Debate abordará as perspectivas da Mariologia Feminista
Tem uma narrativa corrente sobre Maria, a mãe de Jesus, que associa pureza, docilidade, ternura, dedicação e submissão. Mas essa é apenas uma das possibilidades que, embora a mais comum, nem sempre consegue dar conta das complexidades que há em torno daquela mulher que foi mãe do Deus que se fez homem na terra. E uma dessas narrativas que visa complexificar e trazer outras perspectivas acerca de Maria é a chamada Mariologia Feminista. Esse é o tema do evento organizado pelo Centro de Estudos Bíblicos de Sergipe – CEBI-SE, em parceria com o Canal Não é Heresia, que conta com o apoio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, denominado Semana da Mariologia Feminista. As atividades, destinadas ao público em geral, ocorrem na próxima semana, de 24 a 28 de maio, em conferências online transmitidas pelo You Tube. As inscrições, com direito à certificação, podem ser feitas através deste link. Mas todo conteúdo também estará disponível no Canal Não É Heresia, no YouTube.
A palestra de abertura será no dia 24, às 18h30min, com a teóloga e filósofa Ivone Gebara, que abordará o conceito de Mariologia Feminista em detalhes. Ivone Gebara, em Maria entre as mulheres – perspectivas de uma mariologia feminista e libertadora (CEBI/ Paulus, 2009), observa que em tal perspectiva busca-se uma conexão direta entre as mulheres com a figura de Maria, trazendo para bem perto da realidade quotidiana. “A grande questão é a da justiça e a do respeito entre as pessoas, que exige uma abertura de compreensão, para libertarmos nossas crenças religiosas de prisões dogmatizantes, antidemocráticas e excludentes”, aponta na apresentação da obra.
Para a autora, “isto é condição para ultrapassarmos as barreiras do sexismo, da idealização essencialista, da hierarquização de gênero que deixa em prejuízo as mulheres”. Assim, “a mãe de Jesus, Maria de Nazaré, no fórum de lutas feministas de libertação e salvação, é reencontrada no reverso das sexualidades hierarquizadas, do fixismo das identidades preestabelecidas, da concentração de poder”.
A perspectiva não só de uma mariologia, mas mesmo uma teologia feminista, também está presente nas reflexões do IHU. Em artigo publicado na seção Notícias do Dia do site do IHU, Mary E. Hunt, teóloga, cofundadora e codiretora da rede Women’s Alliance for Theology, Ethics and Ritual (WATER), com sede nos Estados Unidos, observa que “a compulsão bem-vinda da ficção pelo trabalho feminista em religião é o fruto do pensamento cuidadoso dessas estudiosas/ativistas, da escrita clara e dos profundos compromissos com o bem-estar do mundo a partir das mulheres”, em artigo reproduzido.
Nesse mesmo sentido, a própria Ivone Gebara observa que a Igreja precisa, mais do que nunca, aprender a ouvir as mulheres. “Dizer que a Virgem Maria é mais importante que os apóstolos só serve para que tudo continue igual. Isso não vem do Evangelho”, diz em entrevista também publicada na seção Notícias do Dia do site do IHU.
Na programação de palestras da Semana Mariologia Feminista, ainda estão teólogas como Isabel Felix, Mercedes Budalhes, Silvia Sousa, Juliene Tenório, Terezinha Albuquerque, Mercedes Lopes, Nanci Cardoso, Maria Cecília Domezi, Maria José Rosado Nunes, entre outros nomes.
Confira abaixo a programação completa.
Ainda sobre as perspectivas feministas, o espaço das mulheres na Igreja tem voltado ao debate no pontificado de Francisco, desde que ele suscitou estudos sobre a possibilidade de diaconisas. Mais recentemente, revogou uma norma antiga que restringia a presença das mulheres no espaço de liturgia do presbitério. O IHU também tem acompanhado essas discussões. Para John L. Allen Jr., que assina artigo publicado por Crux e reproduzido pelo IHU, “sem dúvida, a principal história vinda do Vaticano nas últimas semanas é a disposição aparente do Papa Francisco em debater sobre se as mulheres podem servir como diaconisas na Igreja Católica ou não”.
Entre as teólogas, há o reconhecimento de que esses avanços são importantes, mas elas esperam mais. É o caso da irmã Nuria Calduch, que recentemente passou a integrar a Pontifícia Comissão Bíblica. Segundo ela, o “Papa Francisco respalda as mulheres tanto na Igreja quanto na sociedade”, mas, apesar de todos os movimentos e estudos, aponta que “o tema segue estando sob o tapete, ainda que lamentavelmente não creio que veremos (ao menos eu e as pessoas da minha geração) nem mulheres diáconas, nem padres na Igreja Católica", em artigo publicado pelo IHU.