02 Agosto 2019
Completando seis anos como a máxima autoridade da Companhia de Jesus no Chile, o padre e engenheiro comercial de 49 anos, Cristián del Campo, leu na segunda-feira o duro informe que relata os reiterados abusos cometidos pelo ex-capelão do Hogar de Cristo.
A reportagem é de Tomás Molina J., publicada por El Mercúrio, 01-08-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
A leitura de quase meia hora feita pelo padre Cristián del Campo Simonetti, provincial da Companhia de Jesus no Chile, surpreendeu inclusive aos próprios membros da congregação. Eram poucos os que conheciam o conteúdo da investigação do penalista Waldo Bown, que por seis meses se encarregou de indagar sobre as denúncias contra o falecido padre Renato Poblete.
No último 26 de julho, Del Campo recebeu as 407 páginas do inquérito, às 15h30, na rua Lord Cochrane 110, em Santiago, local onde fica a sede da Companhia de Jesus. O inquérito começou a partir da denúncia de Marcela Aranda, e os principais resultados foram apresentados à máxima autoridade dos jesuítas no Chile. Ali, o provincial de 49 anos soube, entre outras coisas, dos 22 testemunhos de mulheres que acusaram ter sido vítimas de abusos sexuais e de poder por parte do ex-capelão do Hogar de Cristo entre 1960 e 2008, das quais quatro eram menores de idade no momento dos fatos. “As condutas de abuso de poder, de consciência, sexual e outros delitos cometidos por Renato Poblete Barth se sustentaram em um tipo de ‘vida dupla’ amparada pela sua imagem pública de pessoa de bem”, apontou Del Campo, dando fim ao processo investigativo contra uma das figuras mais influentes na história da ordem religiosa, e cujo caso deverá continuar agora na justiça civil e no Vaticano.
As conclusões do processo ordenado pelo mesmo provincial coincidem em sua reta final no cargo, já que em 2019 se cumprem seis anos desde que assumiu. Apesar de não ser informada a data exata em que o padre deverá passar o mandato, uma pista entrega: o dia em que chegou ao posto, 30 de setembro de 2013.
Nesse mesmo ano, e apenas exercendo a liderança da província, ele teve que enfrentar uma complexa investigação dentro da ordem, de acordo com o tom que, de acordo com a Companhia de Jesus, marcava seu mandato: sobre abuso sexual e consciência.
Daquela vez, foi uma investigação anterior contra seu antecessor, Eugenio Valenzuela. "Aí houve um momento em que nos colocou à ribalta. Um processo foi feito, certas conclusões foram alcançadas e depois disso veio uma relativa calma nestes casos, até a visita do Papa [em 2018]. Esse foi um segundo marco, não só para nós, mas para toda a Igreja ", disse Del Campo em entrevista à rádio Infinita.
Assim foi como o caso do padre Jaime Guzmán, que desde 2012 está cumprindo uma sanção canônica por abuso infantil, resgatou, além do golpe que significou conhecer os vexames perpetrados pelo padre Leonel Ibacache. Ambos expulsos da Companhia de Jesus recentemente e cujos processos foram liderados por Del Campo.
"Achamos que 2018 havia sido doloroso e que estávamos cuidando de tudo o que deveríamos enfrentar, quando aparece no começo deste ano o caso de Renato Poblete”, disse o provincial.
Em paralelo, Del Campo teve que enfrentar as vozes que criticaram a "arrogância" da Companhia de Jesus perante outras congregações ou episcopados antes que seus próprios casos fossem descobertos. Soberba que, em qualquer caso, ele admite: "É o nosso maior pecado".
"Nós temos sido arrogantes por um longo tempo para atingir outros membros da nossa Igreja, padres de outras congregações ou do clero diocesano ou autoridades da Igreja. É algo que devemos assumir e pelo qual devemos pedir perdão", disse ele.
Cristián del Campo nasceu em 4 de setembro de 1970, em Santiago. Cursou seus estudos básicos e de ensino médio no Colégio Santo Inácio do Bosque, lugar em que compartilhou aula com o falecido jogador de futebol e símbolo do clube Universidad Católica, Raimundo “Mumo” Tupper.
Assim que saiu do colégio, titulou-se como engenheiro comercial da Universidade Católica e entrou na Companhia de Jesus, em 13 de março de 1994, sendo ordenado padre em 2005 pelo cardeal Francisco Javier Errázuriz. Porém antes, entre os anos 2000 e 2002, viveu com o padre Renato Poblete. "Estava voltando dos Estados Unidos, era estudante jesuíta ainda nessa época. Compartilhei comunidade com ele, mas não trabalhei com ele”, sustentou.
“O conheci. Me pareceu sempre uma pessoa muito agradável, muito simpática, muito encantadora, muito empreendedora, e das poucas coisas que recordo que hoje eu poderia olhar para trás e ver que ele era uma pessoa que tinha alta atividade social. Eu nunca tive um sinal (de seus abusos)", agregou.
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Chile. Cristián del Campo, o provincial jesuíta que viveu com Poblete e que deixará o cargo marcado por casos de abusos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU