06 Agosto 2015
O informe anual dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), divulgado em junho, destaca um número significativo de êxitos. Mas não menciona que algumas das metas estão abaixo do acordado em destacadas conferências internacionais realizadas pela Organização das Nações Unidas (ONU) na década de 1990.
A reportagem é de Jomo Kwame Sundaram e Michael T. Clark, publicada por Envolverde/IPS, 04-08-2015.
Conseguiu-se reduzir pela metade o número de pessoas indigentes bem antes do prazo previsto de 2015, em relação aos índices de 1990. Mas uma análise exaustiva revela que os avanços foram desiguais entre as regiões e os países, pois o rápido desenvolvimento da China representa grande parte da redução da pobreza mundial.
Os avanços na maioria dos outros ODM foram mais limitados. Um crescimento mais lento durante mais de meia década, maior desigualdade econômica em muitos países e menor investimento social público prejudicaram os êxitos, apesar do crescimento registrado na renda média.
Segundo o Banco Mundial, a pobreza global conforme a paridade de poder aquisitivo de US$ 1,25 por dia caiu, em 2010, para menos da metade da registrada em 1990. O número de pessoas que vivem em extrema pobreza diminuiu de 1,9 bilhão, em 1990, para 836 milhões este ano. Tanto o número de pessoas pobres como a proporção delas diminuíram em todas as regiões, inclusive na África subsaariana, onde se registra a maior taxa de pobreza.
Já a taxa de fome ou prevalência de pessoas subalimentadas (com ingestão energética inadequada) diminuiu menos da metade, de 23,3%, em 1991, para 12,9%, em 2014. Estimativas da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) indicam que 780 milhões de pessoas passaram fome nos países em desenvolvimento no ano passado, abaixo dos 991 milhões registrados em 1991. Mas não se chegou ao ambicioso objetivo da Cúpula Mundial da Alimentação, organizada pela ONU em 1996, de reduzir pela metade até 2015 o número de pessoas que passam fome.
Paralelamente, a diminuição do atraso no crescimento infantil, uma medida da má nutrição e suas consequências de longo prazo, foi mais modesta ainda. A maioria das regiões registrou avanços desiguais, mas na África subsaariana, de fato, o número de meninas e meninos com atraso no crescimento aumentou um terço entre 1990 e 2013.
Como a pobreza foi definida originalmente pela renda necessária para cobrir as necessidades básicas, que incluem os alimentos, é difícil compreender como a renda pode aumentar o grau de redução da pobreza em mais da metade, enquanto o impacto sobre a nutrição foi muito menor.
Algo semelhante ocorreu com o desemprego. A proporção de trabalhadores não remunerados nas famílias e autônomos na força de trabalho dos países em desenvolvimento diminuiu para 45%, em 2015, com relação aos 55% de 1991. Mas as pessoas nessa categoria aumentaram quase 200 milhões desde esse ano. E quase metade dos empregados de todo o mundo trabalham em condições vulneráveis; e as mulheres e os jovens têm maiores probabilidades de ocupar postos inseguros e mal remunerados.
Desde 1990, 2,1 bilhões de pessoas tiveram acesso a melhores condições de saneamento. Mas a proporção das que defecam ao ar livre está bem abaixo da meta de reduzir em 75% as pessoas nessa situação, o que coloca em risco a saúde e a alimentação de muitas mais, especialmente de crianças.
A meta de reduzir pela metade a população sem acesso a água potável foi atingida em 2010; as pessoas com fontes melhoradas aumentaram de 76%, em 1990, para 91%, em 2015. A proporção de pessoas em assentamentos precários diminuiu de 46%, em 2000, para 30%, em 2014, mas o número dos que vivem nessas condições aumentou mais de 25%, de 689 milhões, em 1990, para 881 milhões, no ano passado.
A mortalidade materna diminuiu quase pela metade desde 1990, mas esteve abaixo da meta de redução de 75%. Só metade dos países conta com dados sobre as causas das mortes de mulheres relacionadas com gravidez, parto e pós-parto. Mais de 71% dos nascimentos registrados no mundo em 2014 contaram com atenção de pessoal médico qualificado, acima dos 59% registrados em 1990. Nos países em desenvolvimento apenas 56% dos nascimentos rurais tiveram assistência de profissionais capacitados, bem pouco comparado com a proporção de 87% em contextos urbanos.
Em escala mundial, a mortalidade infantil diminuiu mais da metade, de 90 para 43 em cada mil nascidos vivos, entre 1990 e 2015. Mas cerca de 16 mil menores de cinco anos continuam morrendo diariamente este ano, a maioria por causas evitáveis. A prevenção, o diagnóstico e o tratamento da tuberculose permitiram salvar cerca de 37 milhões de vidas entre 2000 e 2013.
O aumento de intervenções impediu 6,2 milhões de mortes por malária entre 2000 e 2015, especialmente de menores de cinco anos na África subsaariana. As novas infecções pelo vírus HIV, causador da aids, diminuíram 40% entre 2000 e 2013, de aproximadamente 3,5 milhões para 2,1 milhões de pessoas. Em meados do ano passado, 13,6 milhões de pessoas com HIV recebiam antirretrovirais em todo o mundo, bem acima das 800 mil registradas em 2003.
A proporção de alfabetizados entre 15 e 24 anos aumentou em todo o mundo. A matrícula no ensino primário nos países em desenvolvimento chegou a 91% em 2015, acima dos 83% de 2000. Há muitos mais menores escolarizados, reduzindo-se rapidamente a diferença entre meninos e meninas.
Os estudantes não institucionalizados diminuíram pelo menos em 50% em todo o mundo, de 100 milhões, em 2000, para 57 milhões em 2015. Já o número de meninos e meninas na escola primária na África subsaariana aumentou mais que o dobro entre 1990 e 2012, passando de 62 milhões para 149 milhões. Nos países em desenvolvimento, meninos e meninas de famílias mais pobres têm quatro vezes mais probabilidades de não ir à escola do que os mais ricos.
Com relação à sobrevivência e a outros assuntos, o êxito de maiores avanços exigirá uma redução concertada das desigualdades socioeconômicas. Como faltam cinco meses para vencer o prazo para alcançar os oito ODM, há metas que ainda podem ser atingidas. Mas será necessário fazer muito mais para alcançar os objetivos de nutrição, saúde pública, saneamento, igualdade de gênero, infraestrutura, sustentabilidade de recursos, bem como mitigação e adaptação à mudança climática.
Desde a conferência Rio+20, em junho de 2012, começou a tomar forma uma nova agenda para definir novos objetivos e novas metas para depois de 2015. O novo enfoque dá maior importância a questões de sustentabilidade ambiental e escassez de recursos. Em meados de 2014 foram acordados 17 objetivos e 169 metas.
Mas, como prova a Conferência sobre Financiamento para o Desenvolvimento, realizada este mês em Adis Abeba, capital da Etiópia, é muito difícil conseguir progressos significativos nos “meios de implantação” para concretizar os objetivos.
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