerra dos Estados Unidos - que a diplomacia do Vaticano havia tentado em vão impedir - inevitavelmente fazia da visão de seu presidente um dos projetos com que deveria se medir qualquer um preocupado com o ordenamento do consórcio humano.
A herança da cultura católica intransigente, que Della Chiesa absorveu no seu percurso formativo e na sua carreira eclesiástica, tornava-o muito sensível a essa questão. O intransigentismo - ainda que com diferentes declinações e acentuações dependendo dos intérpretes e das épocas - de fato indicava no retorno à estrutura organizacional de uma sociedade dirigida como na Idade Média pela autoridade eclesiástica, a via pela qual o mundo moderno poderia resolver todos os seus males, começando com a tragédia da guerra.
A proposta de retorno ao regime de cristandade encontrava um dos elementos centrais na convicção mítica de que, na hierocrática sociedade medieval, o papa desfrutava do poder de dissolver de forma autoritária os conflitos entre os povos, garantindo assim a convivência pacífica entre eles.
A adesão explícita de Della Chiesa a essa concepção foi claramente manifestada em sua primeira encíclica, Ad beatissimi, publicada poucas semanas após o início da Grande Guerra. Aqui o pontífice apresentava o conflito como um flagelo divino enviado aos homens como consequência da apostasia da sociedade moderna da liderança eclesiástica. O processo degenerativo progressivo do mundo moderno encontrava seu resultado mais recente no uso generalizado de novas armas de destruição em massa que já atingiam indiscriminadamente militares e civis.
O papa lembrava que, como punição pelo distanciamento do consórcio humano das normas ditadas pela Igreja, a guerra podia ser superada na medida em que fossem abandonados os pecados que a haviam produzido. Entre estes, o pecado da modernidade política assumiu um papel central, ou seja, a reivindicação do Estado laico de autodeterminar as normas da convivência civil.
Desta forma, o conflito, embora continuando a manter a conotação negativa de uma punição, também aparecia como uma possível via de restauração daquela pacífica civilização cristã que encontrava seu modelo ideal em um retorno ao regime medieval da cristandade sob a direção pontifícia.
A decisão de emanar a nota de agosto de 1917 se inscreve dentro dessa linha de pensamento. As chancelarias para as quais o documento foi dirigido imediatamente detectaram isso. Se a atitude negativa italiana era ditada por temores de uma internacionalização da questão romana ainda não resolvida, a maioria dos governos beligerantes viu na intervenção do Vaticano para definir o terreno sobre o qual era possível iniciar uma negociação, a via como o papado entendia em primeiro lugar fortalecer sua autoridade na política internacional. Além disso, a interpretação dada ao documento pela própria Santa Sé deixava poucas dúvidas a esse respeito.
Em 7 de outubro de 1917, o Secretário de Estado, Cardeal Gasparri, enviava uma carta ao Arcebispo de Sens - um dos poucos ordinários diocesanos que havia defendido abertamente a nota papal - com a faculdade de torná-la pública (obviamente era um convite a fazer isso).
No texto, afirmando querer esclarecer os reais propósitos do pontífice, Gasparri afirmava que Bento XV pretendia com aquele ato assumir o papel de mediador: o papa se propunha a levar os contendores a depor as armas e iniciar um diálogo em vista de uma reconciliação.
Trata-se de uma interpretação das palavras do papa que poderíamos definir como autêntica. Efetivamente, era o principal colaborador do papa que especificava o significado de sua nota. Tal interpretação, colocando a intervenção papal no plano político-diplomático, evidenciava uma implicação óbvia. Ao aceitar sua proposta, os beligerantes teriam reconhecido ao artífice da mediação uma autoridade que inevitavelmente se traduzia numa primazia política.
Uma primeira aproximação à nota mostra, portanto, que sua emanação estava ligada aos esquemas herdados da cultura católica intransigente. O papa, ao fixar as condições preliminares para o início das negociações entre as partes, pretendia assumir novamente um papel de alguma forma diretivo na política internacional.
No entanto, seria redutivo restringir o significado histórico do documento a esse aspecto. A seção da nota dedicada a resolver as questões político-diplomáticas que se encontravam naquele momento na mesa das chancelarias, hoje nos parece muito menos relevante do que outra de suas seções. Trata-se da parte em que o papa desenvolve os princípios de tipo ético-político, que deveriam conduzir à construção de uma paz duradoura.
Nesse plano, Bento XV não se limitava a repropor uma perspectiva há muito avançada pelas correntes que haviam desenvolvido uma cultura de paz, ou seja, a exigência de substituir a força moral do direito à violência das armas. Também fornecia indicações muito precisas para atingir esse objetivo.
