05 Agosto 2021
As conclusões do G7, cuja reunião aconteceu entre os dias 11 e 13 de junho na Cornualha, Inglaterra, lançaram uma luz dura sobre a realidade das relações de força na saúde pública global. Se as promessas das sete maiores potências mundiais sobre a imunização nos países pobres foram recheadas de boas intenções, não serão suficientes para dobrar as empresas farmacêuticas. Esta batalha política lança luz sobre a nova face da globalização, e podemos tirar pelo menos três lições.
A reportagem é de Cécile Duflot, publicada por Alternatives Économiques, 04-08-2021. Duflot é diretora administrativa da Oxfam França e ex-ministra da Habitação. A tradução é de André Langer.
Primeira lição: para um problema global existem apenas soluções globais. Todos os especialistas concordam com a necessidade essencial de uma campanha global de vacinação. O planeta agora está em uma corrida contra o tempo com as variantes. Quanto mais cedo vacinarmos toda a humanidade, menor será o risco de cada um de nós sofrer uma nova onda da pandemia potencialmente mais contagiosa, inclusive mais mortal.
Vacinar apenas no Ocidente é, na melhor das hipóteses, dar a si mesmo alguns meses de carência e se expor, a médio prazo, a riscos ainda maiores. Portanto, não há nenhuma generosidade nas promessas de doação de vacinas, apenas um indispensável realismo. No entanto, assim como diante da mudança climática, estamos desamparados. Não existe nenhum órgão regulador da globalização à altura da situação. A Organização Mundial da Saúde (OMS) está paralisada, atolada em seus problemas diplomáticos. E mesmo que Joe Biden ressuscite o multilateralismo, as ferramentas para regular a globalização parecem anãs em face do poder dos laboratórios.
Segunda lição: a economia rentista é um freio à inovação. Embora muitos tenham comentado sobre o fracasso francês da Sanofi e o sucesso da Pfizer, eles são o espelho reverso das estratégias corporativas baseadas na assunção de riscos versus lucro garantido. A Sanofi possui muitas patentes que lhe garantem um retorno financeiro confortável. A empresa francesa não queria investir no desenvolvimento de novas vacinas e embarcar em experimentos com a técnica de RNA mensageiro. Por outro lado, outras empresas mais ousadas assumiram riscos maiores.
Não existe uma relação automática entre a rentabilidade de uma patente e o investimento em pesquisa e desenvolvimento e inovação. Pelo contrário, os lucros certos e a renda garantida podem desencorajar as empresas a inovar. Em suma, se nos contentarmos em confiar no mercado, certamente fracassaremos.
Terceira lição: os interesses das finanças não são os da saúde. Porque só os laboratórios farmacêuticos que vendem vacinas – as famosas Big Pharma – têm as chaves para organizar esta campanha de vacinação. Existem parques produtivos subutilizados; o think tank científico americano Knowledge Ecology International identificou mais de 150 locais de produção que poderiam ser mobilizados, mas até agora nenhum acordo de licença global foi assinado. Por quê? Porque eles não têm objetivamente nenhum interesse nisso.
A lógica financeira é vender cada dose da vacina pelo melhor preço. Isso, obviamente, se opõe a uma possível requisição ou a uma negociação tarifária favorável aos países do Sul, já sobrecarregados pelos juros da dívida.
Portanto, cinicamente, as empresas farmacêuticas não têm interesse em vencer a corrida contra as variantes, já que as variantes do vírus são motivações para vacinações adicionais, ou mesmo para produzir novas versões da vacina. Onde a vacinação pode ser a arma letal para erradicar a pandemia, essas empresas têm interesse em se adaptar à sua evolução e exclusivamente à distribuição para clientes bons pagadores.
Obviamente, não se trata aqui de apontar o dedo para o cinismo de alguns responsáveis, mas constatar seriamente que a lógica do mercado é incompatível com uma verdadeira política sanitária.
Essas três lições econômicas levam inevitavelmente a um dilema moral. Há um debate político sobre as vacinas, mas contrariamente ao que algumas partes da opinião pública francesa veiculam, não se situa no nível individual entre defensores ou oponentes da vacinação. Diante de um vírus, a única terapia eficaz é a vacinação coletiva. Isso, portanto, requer uma decisão política, como todas as arbitragens de saúde pública.
Mas, diante de uma pandemia, uma política nacional de saúde está condenada ao fracasso. Somente a coragem política de uma solução universal e incondicional superará tal epidemia. Mas, para conseguir isso, precisaremos de muito mais do que governança multilateral imperfeita e de cúpulas internacionais cheias de falsas promessas frente a um mercado desconectado das necessidades da saúde.
Enquanto o mundo estava às voltas com uma guerra que se tornaria global, a Carta do Atlântico [assinada em 14 de agosto de 1941], ao traçar um futuro onde a paz era a chave, foi capaz de sentar as bases ao que se tornará, com suas limitações, uma instituição: a Organização Mundial do Comércio (OMC) onde, curiosamente, se decide o acordo sobre a suspensão de patentes. Hoje, precisamos de uma instituição reguladora ainda mais indispensável, porque é a única maneira de acabar com a pandemia, de nos proteger contra vírus futuros e de recuperar nosso modo de vida.
Essa consciência de que devemos agir como terráqueos sujeitos a uma ameaça global também poderia ser a alavanca que nos permitiria enfrentar as mudanças climáticas. A solução é política.
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As Big Pharma têm interesse em ganhar a corrida contra as variantes? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU