16 Janeiro 2015
"Praticando uma violência metódica para semear o terror e apagar as suas pulsões sanguinárias, os militantes do Boko Haram atiram à queima roupa em quem estiver no seu caminho, aos que não conseguiram fugir rapidamente ou confiavam nas autoridades para estar protegidos. Sobreviventes descrevem estradas repletas de cadáveres, feridos agonizando, centenas de moradores queimados", afirma o editorial do jornal Le Monde, reproduzido pelo portal Uol, 15-01-2015.
Eis o editorial.
Como tantas coisas, o jihadismo está globalizado. Esse modo particularmente bárbaro de violência política praticada pela Al-Qaeda e pelos seus emuladores ataca o mundo inteiro. No mesmo dia das mortes nos escritórios da Charlie Hebdo, quarta-feira 07 de janeiro, a explosão de um “caminhão bomba” na capital do Yêmen, em Sanaa, matava 37 pessoas. Ainda pior: nestes últimos dez dias, os extremistas do Boko Haram, na Nigéria, perpetuaram um massacre de amplitude abominável – muitas centenas de mortos, talvez chegue na faixa dos 2000.
Não foram feitas manifestações nas ruas de Lagos, a capital econômica da Nigéria, nem em memória dos habitantes dos vilarejos nigerianos dentre os quais um grande número de mulheres e crianças foi dizimado nas estradas ou em suas casas, com armas de guerra. Foram mortas as vítimas da última ofensiva do Boko Haram, uma insurreição armada que busca, e consegue, conquistar um amplo território no nordeste da Nigeria, nos confins entre o Niger, o Ciad e o Camerun. O Boko Haram faz referência a uma forma de islamismo fundamentalista e pretende criar, montando em quatro cidades, um tipo de “califado”, meio que ao modo do Estado Islâmico na Síria e no Iraque.
O grupo, que agora dispõe de um verdadeiro exército, conduz uma ofensiva contra a cidade de Baga, nos montes do lago Ciad. Praticando uma violência metódica para semear o terror e apagar as suas pulsões sanguinárias, os militantes do Boko Haram atiram à queima roupa em quem estiver no seu caminho, aos que não conseguiram fugir rapidamente ou confiavam nas autoridades para estar protegidos. Sobreviventes descrevem estradas repletas de cadáveres, feridos agonizando, centenas de moradores queimados.
O Monsenhor Ignatius Kaigama, arcebispo católico da Nigéria, de acordo com o que foi escrito pelo Financial Times, observava: “Comparem aquilo que aconteceu na França com o que está acontecendo aqui: existe uma grande diferença”. Não foi reunido o Conselho de Segurança da ONU.
O Boko Haram continua sua obra de morte sem que a “comunidade internacional” se mobilize. Cerca de sessenta países participam ativamente, ou formalmente, à coalisão reunida pelos Estados Unidos para salvar o Iraque do Estado Islâmico. Nada parecido acontece na Nigéria, o mais extenso país africano, com aproximadamente 180 milhões de habitantes. As autoridades nigerianas estão sobrecarregadas, corrompidas, incapazes de organizarem, sozinhas, uma operação militar para contrastar a desestabilização em andamento naquela região da África. Quem se lembra das 276 estudantes raptadas em abril de 2014 pelo grupo para serem feitas de escravas sexuais? Onde está a solidariedade africana? Onde está a solidariedade dos grandes “emergentes” – Índia, China e Brasil – que, em termos, estão próximos a este outro “emergente” que é a Nigéria?
As autoridades nigerianas, por sua vez, têm enormes responsabilidades. O governo desse país, rico em petróleo que parece lucrar mais ao sul que ao norte desse imenso país, não parece ter acordado, com o Boko Haram, a prioridade estratégica necessária por essa insurreição armada que está lado a lado com o banditismo e o jihad. Hoje, são quatro os países africanos que estão sob constante ameaça. A situação requer urgentemente uma cooperação internacional substancial para garantir a segurança naquela região da África. Cada dia de atraso aumenta o número de mortos, anônimos, mas reais.
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Na Nigéria, massacres em silêncio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU