08 Setembro 2021
A chuva torrencial de 27 de março de 2020, quando o Papa Francisco se recolheu em oração na Praça São Pedro deserta, permanece uma imagem indelével na memória coletiva, um símbolo da tempestade que abalou o mundo com a pandemia e que agora parece ter diminuído em parte, dando lugar a uma sensação de renascimento e reinício.
A reportagem é de Ida Bozzi, publicada por Corriere della Sera, 07-09-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
O próprio Bergoglio explica isso - “É hora de voltar a ter esperança”, escreve ele - na mensagem introdutória que aparece em seu novo livro, Oltre la tempesta. Riflessioni per un nuovo tempo dopo la pandemia (em tradução livre, Além da Tempestade. Reflexões para um novo tempo após a pandemia), a partir de hoje na livraria pela editora Bur: o volume, editado pelo vaticanista Fabio Marchese Ragona, contém, além da mensagem introdutória do Papa e da nota do editor, toda a entrevista do jornalista com Bergoglio (transmitida pela TV em janeiro de 2021). Um diálogo em que o Pontífice identifica seis palavras-chave para o presente e sobretudo para o futuro: crianças, guerra, paz, pandemia, unidade, proximidade. A respeito dessas palavras, que descortinam mundos inteiros, na segunda parte do ensaio há reflexões com textos inéditos David Sassoli, Presidente do Parlamento Europeu (sobre a palavra unidade), Filippo Grandi, Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (proximidade), o diretor vencedor do Oscar Giuseppe Tornatore (pandemia), a escritora Edith Bruck, sobrevivente do Holocausto (guerra), Andrea Riccardi, fundador da Comunidade de Santo Egídio (paz) e a cantora israelense Noa (crianças).
Nesta página, antecipamos integralmente a mensagem introdutória do Papa Francisco contida no volume, e uma passagem da intervenção do Alto Comissário da ONU, Filippo Grandi, sobre o tema da proximidade. Não são apenas palavras, explica o Papa Francisco na entrevista, "são problemas graves" para enfrentarmos juntos, sem ceder à indiferença ou aos clichês: "Dizem, uma ‘saudável’ indiferença", explica o Papa Francisco. Mas, conclui: “A indiferença não é 'saudável'”.
Inúmeros são os temas abordados pelo Pontífice na entrevista: a esperança na ciência, a ética na escolha da vacina (“É uma opção ética porque você aposta na saúde, aposta a própria vida, mas também a dos outros. Deve ser feita”), a crítica à civilização do "descarte" que deixa de lado os frágeis, os idosos, os migrantes e o voto de que a "cultura da indiferença" seja substituída pela "cultura da fraternidade, da proximidade", pela unidade do "Nós” e não do "Eu". “O Eu será cuidado mais tarde. A unidade é maior do que o conflito”.
A pandemia está gerando uma mudança de época, estamos passando pelo momento mais difícil de nossas vidas, mas ao mesmo tempo procuramos ir "além da tempestade" porque é hora de voltar a ter esperança, é o momento em que, se quisermos, podemos encontrar a paz depois das trevas da doença. A tempestade expôs nossas vulnerabilidades e daqui podemos nos regenerar tomando o exemplo de grandes homens de esperança, como Abraão, que em um momento de desconfiança, ao invés de pedir pelo filho prometido que não chegava, se dirigiu para Deus para que o ajudasse a continuar a ter esperança. Não há nada mais lindo: a oração para ter esperança, porque a esperança nunca desilude, nunca. Se você tem esperança, nunca ficará desapontado.
Também gosto de citar aqui João Paulo I que, no curso de uma audiência geral (20 de setembro de 1978) disse que a esperança "é uma virtude obrigatória para todo cristão", que nasce da confiança em três verdades: "Deus é onipotente, Deus me ama imensamente, Deus é fiel às promessas. E é Ele. O Deus da misericórdia, que desperta a confiança em mim; por isso não me sinto só, nem inútil, nem abandonado”.
Devemos reencontrar a esperança e confiar hoje também na ciência: graças à vacina, estamos aos poucos voltando para ver a luz novamente, estamos saindo deste pesadelo horrível. Também eu posso dizer que no Vaticano reabrimos as audiências gerais com a presença dos fiéis e este é um verdadeiro dom, poder encontrar-nos "cara a cara", juntos como irmãos e irmãs. Porque se por um lado é verdade que a tecnologia nos ajudou muito durante o lockdown, por outro é importante reiterar o quão fundamental é o encontro não virtual. E devemos agradecer a todos aqueles que se empenharam muito para nos fazer superar o momento mais difícil: estou me referindo aos cientistas que estudaram durante muitos meses a combinação certa para ter vacinas eficazes, mas acima de tudo àqueles que estiveram ao nosso lado na fase mais crítica, médicos, enfermeiros, voluntários e muitas outras figuras que ficam na sombra e não acabam na TV ou nas capas dos jornais. O verdadeiro desafio agora é se empenhar para garantir que todas as pessoas do mundo tenham o mesmo acesso à vacina, que não haja "caprichos" na escolha da dose mais famosa e, acima de tudo, que seja gratuita para quem precisa e não algo graças ao qual tirar um ganho fácil. A vacina pode salvar muitas vidas humanas, não vamos esquecer isso e não vamos esquecer o que a história nos ensinou com outras doenças feias do passado.
É hora de arregaçar as mangas e recomeçar, de mãos dadas, olhando na cara o nosso próximo e dizendo: "Vamos ficar juntos, é assim vamos conseguir". O barco não afundará se todos estiverem empenhados em remar e mantê-lo flutuando. Peçamos ao Senhor a graça da esperança e o louvemos sempre, mesmo neste momento de pandemia, porque sabemos que Ele é o amigo fiel que nunca nos abandona e que nos ama sem medidas.
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Francisco: o futuro em seis palavras - Instituto Humanitas Unisinos - IHU