30 Junho 2022
"Se a credibilidade da Igreja alemã como instituição, agora residual apesar de todos os esforços empreendidos, está certamente em questão, pode ser que existam outros fatores, não menos relevantes, que levam os cidadãos alemães a deixarem de contribuir para a vida da Igreja local através do sistema tributário", escreve o teólogo e padre italiano Marcello Neri, professor da Universidade de Flensburg, na Alemanha, em artigo publicado em Settimana News, 29-06-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Pode ser útil para uma Igreja ter um sistema parcial para medir o número de membros. Na Alemanha, o chamado “Kirchensteuer” [imposto revertido para a igreja] representa um desses elementos estatísticos. A tendência de "sair da Igreja", não só católica, mas também evangélica, é um fenômeno que vem acontecendo há décadas - não surpreende, portanto, que tenha sido confirmado para ambas as Igrejas novamente este ano (que fotografa a situação de 2020).
Para a Igreja Católica, a taxa de aumento em relação ao ano anterior é significativa e preocupante: de 221.390 no ano fiscal de 2020 para 359.338 pessoas em 2021 – portanto, 50% mais cidadãos deixaram o sistema público de subsídios para a Igreja alemã.
Comentando esse índice, o presidente da Conferência Episcopal Alemã, D. Bätzing disse que esses dados “mostram a profunda crise em que nos encontramos como Igreja Católica na Alemanha. Ao lado desses números devemos acrescentar o fato que eles incluem não só pessoas que, de uma forma ou de outra, há muito tempo só têm um contato mínimo ou mesmo nenhum com as paróquias, mas também pessoas que até agora estavam muito engajadas nelas".
Essa simples observação já torna mais complexa a leitura de um dado estatístico e de sua evidência. Nesse ponto, há a necessidade de uma leitura cruzada dos dados disponíveis - levando em consideração idade, renda, situação social, localização geográfica etc. Um trabalho, este, que permitiria montar um perfil dos números que estão disponíveis.
Se a credibilidade da Igreja alemã como instituição, agora residual apesar de todos os esforços empreendidos, está certamente em questão, pode ser que existam outros fatores, não menos relevantes, que levam os cidadãos alemães a deixarem de contribuir para a vida da Igreja local através do sistema tributário.
Por exemplo, além do fim de um sentido de pertencimento eclesial como uma das formas usuais de socialização, quanto pesa nesses dados a crescente preocupação com o futuro por parte das gerações mais jovens? As incertezas em cadeia, que a sociedade europeia já não conhecia mais desde o fim da Segunda Guerra Mundial, causadas pela pandemia (e para os próximos anos fiscais após a guerra na Ucrânia)?
Provavelmente está desaparecendo também aquela cultura constitucional generalizada que, após a queda do regime nazista, levou a Alemanha que tentava sair dos escombros da guerra a reconhecer o significado sócio-civil das duas grandes igrejas cristãs do país - na convicção de que sem elas não só não fosse possível criar uma nova e diferente consciência civil de cidadania, mas também o campo social teria ficado desprotegido, nas classes mais pobres, nos marginalizados, na educação, na formação dos jovens, mais necessitado de políticas atentas e direcionadas.
Estamos diante de duas grandes questões: a profunda transformação do catolicismo alemão, que coincide com o fechamento definitivo da conjuntura geopolítica do pós-guerra (que não terminou com a reunificação sob Kohl, mas com o rearmamento da Alemanha pelas mãos do Social Democrata Scholz); uma perigosa indiferença da opinião pública alemã (e também do atual governo) diante dos dados estatísticos relativos às duas Igrejas - como se fosse apenas uma sua questão interna.
Quando, ao contrário, não o é, sendo elas parte do eixo central do quadro constitucional que a Alemanha adotou para ser outra do que havia sido no período nazista e durante a Segunda Guerra Mundial. Quando blocos da arquitetura constitucional de um país desmoronam, a sociedade como um todo é afetada. Mas poucos parecem perceber.
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Alemanha-Igreja: a conta dos números. Artigo de Marcello Neri - Instituto Humanitas Unisinos - IHU