13 Setembro 2022
"Se a tarefa mais alta da Escola não é transmitir noções, mas formar uma cultura democrática, é preciso lembrar que a democracia não é o achatamento das diferenças, não é o cancelamento do esforço da prova, não é a supressão de mérito", escreve o psicanalista italiano Massimo Recalcati, em artigo publicado por La Stampa, 12-09-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Segundo ele, "e para nossos filhos a maior tentação pode ser considerar a Escola uma perda de tempo ou um esforço inútil, se sua preocupação pode ser a de não ver seu futuro aos olhos da Escola porque esse futuro parece incerto, cheio de armadilhas, desprovido de perspectivas, etc., a maior tentação dos professores é se deixar consumir pelo próprio trabalho, perder o entusiasmo, perder a vocação".
Após dois anos de profunda alteração de suas práticas e hábitos devido à emergência sanitária, a Escola italiana reabre sem máscaras, sem distanciamento, sem mais a angústia da infecção. Durante a campanha eleitoral, vários partidos justamente prometeram um aumento dos salários dos professores (entre os mais mal pagos da União Europeia) e um retorno generalizado ao tempo integral para favorecer as classes trabalhadoras e as camadas sociais mais desfavorecidas.
A remuneração dos professores não é apenas um fator imprescindível de equidade econômica, mas também a justa e devida valorização social de seu papel.
Em uma sociedade deslumbrada pelo mito do sucesso fácil, da autoafirmação que prescinde os outros, do desconhecimento da importância do conhecimento, da malévola arte do atalho diante da necessidade de longos caminhos, a Escola lembra obstinadamente o esforço e a alegria da prova como essenciais em todo processo de formação. Em seu trabalho cotidiano os professores são chamados a fazer com que ainda exista um discurso educativo que nosso tempo tende a tornar cada vez mais supérfluo, esmagando-o sob o domínio do culto ao dinheiro e à celebração da própria imagem.
O esforço e a alegria da Escola, por outro lado, são os fundamentos primeiros de qualquer processo de formação. O esforço é aquele que nossos filhos têm que experimentar: nem tudo é possível, a existência dos outros (professores e colegas) é constitutiva e não pode ser suprimida, mas é fonte de ampliação do horizonte do mundo, a linguagem única da família não é a única linguagem possível, mas existem muitas outras linguagens. A alegria é a de poder superar individualmente as provas, adquirir novos conhecimentos, contribuir para construir uma comunidade com os próprios pares, experimentar encontros surpreendentes de amor e de conhecimento.
Sabemos como a comunidade escolar também possa nos expor à frustração e ao desconforto, mas é isso que atesta a dimensão necessariamente coletiva da vida humana. Essa dimensão não é de fato uma abstração ou apenas um lugar de alienação, mas também pode ser uma existência concreta feita de encontros que mudam a vida. Este é o coração secreto da Escola, aquele que não pode constar nos calendários, nos programas, nos conselhos de classe ou nos procedimentos de avaliação e nos seus números.
Se para nossos filhos a maior tentação pode ser considerar a Escola uma perda de tempo ou um esforço inútil, se sua preocupação pode ser a de não ver seu futuro aos olhos da Escola porque esse futuro parece incerto, cheio de armadilhas, desprovido de perspectivas, etc., a maior tentação dos professores é se deixar consumir pelo próprio trabalho, perder o entusiasmo, perder a vocação. Às vezes acontece até com os melhores. Se o trabalho na escola se torna uma mera alternativa, uma frustração de ambições diferentes, ou, mais simplesmente, se um professor não encontra mais sentido no que faz, corre o risco de se perder o motor do desejo que é a base da formação. Cada avaliação meritocrática sobre o corpo docente deveria, em primeiro lugar, partir deste dado: existe no professor um forte desejo de desempenhar seu papel? Se, por exemplo, um professor limita-se a afundar sua turma em insuficiências, não deveria, em vez de reclamar de seus alunos, perguntar a si mesmo qual é sua responsabilidade em causar tal desastre didático?
Normalmente, nesses casos, o desejo de ocupar aquela posição desejante deu lugar a outras atitudes. É por isso que o tema da meritocracia deve encontrar um lugar na escola do amanhã. Certamente há um sério problema de como se deveria avaliar o mérito de um professor, sobre quais princípios, por meio de quais dispositivos etc., mas o tema em si permanece incontornável. Caso contrário, a luta contra a meritocracia afunda a escola para baixo, para a estagnação, para a imobilidade, para a rotina sem paixão, a rotina sem desejo. A grande maioria dos professores italianos desempenha seu papel com muita responsabilidade e paixão, mas sabemos os danos de quem parasita impunemente a Escola.
Se a tarefa mais alta da Escola não é transmitir noções, mas formar uma cultura democrática, é preciso lembrar que a democracia não é o achatamento das diferenças, não é o cancelamento do esforço da prova, não é a supressão de mérito. Pelo contrário. Há filhos que estão sendo estacionados em nossas escolas e que não têm nenhuma intenção de se dedicar seriamente ao estudo, assim como há professores que se encontram ensinando sem ter nenhum desejo autêntico.
A intersecção dessas duas tendências gera uma mistura fatalmente destrutiva. Trata-se de contrastar ativamente essa dupla inclinação. Encontrar os instrumentos mais adequados sem ignorar o problema e sem se entrincheirar em defesas corporativas. A meritocracia não é uma panaceia, mas um instrumento que visa preservar a possibilidade e o rigor simbólico da prova sem a qual não há nenhuma formação possível. Nem para os alunos, nem para seus professores.
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O mérito e o desejo sobem à cátedra juntamente com os professores - Instituto Humanitas Unisinos - IHU