29 Junho 2021
Os jovens encontram hipocrisia na Igreja todos os dias no #TwitterCatólico. Um tuíte, uma postagem, um artigo ou um e-mail pode fazer a diferença ao levar alguém a Cristo ou a rejeitá-lo para sempre. É fácil disparar uma réplica espirituosa e tentar ganhar a discussão com alguém. É muito mais difícil ir ao encontro deles autenticamente. Só um desses caminhos consegue evangelizar.
A opinião é de John T. Grosso, diretor de mídia digital da Diocese de Bridgeport, em Connecticut, nos EUA. O artigo foi publicado por America, 25-06-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Na sexta-feira, 18 de junho, quando os bispos dos EUA votaram esmagadoramente a favor da redação de um documento sobre a “coerência eucarística”, eu estava concluindo quase três semanas de viagens relacionadas com a Igreja.
Eu havia passado duas semanas em Roma, trabalhando com 15 outros “jovens prodígio” no Dicastério para a Comunicação do Vaticano. Estávamos tentando lidar com as difíceis questões de comunicação que a Igreja global enfrenta: como usamos as mídias sociais para comunicar o Evangelho? Como podemos evangelizar nessas plataformas? Como podemos ser embaixadores digitais de Cristo?
Depois de Roma, estive no Instituto McGrath para a Vida da Igreja para a conferência principal do programa inaugural “Ecologia das comunicações da Igreja”, onde lidamos com as mesmas questões. Lá no campus da Universidade de Notre Dame, enquanto nosso grupo compartilhava ideias novas e inovadoras sobre como a Igreja pode utilizar as mídias digitais para trazer pessoas para a Igreja, vimos como a assembleia geral da USCCB [Conferência dos Bispos dos EUA] se desenrolava.
Enquanto eu participava de sessão após sessão da minha própria conferência, percebi que quase todas as nossas conversas começavam com alguma variação da pergunta: como podemos usar as mídias digitais para ir ao encontro dos jovens? Enquanto pensávamos sobre o futuro da Igreja, não pude deixar de olhar para a situação nas redes sociais católicas naquele exato momento.
Enquanto nossos bispos se alinhavam, um após o outro, para falar durante seu encontro online, católicos de todas as convicções políticas e teológicas comentavam no Twitter em tempo real. Alguns estavam torcendo pelos bispos, ou pelo menos pelos seus favoritos, um tuíte por vez, lançando insultos e acusações contra seus companheiros católicos com o mesmo entusiasmo.
Não pude deixar de me sentir desanimado. A exibição, tanto de bispos citando nomes de políticos e de partidos políticos, quanto de leigos, religiosos e clérigos lançando ataques ad hominem uns contra os outros online, fomentava mais a desunião e a divisão na Igreja do que qualquer coisa que eu tenha visto online durante meu tempo nesse ministério.
Enquanto eu observava essa cena se desenrolar, meu telefone foi inundado com mensagens de texto de meus amigos (a maioria dos quais se autoidentificaria como ex-católicos), perguntando o que estava acontecendo. Ao participar de uma conferência sobre como criar um bom ambiente de comunicação na Igreja, eu cheguei a uma conclusão.
Por pelo menos seis anos nos quais eu atuei na pastoral da comunicação, a Igreja tem perguntado repetidamente como ir ao encontro dos jovens nas mídias digitais. Realizamos webinars, fóruns, convenções e convocações. Perguntamos nas redes sociais e criamos campanhas e programas. Mas eu pensava nos meus amigos e sei que as mídias digitais não atrairão pessoas para uma Igreja que não seja atraente em si mesma. Os jovens estão indo embora porque estão fartos da hipocrisia que veem na Igreja.
Para que fique claro: eu não desejo jogar a culpa sobre os bispos. Eles têm trabalhos difíceis e enfrentaram muitos desafios nos últimos anos. Eu realmente acredito que a maioria deles está fazendo o melhor que pode em um mundo em constante mudança e rezo por eles diariamente. Trabalhei com vários deles e posso atestar que muitos deles estão genuinamente preocupados com os jovens.
Mas a forma como a reunião se desenrolou – em que o formato online deixava pouco espaço para o diálogo e o debate de verdade e em que a transmissão ao vivo, cena após cena, evocava mais um evento esportivo do que uma reunião de lideranças da nossa Igreja – era uma demonstração que não se alinhava com as preocupações da maioria dos jovens dos quais a Igreja está tentando ir ao encontro.
Sempre me ensinaram que a Eucaristia era alimento para os feridos, e não uma recompensa para os melhores católicos. Um querido mentor meu me dizia várias vezes que a Eucaristia é uma pessoa, e não um prêmio. Mas eu também posso entender que, diante da confusão ou falta de conhecimento sobre a presença real de Jesus no Santíssimo Sacramento, é necessário que os nossos bispos se empenhem em uma de suas funções mais sagradas: ou seja, ensinar. Acredito que muitos receberiam um documento pastoral sobre a Eucaristia, e não um documento político.
