24 Setembro 2018
Os católicos ultraconservadores estão aproveitando o vazio de poder na Igreja estadunidense e europeia diante da crise dos abusos para impor sua visão rigorista da fé. É o que se depreende da notícia de que a ala mais radical do catolicismo nos Estados Unidos está, por um lado, organizando uma conferência sobre a “autêntica reforma”, e, por outro lado, de que o cardeal Raymond Burke, líder da oposição ao Papa Francisco, está colaborando na fundação de um movimento político da extrema direita na Europa.
A reportagem é de Doody Cameron e publicada por Religión Digital, 22-09-2018. A tradução é de André Langer.
A conferência sobre a “autêntica reforma” da Igreja é organizada pelo Napa Institute, fundado pelo advogado bilionário Timothy Busch, que se tornou um dos mais ferrenhos críticos do Papa Francisco, dando asas aos pretextos do arcebispo Carlo Maria Viganò, a partir do portal do qual é diretor, o National Catholic Register.
Como revela o National Catholic Reporter, o Instituto Napa inventou um programa de “reformas” muito diferente das prioridades estabelecidas por Francisco e pela Igreja comum, para não dizer alinhado à ideologia do ultraliberalismo. “A Humanae Vitae como uma carta para a reforma”, “Purificar o clero” e “O problema da homossexualidade” são algumas das conferências programadas para o evento que acontecerá no dia 02 de outubro, cuja inscrição é de 500 dólares (afora hotel), e que contará com a participação de uma lista de vozes anti-Bergoglio, inclusive a do ex-prefeito da Doutrina da Fé, cardeal Gerhard Ludwig Müller.
Alguns dos analistas de maior prestígio da conjuntura eclesial dos atuais Estados Unidos atacaram Busch e seu assessor eclesial, Charles Chaput, arcebispo da Filadélfia, por terem perfilado à sua iniciativa privada a ideia de uma “autêntica reforma”.
“A Igreja nos Estados Unidos precisa reunir-se para encontrar um caminho para a reforma e uma nova unidade”, disse Massimo Faggioli, professor de teologia e estudos religiosos na Universidade Villanova da Pensilvânia. “As iniciativas partidárias só farão os problemas piorarem”, acrescentou, observando que a conferência do Napa Institute “é exatamente o contrário” dos “momentos sinodais” de discussão coletiva que o Papa Francisco pede à Igreja. “Não há nada” na conferência, continuou Faggioli, “que possa ser considerado uma ‘reforma’”. “Deveria ser chamada de ‘status quo’”, concluiu.
O professor de estudos religiosos na Universidade de Fairfield, Dan Cosacchi, por sua vez, concordou com Faggioli em que o principal problema da conferência do Instituto Napa é o “clericalismo” que promove. Além disso, ao contrário da reforma que se promove nesta conferência, a “verdadeira reforma sempre procura manter a comunhão da Igreja acima do cisma ou da criação de facções”, explicou Cosacchi, acrescentando que, além de um “catolicismo nacionalista”, nota também um elemento de elitismo no alto custo da inscrição.
O cardeal Raymond Burke confirmou à Reuters que atualmente está trabalhando “na promoção de uma série de projetos que devem contribuir de maneira decisiva para a defesa daquilo que antes era chamado de cristianismo”. Entre esses projetos está o “Movimento” político populista mediante o qual o ex-assessor de Donald Trump, Steve Bannon, apoiará os partidos europeus de extrema direita nas próximas eleições europeias.
O cardeal norte-americano Burke – teoricamente o Patrono da Ordem de Malta, mas, na verdade, afastado de qualquer papel na organização desde a chegada do Papa – admitiu estar em “comunicação” com Bannon sobre a organização do “Movimento”, que tem por finalidade acabar com a União Europeia, devido à sua postura muito branda com os imigrantes e refugiados. O eixo da colaboração entre Bannon e Burke é o Instituto Dignitatis Humanae, com sede no ex-mosteiro de Trisulti, em Collepardo, pertinho de Roma, instituição na qual Bannon é assessor e Burke presidente do conselho consultivo, e que se descreve como “uma academia pelo Ocidente judaico-cristão”.
O diretor do instituto, Benjamin Harnwell, confirmou à agência Reuters que pretende colocar em prática dois programas com a ajuda de Burke e Bannon: um, de formação de lideranças para católicos ultraconservadores que desejam ocupar cargos políticos, e outro para a defesa da vida, também com a colaboração do cardeal Renato Martino.
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Os três B que atormentam o Papa: Busch, Bannon e Burke - Instituto Humanitas Unisinos - IHU