Em primeiro lugar, fazia referência à necessidade do desarmamento, especificando a concreta modalidade de execução: supressão simultânea e recíproca do serviço militar obrigatório em todos os países; introdução do voluntariado para a formação de um contingente necessário à manutenção da ordem pública interna e ao desempenho das funções de polícia internacional; instituição de arbitragem obrigatória para a solução das controvérsias entre os Estados, estabelecendo sanções precisas para o país que não a respeitasse.
Além disso, a nota estabeleceu a definição de futuros arranjos europeus com base no critério das aspirações dos povos. Dessa forma, o papa, sem renunciar ao método da autodeterminação dos povos, não apoiava o recurso ao princípio da nacionalidade como norma inderrogável para uma pacífica ordem mundial.
No lugar da necessária criação de Estados nacionais - cujas fronteiras em muitos casos parecia muito problemática estabelecer - também se previa a possível formação de comunidades políticas multiétnicas, multiculturais e multinacionais.
A enunciação desses princípios ético-políticos parece-nos particularmente interessante, porque hoje podemos medir quanto custou à Europa e à humanidade a sua não adoção nas décadas que se seguiram ao fim da Grande Guerra.
No entanto, não é nem mesmo essa maior aproximação ao significado histórico da nota que nos restitui a sua dimensão mais relevante e original. Basicamente, para além de uma maior ou menor proximidade com o discurso wilsoniano sobre a organização da paz futura, sobre o qual a historiografia se debruçou extensivamente, observa-se que essa seção do documento ainda pertencia ao exercício daquela suprema autoridade moral sobre o consórcio humano que a Santa Sé considerava inerente à sua função.
Na realidade, a mensagem papal continha outro elemento que, se considerarmos do ponto de vista de suas repercussões históricas, a torna extraordinariamente importante. Refiro-me justamente à qualificação da guerra como "massacre inútil".
O uso dessa expressão constituiu, de fato, um passo decisivo no atormentado percurso realizado pela Igreja Católica no século passado rumo à deslegitimação religiosa da violência bélica. Para entender esse ponto, convém situar a nota no desenvolvimento histórico das posições de Bento XV em relação à guerra.
Inicialmente, o papa recorrera à doutrina da guerra justa para orientar o comportamento dos fiéis. Essa doutrina baseia-se na presunção de que apenas os governantes dispõem de toda a informação necessária para poder estabelecer se, na sequência de uma violação da justiça nas relações internacionais, seja necessário ou não seguir o caminho das armas para restabelecer o direito internacional violado.
Disso deriva um corolário fundamental. Uma vez que os detentores do poder decidam iniciar uma guerra, apenas um comportamento é moralmente lícito para os crentes: a diligente submissão às ordens da autoridade. Com efeito, pelo exercício da virtude da obediência, podem adquirir méritos em vista do bem primário que, mesmo nessas circunstâncias, devem perseguir: a salvação após a morte.
Bento XV teve muitas razões para repropor essa orientação no início do conflito. Em primeiro lugar, estava em jogo a fidelidade a uma tradição doutrinal milenar que, desde Santo Agostinho e São Tomás até a segunda Escolástica, tinha gradualmente elaborado uma teologia que visava moralizar os conflitos julgados inevitáveis para uma natureza humana corrompida pelo pecado original. Além disso, ao assumir essa posição, o papa poderia combater a sacralização da violência bélica que representava o dado mais vistoso na opinião pública da época.
De fato, os governos dos estados das duas frentes conflitantes - do imperador luterano do Reich alemão ao primeiro-ministro anglicano britânico, do imperador russo ortodoxo ao presidente anticlerical e laico francês – haviam recorrido à categoria da cruzada para mobilizar militares e civis de seus respectivos países.
Em uma guerra total - como já se configurava a Primeira Guerra Mundial - não se tratava mais de derrotar um exército, mas de aniquilar um inimigo que colocava em campo todos os seus recursos, materiais e culturais, para alcançar a vitória.
Para isso era funcional revestir a guerra com uma linguagem religiosa. Isso possibilitava apresentar a parte adversa como o mal absoluto, que era necessário destruir completamente. As correntes nacionalistas desenvolveram ainda mais essa abordagem: ao se apropriarem das categorias cristãs para construir a religião política da pátria, exaltavam a morte sofrida em combate como um martírio que tonava imortal a memória dos caídos.
Mas o recurso à teologia da guerra justa não permitia apenas a Roma tomar as distâncias daqueles que, fora da Igreja, qualificavam o conflito como uma "guerra santa". Mesmo dentro do mundo católico estava se começando a sacralizar a guerra. Eclesiásticos e fiéis das duas frentes afirmavam que, como nas cruzadas medievais pela libertação do sepulcro de Cristo, também a morte em batalha pela vitória da pátria constituía um martírio apto a permitir o acesso automático à vida eterna.
