10 Junho 2021
"A discussão sobre a 'coerência eucarística' parece exatamente uma discussão sobre Biden, muito semelhante à que se pretendia fazer, e não foi feita, sobre o candidato presidencial de John Kerry, também pró-escolha. Em um país onde houve assaltos ao Congresso, separação dos filhos de pais em relação aos migrantes, a questão das armas, violência étnica ou racial e muito mais, essa preeminência é considerada por aqueles que não a compartilham como uma escolha política", escreve Riccardo Cristiano, jornalista, em artigo publicado por Formiche, 09-06-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Enquanto o presidente dos EUA se preparava para chegar à Europa, em uma carta publicada em um site estadunidense, 47 bispos pediam que não se falasse de "coerência eucarística" no encontro online dos bispos estadunidenses. Por quê? O ponto crucial seria a preeminência da questão do aborto e, portanto, de políticos que, se favoráveis, não estariam em condições de participar da Eucaristia, incluindo Joe Biden.
De acordo com o site pillarcatholic.com 47 bispos, dos quais 6 arcebispos e 5 (dos 6) cardeais dos EUA, mais 21 bispos auxiliares, teriam assinado uma carta pedindo oficialmente ao presidente da Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos para não prosseguir com a discussão sobre "coerência eucarística" durante o próximo encontro online dos bispos estadunidenses agendada para 16 a 18 de junho e para adiá-la para quando voltaremos a nos reunir "pessoalmente".
Fazer uma discussão desse tipo online parece objetivamente problemático pela complexidade do tema e sua delicadeza, já que a maioria pretende incluir o sensibilíssimo ponto sobre a primazia da questão do aborto e, portanto, dos políticos que se forem favoráveis não estariam em condições de poder participar na Eucaristia. O bispo de San Diego objetou veementemente, observando que essa questão de preeminência cheira a linguagem política e não doutrinária. Entre outras coisas, muitos lembram, foi o cardeal Ratzinger quem deixou claro que um eleitor católico que vota em um candidato a favor do aborto por outras razões pode ser justificado pois colabora, mas não no pecado.
Portanto, um católico antiaborto poderia ter motivos válidos para votar, por exemplo, em Joe Biden. A questão da incoerência do segundo presidente católico na história dos EUA, Joe Biden, com os ensinamentos da Igreja foi colocada pelo presidente da Conferência Episcopal já no dia da posse de Biden, sem considerar que Joe Biden pessoalmente é contrário ao aborto, mas a favor de uma legislação que permite a escolha. É por isso que, neste momento, o periódico dos jesuítas estadunidense America, recorda a importância da liberdade de consciência para a Igreja.
O Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Cardeal Ladaria, já assinalou que as discussões devem tender a unir e não a dividir, devem ser amplas e concernir a todos, e não a categorias específicas de pessoas. A esse respeito, lembrou que há duas notas doutrinárias, a de 2004 e a de 2002, que não podem ser ignoradas. Na de 2002 pode-se tranquilamente ler que o aborto, a eutanásia, a defesa da família, a proteção dos menores das formas de escravatura moderna, a liberdade religiosa, o desenvolvimento de uma economia ao serviço da dignidade de cada indivíduo, a rejeição da violência e a promoção da paz são princípios que se referem à moral católica.
No entanto, a maioria dos bispos gostaria de apontar o tema do aborto como preeminente. Assim, a discussão sobre a "coerência eucarística" parece exatamente uma discussão sobre Biden, muito semelhante à que se pretendia fazer, e não foi feita, sobre o candidato presidencial de John Kerry, também pró-escolha. Em um país onde houve assaltos ao Congresso, separação dos filhos de pais em relação aos migrantes, a questão das armas, violência étnica ou racial e muito mais, essa preeminência é considerada por aqueles que não a compartilham como uma escolha política.
Mas a discussão toca na convicção básica expressa inúmeras vezes por Francisco: “A Eucaristia não é o prêmio dos santos, mas o Pão dos pecadores”, disse várias vezes, ou o “remédio para os pecadores”, ou ainda - já em 2015 - que “a Eucaristia não é uma recompensa para os bons, mas uma força para os fracos, um vínculo de comunhão”. É o confronto entre a Igreja missionária, a Igreja em saída e a Igreja identitária, onde está em jogo a concepção de si e não os valores. Não é uma discussão nova: para Francisco a mensagem cristã não pode ser reduzida (a preeminência) descontextualizando a proclamação cristã daquilo que lhe dá sentido e, para ele, beleza. É o cerne do embate entre a sua visão e aquela da ideologia neoconservadora.
O mecanismo de votação sobre a resolução, quando e se for votada, prevê que para a aprovação sejam necessários dois terços dos votos, seguido da aprovação de Roma. Se os bispos decidirem prosseguir, a votação efetiva poderá ocorrer na próxima assembleia, marcada para novembro.
O presidente Biden está prestes a chegar à Europa e muitos acreditam que no dia 15, ou seja, um dia antes da assembleia episcopal, poderia estar no Vaticano. É difícil pensar que neste caso ele não seja recebido por Francisco.
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Dos EUA, 5 dos 6 cardeais pedem para parar o confronto com Biden - Instituto Humanitas Unisinos - IHU