10 Agosto 2020
“Sua entrega religiosa e missionária a favor dos pobres o levaram a posturas difíceis de compreender no terreno da política. Eu sempre pensei que suas atitudes e seu comportamento estavam inspirados por sua vontade radical de seguir Jesus em seu amor aos pobres, e na defesa da justiça”, deixou escrito o falecido cardeal espanhol Fernando Sebastián, clareatiano como Casaldáliga, sobre Pedro Casaldáliga, em carta publicada por Alfa y Omega, 08-08-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Encontrei-me com Pedro Casaldáliga pela primeira vez no noviciado, quando eu ingressei na Congregação dos Missionários Claretianos, em julho de 1945. Ele terminava seu noviciado quando eu o começava, assim vivemos juntos todos os anos da carreira eclesiástica.
Ele estava sempre um ano à frente de mim. Fui ordenado em 1953 e ele em 1952, no Congresso Eucarístico de Barcelona. Casaldáliga foi sempre um religioso exemplar, fervoroso, amável, serviçal, requintado no cumprimento das Constituições e de todas suas obrigações. Veio à congregação desde o seminário de Vic com a ideia e o propósito muito claro de ir à missão. Disse-me que pedia cada dia ao Senhor a graça de ser missionário e de ser mártir. O primeiro conseguiu amplamente. O segundo, quase.
Tinha qualidades humanas extraordinárias. Era inteligente, rápido, e teve sempre uma extraordinária facilidade para escrever e compor poesia.
Era um excelente poeta, tanto em catalão como em castelhano.
Em sua vida espiritual distinguia-se por seu espírito de mortificação e sua fervorosa devoção à Virgem Maria. Os primeiros anos do sacerdócio dedicou intensamente ao apostolado com os mais pobres, os abandonados.
Ele estava encarregado do apostolado juvenil, primeiro em Sabadell e depois em Barcelona, no bairro de Gràcia. Suas preferências eram sempre para com os mais vulneráveis. Às vezes os acolhia nas salas destinadas aos jovens e isso causava um certo desgosto na comunidade.
Estando em Barcelona, participou também muito intensamente no Movimento de Cursilhos da Cristandade. Era otimista, fervoroso, sacrificado. Levava uma vida muito ocupada e muito intensa. Consta-me que algumas vezes ficou dormindo na capela de Sabadell e também na de Barcelona por querer rezar o Breviário à última hora da noite.
Ao ser enviado ao Brasil, cumpriu o propósito central de sua vida. Lá entregou sua vida plenamente e esteve a ponto de perdê-la em várias ocasiões. Em uma das minhas visitas à missão, contaram-me como homem confessou que havia recebido dinheiro para matar o bispo Casaldáliga. Estava arrependido e Pedro se organizou para que um dos missionários que estava com ele, fugisse com o homem pelo rio Araguaia, e o acompanhasse até Goiânia. Temia que aqueles que pagaram para o ver morto agora matassem aquele que cumpriu sua obrigação.
Sua entrega religiosa e missionária a favor dos pobres o levaram a posturas difíceis de compreender no terreno da política. Eu sempre pensei que suas atitudes e sua comportamento estavam inspirados por sua vontade radical de seguir a Jesus em seu amor aos pobres e na defesa da justiça.
Para compreender sua atuação, é preciso conhecer de perto as situações de injustiça e de exploração que tinha em seu entorno.
Uma vez ele me disse: “Aqui não se pode ser cristão sem defender os direitos dos pobres, aconteça o que acontecer”.
E tinha razão. Mais que razão, tinha o valor de cumprir, arriscando a sua vida continuamente. Toda a sua vida é um exemplo para os missionários, os padres e os cristãos.
+ Fernando Sebastián, CMF
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“Toda sua vida é um exemplo”, escreveu cardeal Sebastián sobre dom Pedro Casaldáliga - Instituto Humanitas Unisinos - IHU