10 Outubro 2022
Falamos sobre o tema com o vice-presidente e cofundador do Instituto de Pesquisa Internacional Archivo Disarmo.
A entrevista é de Pierluigi Mele, publicada por Rai News, 09-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Professor, a guerra na Ucrânia tem, entre seus múltiplos efeitos colaterais, também o de liberar um possível uso de armas nucleares táticas do lado russo. Do seu ponto de vista, considera possível essa enorme loucura?
Na guerra tudo pode acontecer, como nos ensina a Segunda Guerra Mundial com Hiroshima e Nagasaki. A Rússia está atualmente em dificuldades óbvias e a mobilização parcial é um dos muitos sinais disso. Considerando a tipologia do regime monocromático, tudo é de se esperar de um Putin que não consegue concluir sua "operação militar especial" na Ucrânia e vê seu poder vacilar dentro da Rússia. Recentemente, o presidente Biden também observou a periculosidade dessa ameaça.
Vamos citar alguns números: quantas armas nucleares táticas existem no mundo e quantas a Rússia tem?
No mundo existem cerca de 13.000 armas nucleares entre táticas e estratégicas, principalmente nos arsenais dos EUA (5.428) e russo (5.977), enquanto o restante está presente naqueles da China (350), Grã-Bretanha (225), França (290), Índia (160), Paquistão (165), Israel (90) e Coreia do Norte (20). A Rússia tem 1.912 ogivas táticas ou de teatro, não instaladas e presentes nos depósitos. Do lado estadunidense, são cerca de 200, das quais metade em depósitos no exterior, enquanto outras 100 estão em bases europeias (Itália, Bélgica, Holanda, Alemanha e Turquia). A diferença numérica das ogivas táticas deve-se às escolhas ligadas às diferentes posições geopolíticas das duas superpotências, uma – a Rússia – localizada em território europeu, a outra – Estados Unidos – localizada além oceano, embora presentes na Europa em numerosas bases.
O que significa: "A Rússia torna possível usar armas nucleares de acordo com sua doutrina". O que é essa doutrina?
Segundo a doutrina militar russa, a arma nuclear deveria servir para defender a segurança do país em casos extremos, mas, segundo alguns, seria destinada a um possível uso de seu arsenal com o objetivo de "escalate to de-escalate", ou seja, ameaçar seu uso para bloquear os EUA e a OTAN para obter condições favoráveis ao Kremlin no contexto de um conflito (neste caso na Ucrânia).
Pessoalmente não estou convencido e jogar com armas nucleares parece-me muito arriscado. Desde a época da Guerra Fria existe a chamada cláusula do no first-use, que é o compromisso de não usar a arma nuclear primeiro, mas é apenas um compromisso que pode ser revogado a qualquer momento. A última Revisão da Postura Nuclear 2022 estadunidense, por exemplo, ao contrário do passado, foi considerada de acesso restrito e não é pública. Em suma, os donos dessas armas podem usá-las quando quiserem.
O secretário-geral da OTAN disse que a resposta da aliança será devastadora para a Rússia (usando armas convencionais, assim dizem eles). O que isto significa?
Dada a superioridade militar da OTAN em âmbito convencional e a presença da Aliança sobre um vasto território ao redor da Rússia, Stoltenberg respondeu às ameaças de Putin com outras tantas ameaças de destruição, evitando, porém, falar em guerra nuclear, que naquele momento seria global e autodestrutiva para todos os contendores. No entanto, no conflito em curso, as ameaças e as respostas duras fazem parte, por assim dizer, do dramático "jogo das partes". Seria importante que paralelamente houvesse conversas para buscar uma saída para uma situação que parece estar cada vez mais se apertando sobre si mesma.
Quais são as diferenças entre armas nucleares táticas e estratégicas? O que faz a diferença?
As armas nucleares táticas ou de teatro são de potência limitada (máximo de 50 kt), montadas em vetores com alcance limitado (poucos quilômetros) e com precipitação radioativa também reduzida. Como é compreensível, no entanto, esses dispositivos táticos ainda poderiam ser transportados por mísseis ou por aeronaves com amplo alcance de ação, chegando mesmo a alvos mais distantes. Eles deveriam, teoricamente, servir de apoio no âmbito de uma guerra convencional para atacar no campo de batalha áreas restritas e causar danos e efeitos limitados. Aquelas estratégicas são mais poderosas, capazes de atacar de um continente a outro e com um poder decididamente superior e, portanto, devastador.
Quanto pesa a capacidade explosiva na diferença entre táticas e estratégicas?
Como já citado, a diferença consiste também na potência explosiva. No entanto, deve-se lembrar que as bombas lançadas sobre as duas cidades japonesas (entre 15 e 20 kt) poderiam se enquadrar na categoria de armas táticas ou de teatro. No entanto, ao longo dos anos, armas de potência muito menor (menos de 1 kt) foram feitas para poder usá-las com mais facilidade. Basta pensar nas B-61 estadunidenses também presentes na Itália nas bases de Ghedi (BS) e Aviano (PN).
Quais são os vetores mais perigosos nessas armas?
Dado que esses dispositivos estão disponíveis para forças terrestres, aéreas e navais, na minha opinião, sua possível transferência para submarinos (mais difícil de detectar) representa a ameaça maior, pois eles podem se aproximar de seu alvo sem serem detectados. Não é por acaso que a Grã-Bretanha, por exemplo, tem seu arsenal nuclear todo posicionado em submarinos. De qualquer forma, os novos mísseis hipersônicos, bastante difíceis de interceptar devido ao seu baixo voo e velocidade, representam outra ameaça a ser cuidadosamente considerada. Existem também sistemas antimísseis, mas se, por exemplo, um ataque de centenas de mísseis fosse 90% frustrado (um sucesso, estatisticamente falando), 10% seriam suficientes para uma destruição generalizada.
Qual é o cenário apocalíptico para a Europa e o planeta (pessoas, clima)?
Segundo uma estimativa da Universidade de Princeton, uma guerra nuclear global em poucas horas levaria a 90 milhões de mortes, imaginando um ataque a algumas dezenas de cidades após a escalada a partir de uma guerra convencional. Em breve publicaremos em nossa revista IRIAD Review um resumo dessa simulação criada com um programa especial, que depois quisemos também usar para verificar suas consequências em algumas cidades italianas. O quadro é certamente apocalíptico, já que os resultados se limitam a nos fornecer os números de mortos e feridos, mas também deveriam ser contabilizados os efeitos póstumos sobre o homem e o meio ambiente, bem como os danos econômicos e estruturais.
Os efeitos de Chernobyl e Fukushima são uma prova de quais poderiam ser as consequências. A precipitação radioativa entraria na atmosfera com repercussões em territórios também muito distantes do teatro do hipotético conflito. A esse respeito, deve-se lembrar o documento da Cruz Vermelha Internacional e do Crescente Vermelho Internacional de alguns anos atrás, que afirmava claramente que uma guerra nuclear não pode ser vencida por ninguém, pois os danos humanitários seriam insuportáveis.
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Os efeitos devastadores das armas nucleares “táticas”. Entrevista com Maurizio Simoncelli - Instituto Humanitas Unisinos - IHU