Conduzindo o empenho bélico do crente a um mero dever de obediência, o pontífice evitava assim deslizes perigosos dos católicos para a transferência da sacralidade da Terra Santa para a nação. Em suma, com o recurso à teologia da guerra justa, Bento XV evitava aquela contaminação entre a religião política laica da nação e o catolicismo que circulava em alguns ambientes eclesiais da época.
Finalmente, ao abrigo dessa doutrina, o Papa podia confiar à oração pela paz não só a esperança de uma intervenção divina para pôr fim ao conflito, mas também a manutenção de um espaço interior para a consciência dos crentes no qual, apesar do seu envolvimento no conflito, mantinha-se viva a convicção de um nexo entre paz e Evangelho.
Não me detenho nesse aspecto que foi amplamente tratado nos estudos de Maria Paiano. Em vez disso, gostaria de observar que a nota de 1917 marca um afastamento da linha, inicialmente adotada pelo pontífice, de aplicar a teologia da guerra justa ao conflito. Afirmar, como consta na nota, que "a guerra parece cada dia mais um inútil massacre" significava, de fato, atingir um de seus pilares de sustentação.
Como mencionei, essa doutrina se baseava no pressuposto de que cabia às legítimas autoridades civis declarar guerra. Seu ato era moralmente lícito na medida em que os governantes se propunham a remediar uma injustiça nas relações internacionais.
Ora, a proclamação da inutilidade do conflito em curso fazia cair justamente esse pressuposto. De fato, se a guerra era inútil, os males causados pelo recurso à violência das armas já não pareciam mais justificados pela perspectiva de restabelecer uma ordem justa de vida coletiva. Caindo o princípio de que o mal da guerra era tornado lícito pelo bem que com ela se podia conseguir, as ordens das autoridades civis e militares deixavam de ser eticamente legítimas. Em linha de princípio, seguia-se uma consequência inevitável: os católicos, em consciência, não eram mais obrigados a obedecer a tais ordens.
Aqui pode-se perceber toda a importância da frase usada por Bento XV. Que o papa estivesse ciente da novidade de sua intervenção é demonstrado por um aspecto do processo de redação da nota. Parece que o pontífice pessoalmente tenha indicado que a expressão "massacre inútil" fosse inserida no texto. De fato, não consta da primeira minuta do documento que a Secretaria de Estado lhe havia apresentado.
Não me detenho nas fontes de onde Della Chiesa possa ter buscado a expressão, mas é preciso ressaltar a firmeza com que o papa rejeitou as sugestões de seus colaboradores que o aconselhavam a retirá-la da nota. A mudança no final obtida pela Secretaria de Estado - substituir a expressão inicial “agora já se demonstra um inútil massacre” pela frase “parece cada vez mais um inútil massacre” - atenua a sua incisividade, mas pouco tira à sua eficácia.
Podemos, portanto, nos perguntar quais fossem as intenções do pontífice ao querer utilizá-la com tanta determinação.
Não temos um documento pessoal de Della Chiesa que esclareça isso com absoluta certeza. No entanto, podemos chegar a uma hipótese bem fundamentada. Alguns círculos católicos minoritários leram a nota como uma legitimação da objeção de consciência às ordens da autoridade militar.
A difusão dessa interpretação foi, no entanto, desarticulada pela intervenção não só do poder político, mas também da autoridade eclesiástica. Em um artigo do Osservatore Romano - reproduzido significativamente pela La civiltà cattolica - afirmava-se que a Santa Sé "considerava essa leitura da nota particularmente deplorável". Como demonstração pública dessa orientação, Bento XV ordenou a supressão do jornal católico que a havia apoiada mais fortemente. O distanciamento do papa de tal interpretação é, portanto, inequívoco.
A maioria do mundo católico, em vez disso, proclamou que Della Chiesa havia se dirigido não aos povos, mas àqueles que os governavam. Exortando-os simplesmente a empreender o caminho da negociação, nada tinha mudado no que diz respeito aos deveres de obediência dos governados. Certamente pode-se dizer que esta última interpretação do documento pontifício correspondia plenamente às orientações da Secretaria de Estado. De fato, como vimos, Gasparri quis tornar pública a avaliação do caráter puramente político-diplomático da intervenção papal.
No entanto, uma leitura atenta do texto leva a crer que não coincidisse plenamente com as intenções de Bento XV. De fato, o trecho em que a frase se insere não se limita a recomendar o início de negociações, mas vincula inequivocamente a responsabilidade dos governantes de buscar o bem comum das populações a eles confiadas com a afirmação de que a guerra já parece agora como um inútil massacre. Desta forma, o papa colocava em jogo uma questão específica: a moralidade da ação dos governantes.
