Por: André | 12 Agosto 2015
Com 81 anos de idade, este padre jesuíta demonstrou que não é necessário utilizar um nome reconhecido no campo intelectual ou midiático para alcançar um objetivo. Sua simplicidade e humildade abriram-lhe as portas para poder estar com o Papa Francisco.
A reportagem é publicada por Eju.tv, 09-08-2015. A tradução é de André Langer.
“Espero que consiga dizer (ao Papa) pelo menos aqui estão (três livros sobre a vida de Luis Espinal), para que veja que o Lucho realmente é um mártir da Igreja”, foram as palavras do padre jesuíta Xavier Albó em uma entrevista à ANF, dias antes da visita do Papa Francisco à Bolívia.
Albó foi companheiro e amigo muito próximo de Luis Espinal, jesuíta que foi assassinado por paramilitares em março de 1980, e considera que a Igreja católica deve declará-lo formalmente mártir. Por essa razão, e pelo carinho profundo que sente por Espinal é que Albó, desde que a visita do Papa Francisco à Bolívia foi confirmada, iniciou uma campanha para que o povo boliviano, e o mundo em geral, faça parte de um reconhecimento em honra do seu amigo.
É assim que fez com que o Papa mudasse sua agenda e realizasse uma parada de cinco minutos na curva do Plano Autopista, a alguns quilômetros de onde foi encontrado o corpo sem vida de Espinal, para dedicar-lhe um momento de oração. Durante esse ato, a intenção de Albó foi presentear o Papa Francisco com três publicações que falam sobre o seu amigo e que demonstram que ele deu sua vida pelos outros. Mas não imaginou que seu plano fosse frustrado pelo controle policial que não o deixou se aproximar nem mesmo do papamóvel. É então que se inicia umas série de tentativas frustradas para alcançar seu objetivo. Restavam apenas dois dias para isso.
Primeira tentativa frustrada: o padre Albó pensou em entregar seus livros em algum momento depois da Eucaristia em Santa Cruz, pois estava entre os inscritos para concelebrar na missa. Mas não contou com o fato de que o seu telefone tocasse a cada instante, com chamadas nacionais e internacionais. Nesse dia, todos os meios de comunicação tinham interesse em localizá-lo, porque Albó conhecia em pormenores o significado de uma réplica da cruz talhada por Luis Espinal e que fora dada de presente ao Papa pelo presidente Evo Morales no Palácio do Governo. Então, chegou tarde à missa e não conseguiu entrar. Os livros continuavam em suas mãos.
Segunda tentativa frustrada: perder a missa não o desanimou. Albó disse a si mesmo que no encontro com os religiosos e religiosas, no Colégio Dom Bosco, encontraria a oportunidade para fazê-lo, pois, como jesuíta, tinha um lugar reservado. No entanto, quando viu que o Santo Padre se aproximou do lugar onde estava, a multidão e o fugaz encontro não permitiram que entregasse os livros.
Terceira tentativa frustrada: depois de perder a oportunidade no Colégio Dom Bosco, o padre Albó sabia que sua última oportunidade era o Encontro dos Movimentos Populares, mas devia deslocar-se até o Campo Feiral de Santa Cruz e o tráfico de pessoas e veículos estava a ponto de desanimá-lo, mas prosseguiu. Enquanto caminhava em busca de um taxi foi interrompido por uma jornalista do jornal Los Tiempos de Cochabamba, que desejava entrevistá-lo.
O que Albó conseguiu fazer foi dar a entrevista enquanto iam de taxi ao local do Encontro dos Movimentos Populares. De acordo com o padre, ambos se beneficiaram dessa travessia. A jornalista, porque conseguiu sua nota, e ele, porque não pagou o transporte, feito por ela.
Quarta e última tentativa frustrada: devido ao tráfego, Xavier Albó chegou quando as portas do Campo Feiral já estavam fechadas e não houve súplicas que fizessem os guardas mudarem de ideia. No entanto, permaneceu parado entre as pessoas, talvez pudesse fazer algo no final do encontro.
“A porta abriu-se sem querer"
Repentinamente, a porta de entrada do Campo Feiral abriu-se por um momento e Albó tentou driblar a Polícia que controlava a entrada e se juntou à multidão que desejava furar a fila para entrar. Nesse instante, conta Albó, uma pessoa que trabalhava para o Governo viu-o de dentro, conseguiu reconhecê-lo e pediu à segurança para que o deixasse entrar. Foi assim que, sem pensá-lo, viu que tinha dado certo e que estava, além disso, bem próximo do palco.
Uma vez que o Papa Francisco terminou sua intervenção, Albó notou que o Santo Padre não saiu de imediato, como aconteceu no Colégio Dom Bosco, e infiltrou-se pela parte de trás do palco. Foi aí que aproveitou para ir ao seu encontro e, finalmente, o conseguiu. O Papa estava sentado, descansando.
Foi o momento em que Albó conseguiu realizar seu objetivo, embora tenha durado pouquíssimos minutos, entregou ao Papa os três livros que carregou durante todos esses dias: o primeiro, a nova edição das Orações à queima-roupa, escritas por Espinal e que incorpora fotografias dos seus talhados. O segundo, a edição especial da Revista Cuarto Intermedio intitulada “Francisco na Bolívia”, dedicada ao Santo Padre, e o terceiro foi o livro Calar é o mesmo que mentir, do próprio Espinal.
Além disso, aproveitou para entregar-lhe uma encomenda da esposa de um diácono amigo seu, um “lluchu” (chapéu feito a mão com lã de alpaca), pois era desejo desse casal de amigos que esse objeto, junto com uma carta informando sobre um encontro latino-americano de diálogo entre indígenas e cristãos, chegasse às mãos do Papa.
“Feliz, muito feliz”, são as palavras que o padre Albó utiliza para descrever o que sente quando lhe perguntam sobre toda essa façanha.
Xavier Albó é padre jesuíta de origem espanhola e nacionalizado como cidadão boliviano. Com 81 anos de idade fez todas essas peripécias com o objetivo de consolidar a memória e o reconhecimento de seu amigo “Lucho Espinal”. Demonstrou que não é necessário utilizar um nome reconhecido no campo intelectual ou midiático. Sua simplicidade e humildade abriram-lhe as portas para poder estar com o Papa Francisco.
Nota da IHU On-Line: Xavier Albó estará no Unisinos, convidado pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, no dia 27 de agosto, quando proferirá duas conferências:
1.- Bem viver. Impactos na América Latina
2.- O grande desafio dos indígenas nos países andinos: seus direitos sobre os recursos naturais.
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As peripécias do padre Xavier Albó para conseguir falar com o Papa sobre o seu amigo Luis Espinal - Instituto Humanitas Unisinos - IHU