Por: Wagner Fernandes de Azevedo | 17 Dezembro 2019
As manifestações no Chile completam dois meses nesta semana. A rebelião que estourou no país pelo aumento da passagem do metrô ganhou corpo conforme as medidas repressivas do governo foram postas em prática. A violência de Estado que já era relatada pelos manifestantes, meios de comunicação e organismos como a Anistia Internacional, foi denunciada pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos – ACNUDH. De acordo com a entidade, chefiada pela ex-presidente chilena Michele Bachelet, entre os dias 19 de outubro e 06 de dezembro foram 28.210 pessoas presas e 26 mortas por agentes estatais.
As acusações de violações de direitos humanos no Chile por parte das forças de segurança do Estado a mando do presidente Sebastián Piñera, o ministro do interior Andrés Chadwick e o diretor-geral dos Carabineros Mario Rozas ganham cada vez mais evidência. Chadwick já foi deposto do seu cargo, e Piñera vê o país ainda ocupando as ruas exigindo sua renúncia e a popularidade despencando – apenas 13% dos chilenos aprovam sua gestão. A Anistia Internacional apresentou no mês passado um relatório recomendando desde reformas nas polícias estatais à investigação de responsabilidade do presidente nos abusos cometidos desde outubro, quando estouraram os protestos.
O relatório da ACNUDH é resultado de uma investigação de três semanas coletando informações no país: foram entrevistados 235 manifestantes ou familiares de manifestantes vítimas de violência e 60 policiais; além do recorrido por cárceres e hospitais. As conclusões são apresentadas em 35 páginas, cujas conclusões apontam que “Carabineros e o Exército não aderiram às normas e padrões internacionais de direitos humanos, relacionados com a gestão das assembleias e o uso da força”.
Assim como o relatório da Anistia Internacional, o organismo da ONU recolheu informações de pelo menos 138 casos de tortura e maus-tratos cometidos sobretudo pelos Carabineros. Constam também torturas psicológicas, como ameaças de morte, ameaças de “desaparecimento”, estupro, agressões físicas aos manifestantes e/ou seus familiares. “As formas mais comuns de maus-tratos documentadas pela ACNUDH incluem golpes fortes com os punhos, chutes, cotoveladas, coronhadas, frequentemente por vários agentes e em alguns casos depois de a vítima já estar caída no solo, imobilizada ou algemada. A ACNUDH também documentou casos nos quais foram utilizadas formas severas de restrição física, inclusive a asfixia, que em alguns casos resultaram em perda de consciência”, revela o relatório.
Os resultados de abusos sexuais também chamaram a atenção da ACNUDH. De acordo com as informações recolhidas pelo Instituto Nacional de Direitos Humanos do Chile, foram 166 queixas relacionadas ao tema que envolvem diretamente os Carabineros e Exército.
Outra conclusão do relatório é referente ao perfil das vítimas. "As mulheres, meninas e pessoas LGBTI sofreram formas específicas de violência sexual (incluindo nudez forçada), principalmente relacionadas com as detenções. Também foram documentados casos graves de violência sexual contra jovens e adolescentes. Estes que são as maiores vítimas de violações aos direitos humanos", descreve a ONU.
O relatório conclui com 21 recomendações ao Estado chileno, das quais estão uma "reforma estrutural dos Carabineros" e atendimento médico para todos os presos, a fim de assegurar o exame de corpo de delito.
Soda Cáustica na água
Na segunda-feira, 16-12, o Colégio de Químicos Farmacêuticos e Bioquímicos do Chile apresentou um exame dos jatos d'água utilizados pelos Carabineros (caminhões conhecidos como guanacos) para dispersão de manifestantes. De acordo com a análise, a água utilizada pela polícia continha "soda cáustica" e "gás de pimenta". Estes elementos podem causar lesões oculares – no início de dezembro pelo menos 240 pessoas apresentavam essa sequela, números mais recentes estimam mais de 350 pessoas –, queimaduras e desmaios nas pessoas que sofrem o contato direto.
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Chile. “Produziram-se graves violações de direitos humanos em elevado número”, conclui relatório da ONU - Instituto Humanitas Unisinos - IHU