Sugeria que as autoridades civis não cumpriam seu dever primário de prover o bem dos governados se continuavam uma guerra que naquele momento não respondia ao propósito de restaurar a justiça nas relações entre os homens.
O recurso ao adjetivo "inútil" na qualificação da guerra - desejado pessoalmente pelo papa - tinha, portanto, profundas implicações: avançando a tese da impossibilidade de buscar a justiça nas relações internacionais por meio do uso de armas, advertia que não tinha mais qualquer razão de existir aquele princípio de presunção em favor da escolha bélica dos governos sobre o qual se sustentava a justificativa ético-religiosa da participação dos crentes na guerra.
Em suma, o texto deixava entrever que, por meio de uma aplicação rigorosa da doutrina da guerra justa, era possível retirar a justificação moral - até aquele momento garantida pela autoridade eclesiástica - do exercício da violência bélica pelos católicos envolvidos no conflito.
Não se pode considerar que essa implicação da nota comportasse um desmentido ou uma tomada de distância por parte do papa em relação às posições manifestadas pela Secretaria de Estado. De fato, a frase sobre o inútil massacre fazia parte de uma mensagem explicitamente dirigida apenas aos chefes das nações beligerantes, em grande parte dedicada a questões político-territoriais e transmitida de acordo com as regras consolidadas e formais da diplomacia internacional. Não é por acaso que a La civiltà cattolica insistiu durante muito tempo em sublinhar esses aspectos para uma correta compreensão das intenções do pontífice. A combinação dessas considerações leva, portanto, a uma conclusão obviamente hipotética, mas pelo que foi dito até aqui não desprovida de razões bem fundamentadas.
Bento XV objetivava inserir uma nuance na nota, na qual o aspecto político-diplomático da atitude da Igreja em relação à guerra - relativa à reafirmação do papel central da Santa Sé na política internacional - não fosse separado de uma consideração ética relativa à licitude da participação dos fiéis no conflito.
Por essa via o pontífice pretendia lembrar às autoridades civis que, caso não tivessem ouvido seus pedidos para depor as armas e iniciar negociações, ele ainda tinha à sua disposição um instrumento adicional para levar a cabo aquela missão de pacificação que considerava essencial ao seu papel como chefe do cristianismo.
De fato, ficava em suas mãos a possibilidade de dirigir-se diretamente a todos os católicos - e não mais apenas aos chefes de Estado, como fizera com aquele documento - para afirmar que o conflito em curso já não preenchia mais os critérios da guerra justa. A nota aludia assim a uma possível dissolução do vínculo de submissão às autoridades.
Vislumbrar a possibilidade de confiar à consciência dos fiéis a decisão de depor ou não as armas, parece em suma como o instrumento extremo de pressão sobre as chancelarias que Bento XV ventilava para pôr fim ao conflito.
Apesar da resposta negativa dos governos à nota, o papa não seguiu esse caminho. A provável razão possivelmente está na mudança na situação bélica. Com a vitória das potências da Entente que tomava forma no outono-inverno de 1917, não havia mais razão para seguir uma linha que havia nascido em uma situação em que o conflito parecia continuar insensatamente, sem outra perspectiva senão acumular mortes e desastres. A referência ao "massacre inútil" não teve, portanto, consequências imediatas. Mas aquela intervenção do papa não teria sido desprovida de repercussões, pelo contrário, teria afetado profundamente na história a atitude da Igreja em relação à violência bélica.
Diante do ressurgimento da moderna guerra total, e em particular diante da ameaça de catástrofe nuclear, o princípio claramente enunciado por Bento XV se tornaria de fato imediatamente aplicável.
A teologia da guerra justa baseia-se no critério da proporcionalidade: o bem a ser buscado deve ser maior que os males que um conflito gera. De acordo com essa doutrina, o recurso às armas atômicas, provocando o fim da civilização, não pode ter qualquer justificativa ética.
Nessa situação, a Igreja procedeu a uma limitação progressiva dos casos de moralização da violência bélica. Não por acaso, a famosa frase da Pacem in terris, que assinala uma virada na atitude católica em relação à guerra, começa lembrando que a nossa era “vi atomica gloriatur”.
Não é aqui o momento para reconstruir essa longa e atormentada história. Basta recordar que a solicitação do papa Francisco, ainda recentemente reiterada, em rever radicalmente a doutrina da guerra justa tem uma de suas raízes históricas naquela qualificação da guerra como “inútil massacre” que em agosto de 1917 Bento XV quis inserir em sua nota ao chefes das nações beligerantes.