27 Março 2020
O anúncio da oferta por parte do Vaticano de novas indulgências plenárias para as pessoas em todo o mundo afetadas pelo coronavírus pode ter deixado alguns católicos se perguntando: “Nós ainda fazemos isso?”.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada em National Catholic Reporter, 26-03-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A resposta é sim. E os teólogos dizem que a medida, tomada com um decreto do dia 20 de março pela Penitenciaria Apostólica, mostra um nível aparentemente sem precedentes de cuidado pastoral por aqueles que sofrem com o vírus – especialmente aqueles que podem morrer isolados sem poder receber os ritos finais.
O padre jesuíta James Corkery, teólogo irlandês da Pontifícia Universidade Gregoriana, disse que o decreto se encaixa na visão do Papa Francisco de uma Igreja “misericordiosa, acolhedora e ridiculamente perdoadora”.
“Ele quer que as pessoas sejam ‘recebidas de volta’, sejam perdoadas, acima de tudo, sejam amadas”, disse Corkery, que escreveu extensivamente sobre a Igreja após o Concílio Vaticano II.
No ensino católico, uma indulgência é a remissão da eventual punição devido aos pecados que foram confessados e perdoados. Uma indulgência plenária, que só pode ser concedida de acordo com as várias maneiras descritas pelo Vaticano, envolve a remissão de toda a eventual punição de uma pessoa.
O novo decreto da Penitenciaria oferece indulgências plenárias especiais a qualquer católico afetado pelo vírus, aos profissionais de saúde e suas famílias, a quem rezar pelo fim da epidemia e a quem morrer sem acesso aos sacramentos.
Para quem se encontrar nas primeiras três categorias, a indulgência pode ser obtida se a pessoa se arrepender de seus pecados e, em espírito de oração, assistir à celebração da missa, ao terço, à Via Sacra ou a alguma outra devoção.
Para pessoas que estão perto da morte pelo vírus e estão impossibilitadas de receber os sacramentos por causa das medidas de isolamento, o decreto diz que elas podem obter a indulgência “no momento da morte, desde que tenham rezado habitualmente algumas orações durante a vida”.
Jeremy Wilkins, teólogo do Boston College, disse que vê “algo novo” nessa oferta para aqueles que estão morrendo.
“As condições são abandonadas. Diz-se que a Igreja cumpre as condições por você”, disse o teólogo. “Isso é incrível.”
“É algo realmente terno”, disse Wilkins, que concentrou seu trabalho nas áreas da cristologia e da graça. “Eu acho que a Igreja, com muita ternura, quer dizer: ‘Sinto muito pelos seus pecados. Saiba que você não está sozinho. Tudo vai ficar bem’.”
O padre jesuíta Peter Folan, teólogo da Georgetown University, disse que considerou o tratamento do decreto sobre os moribundos “especialmente comovente”.
“Existe uma teologia profunda por trás disso e um entendimento profundo de quem Deus é, de que Deus nunca desvia o olhar de Deus de ninguém, especialmente daqueles que se encontram naquele evento mais importante da vida, que é a nossa morte”, disse Folan.
Tanto Wilkins quanto Folan disseram que parece que a Penitenciaria tem dois objetivos principais ao oferecer as novas indulgências: mostrar misericórdia aos católicos que enfrentam um período severo de provação e encorajá-los a pensar no seu sofrimento em comparação com o sofrido por Cristo e por todos os santos que vieram antes de nós.
Wilkins disse: “O principal é que é uma tentativa de encontrar uma maneira de dizer: ‘Você não está sozinho no seu sofrimento. O seu sofrimento não é sem sentido. E você não está sozinho. Porque ele realmente se encaixa naquele grande mistério do sofrimento de Cristo em prol da sua Igreja e do sofrimento de todos os membros em prol dos outros”.
Folan, que concentrou seu trabalho na Teologia Sacramental, disse que uma indulgência diz àqueles a quem ela é oferecida e à Igreja em geral que “há algo naquilo que essas pessoas estão experimentando agora que integra as suas vidas mais plenamente à vida de Cristo para que elas sejam mais como Ele”.
“Aqueles que estão infectados com o vírus e suas famílias nos lembram que eles estão configurados com Cristo, que sofreram e que testemunharam o sofrimento”, disse o jesuíta. “Os profissionais de saúde estão configurados com ele, no sentido de que Ele também era alguém que curava”.
Corkery disse que as indulgências, no fundo, são “uma remissão generosa do pecado”".
“As indulgências, nas mãos de Francisco, devem ser vistas no contexto do seu sonho de uma Igreja amorosa, misericordiosa, perdoadora e acolhedora”, disse o jesuíta irlandês.
“As pessoas mais velhas que ainda têm medo de morrer e de não estar em ‘estado de graça’, que ainda têm medo de morrer sem o perdão divino, porque, embora se arrependam, não foram capazes de confessar seus pecados, podem ser enormemente ajudadas por aquilo que Francisco está tentando fazer por elas e por todos nós”, disse ele.
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Indulgências por coronavírus evocam a Igreja “misericordiosa, perdoadora, acolhedora” de Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU