09 Agosto 2019
Os patriarcas acreditaram nas promessas de Deus, tendo n’Ele depositado toda «a sua esperança». A fé de Abraão e de Sara é a dos viajantes que saudaram de longe «a realização das promessas». Nossa esperança não é menor: esperamos a volta do Mestre e a realização do Reino anunciado.
A reflexão é de Marcel Domergue (+1922-2015), jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando o evangelho do 19º Domingo do Tempo Comum - Ciclo C (11 de agosto de 2019). A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.
Referências bíblicas
1ª leitura: Desejavam uma pátria melhor, por isso Deus preparou uma cidade para eles. (Sb 18,6-9)
Salmo: Sl. 32(33) - R/ Feliz o povo que o Senhor escolheu por sua herança!
2ª leitura: “A fé é um modo de já possuir o que ainda se espera” (Hb 11,1-2.8-19 ou 1-2.8-12)
Evangelho: “Vós também, ficai preparados!” (Lc 12,32-48)
"A fé é um modo de já possuir o que ainda se espera" (2ª leitura). Foi assim que, no Egito, Moisés e os Hebreus celebraram a Páscoa (1ª leitura), levantando cálices de benção e dando graças a Deus pela libertação que ainda estava por vir. "Entoavam antecipadamente - diz a 1ª leitura - os cânticos de seus pais."Fé e esperança estão, portanto, estreitamente ligadas: a fé no Deus que não engana permite-nos manter a esperança na realização final de todas as promessas. Assim como, inversamente, é a certeza da fidelidade de Deus que nos permite viver na fé todas as peripécias do presente.
Pela esperança, a fé se antecipa: "é um modo de já possuir o que ainda se espera." Ela nos transporta desde já até o fim, religando toda a história. Daí as palavras de Jesus em Marcos 11,24: "Tudo o que pedirdes, crede que já o recebestes, e assim será para vós", fórmula que conjuga de modo admirável o presente (o que pedirdes), o passado (já o recebestes) e o futuro (o que será para vós). Mas em que consistem estas "promessas" que aparecem com tanta frequência nos relatos bíblicos? Para além das imagens e das figuras utilizadas (terra prometida, paraíso, banquete escatológico, núpcias do cordeiro etc.), o que está prometido e o que esperamos na certeza da esperança é o próprio Deus, ou, como diz 2 Pedro 1,4, tornarmo-nos “participantes da natureza divina”. Este é o "tesouro inesgotável" de que fala o evangelho (versículo 33).
Com figuras e palavras diferentes, o evangelho de hoje nos convida a viver o presente como pessoas que esperam tudo do futuro; "uma pátria melhor", diz a carta aos Hebreus. Por isso o tema da descendência é onipresente na Bíblia, que "faz voltar o coração dos pais para os filhos" (Malaquias 3,24; Eclesiástico 48,10; Lucas 1,17). Nosso futuro é a nossa descendência e esta descendência somos nós mesmos, gerados em um novo nascimento. Eis-nos, pois, aqui, voltados "ao que vem".
O evangelho insiste no lado imprevisto desta vinda. Sendo impossível prevê-la, só podemos esperá-la, uma vez que se dará "numa hora em que não pensais". Mas como "esperar", como "ficar preparado"? Permanecendo sempre prontos para o trabalho, vivendo as nossas ocupações como em serviço. Então se poderá realizar a inversão senhor-servidor: o senhor será de fato quem, em vestes de trabalho, vai cingir-se para alimentar, ele mesmo, os que souberam esperá-lo. Tudo o que os servidores tiverem feito durante a ausência do senhor terá ficado marcado, tingido por esta espera. E todas as nossas obras, conquistas, sucessos e fracassos estão assim sendo vividos sob o signo do provisório.
Somos continuamente convidados a perseverar, a sempre ir mais adiante, como sendo atraídos pelo nosso futuro, por este futuro que é o próprio Deus. É preciso repetir: o que se constitui em valor de nossa vida é o desejo e a qualidade do nosso desejo; o que, para Santo Agostinho, confunde-se com a nossa oração.
Um tema que sempre volta nos evangelhos é o da ausência do mestre. Podemos pensar em Gênesis 1, quando Deus, ao terminar seu trabalho, confia ao homem o cuidado de sua criação, que é a imagem que está subjacente a este texto. Pensemos também no silêncio de Deus, que não intervém nos acontecimentos de nossas vidas. Não interveio nem mesmo quando decidimos crucificar o Cristo, fato que, de um modo ou outro, se reproduz a cada vez que "crucificamos" os nossos irmãos.
Mas não intervir significa ausentar-se? Aparentemente sim, pois não podemos discernir em nenhuma parte qualquer vestígio de sua ação. E, no entanto, Ele está bem aqui, pois Se faz um só com as nossas vítimas. Está aqui igualmente até mesmo com os carrascos; não como cúmplice, não para condenar nem para se vingar, mas para perdoar. Neste sentido, podemos dizer que, na realidade, o “Mestre” nunca está ausente.
Mas o que, então, dizer desta espera? Deste apelo ao futuro? Desta vinda de Deus "numa hora em que não pensamos"? Creio que Deus vem até junto de nós incessantemente; a cada instante recebemos a sua visita. Não que seja Ele quem realiza tudo o que acontece, mas, através dos acontecimentos, e por meio deles, é que Deus se põe à nossa escolha. Esta vinda permanente de Jesus em nossa existência é sempre imprevista, às vezes até desconcertante. "Ficar preparados" pode traduzir-se por permanecermos abertos a tudo o que vem, para, a partir daí, vivermos sempre mais conforme o amor.
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A alegria da espera - Instituto Humanitas Unisinos - IHU