A USCCB esclareceu recentemente que esse documento sob avaliação seria de fato pastoral. No entanto, as declarações de alguns bispos e de outras lideranças da Igreja, assim como de muitas pessoas nas redes sociais, parecem turvar a situação.
Nenhum dos partidos políticos dos EUA defende a plenitude do ensino católico, mas estamos lidando com um ponto de vista desafiador quando muitas lideranças da Igreja dos EUA não têm sido tão francas ou pró-ativas diante do racismo, sexismo, xenofobia, crise dos migrantes e refugiados, crianças em jaulas, violência armada e degradação ambiental. No entanto, essas mesmas lideranças correram com muito mais vigor para abordar os pontos de vista do atual governo sobre o aborto.
Esse hiperfoco em um único político deixa muitos jovens católicos se perguntando onde está esse foco e paixão pelo ensino da Igreja ao trabalhar com figuras políticas que apoiam a pena de morte ou a eutanásia. Isso também deixa muitos se perguntando se as lideranças, ou quaisquer membros da Igreja, são incapazes de ver as nossas próprias falhas.
A Igreja dos EUA foi devastada pela pandemia da Covid-19, e muitos dos nossos fiéis foram – ou continuam sendo – separados da Eucaristia devido a questões de saúde e segurança. A pandemia veio na esteira do relatório do Grande Júri da Pensilvânia sobre a crise dos abusos sexuais em curso na Igreja e em meio a uma proliferação de venenos dirigidos contra o Papa Francisco e a Igreja institucional por muitos de seus membros.
Com a Igreja dos EUA já cambaleando, parece que os bispos decidiram abordar a dignidade do presidente Biden para receber a Comunhão, enquanto negligenciam as tensões e as crises latentes entre os fiéis.
Uma pessoa que eu conheço foi ainda mais direta: “A Igreja está pegando fogo agora, e os bispos decidiram que negar a Comunhão ao presidente Biden era o mais importante?”.
Tudo isso aconteceu em público, no #TwitterCatólico e em grupos católicos do Facebook, para todo o mundo ver. Em uma época em que a confiança e a fé de muitas pessoas na Igreja estão por um fio, elas se voltaram para os nossos meios de comunicação e viram os bispos discutindo publicamente entre si, e seus companheiros fiéis insultando, brigando, ameaçando – até mesmo pessoas chamando outras de “hereges”.
Por que alguém iria querer se filiar a um grupo como esse? Como alguém poderia levar a sério o chamado a amar uns aos outros, a amar os nossos inimigos, quando esse é o exemplo que oferecemos?
Nós, simples católicos, também compartilhamos essa culpa. No meu feed do Twitter, católicos têm questionado a minha fé e têm me dito que eu sou mais fiel à política do que a Jesus. Ainda na semana passada, minha esposa e eu fomos ridicularizados por outro companheiro católico em uma crítica velada da nossa falta de filhos. Se uma pessoa que está questionando a própria fé católica ou considerando o fato de entrar na Igreja encontra um comentário zombando de alguém dessa mesma Igreja por não ter filhos, por que essa pessoa iria querer se filiar a uma organização como essa?
Os jovens encontram hipocrisia na Igreja todos os dias no #TwitterCatólico. Um tuíte, uma postagem, um artigo ou um e-mail pode fazer a diferença ao levar alguém a Cristo ou a rejeitá-lo para sempre. É fácil disparar uma réplica espirituosa e tentar ganhar a discussão com alguém. É muito mais difícil ir ao encontro deles autenticamente. Só um desses caminhos consegue evangelizar.
A desunião da nossa Igreja não é culpa unicamente dos nossos bispos, e seria injusto jogar toda a culpa sobre eles. Há muita culpa circulando por aí. Aquelas pessoas nas redes sociais que se identificam primeiro com um partido político ou como um “católico liberal” ou “rad trad” são tão culpados pelo nosso estado atual quanto qualquer um. Eu continuamente busco discernir como as minhas próprias ações podem estar contribuindo para essa situação.
Se você não acredita em mim, pergunte a São Paulo. Nosso dilema atual não é tão singular quanto podemos pensar:
“Eu lhes peço, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo mantenham-se de acordo uns com os outros, para que não haja divisões. Sejam estreitamente unidos no mesmo espírito e no mesmo modo de pensar” (1Coríntios 1,10).
A boa notícia dessa Escritura é que todos podemos compartilhar a solução. Temos que começar pela unidade e nos alicerçar no Evangelho de Jesus Cristo. Só então seremos confiáveis aos olhos dos jovens e dos mais velhos. Só então eles levarão a sério a nossa mensagem de amor de Cristo, de solidariedade com os pobres e de fraternidade universal como parte de uma mesma família humana – em qualquer plataforma que a compartilhemos.
Temos que ser um modelo para o mundo. Só então poderemos fazer discípulos entre todas as nações.
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Documento politizado sobre a Eucaristia afastará ainda mais os jovens da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU