11 Agosto 2025
O artigo é de Emília Robles, publicada por Religión Digital, 10-08-2025.
Emília estudou Teologia Pastoral e Psicologia. É especialista em questões religiosas, Gestalt, intervenções sistêmicas, mediação e comunicação social. Foi professora de religião de 1991 a 1995 e, posteriormente, de 1999 a 2007, trabalhou como mediadora e consultora em instituições educacionais. Desde 2002, é coordenadora do Proconcil (Iniciativa para um Novo Concílio em Forma de Processo Conciliar). Nas décadas de 1970 e 1980, enquanto estudava na universidade, foi operária dedicada em uma metalúrgica, ativista da JOC e educadora de rua em Vallecas, onde trabalhou em estreita colaboração com o Bispo Alberto Iniesta.
Com profunda gratidão por sua vida e legado, nós, na Igreja, lembramos de Dom Fritz Lobinger, Bispo Emérito de Aliwal, África do Sul, que partiu para a Casa do Pai no domingo, 3 de agosto de 2025, em uma residência sacerdotal em Pretória, aos 96 anos. Sua passagem pela história eclesial deixou uma marca indelével (embora não tão conhecida como se desejaria), sobretudo por sua busca incansável de formas pastorais encarnadas, atentas às pessoas, e por seu compromisso com uma Igreja de comunidades vivas e corresponsáveis.
Lobinger era de origem alemã. Nasceu em 22 de janeiro de 1929, em Passau, Alemanha. Seu pai, Hermann Lobinger, trabalhava como professor, enquanto sua mãe, Martha Lobinger, era dona de casa. Ambos eram pessoas de fé inabalável, sem ligação direta com a vida eclesiástica. O ambiente familiar de Fritz era marcado por uma atmosfera de educação e valores cristãos, o que pode ter influenciado sua vocação sacerdotal.
Foi ordenado sacerdote em Regensburg em 1955. Um ano depois, viajou para a África do Sul para trabalhar como missionário Fidei Donum. Doutorou-se em missiologia pela Universidade de Munster e foi cofundador do Instituto Pastoral Lumko da Conferência Episcopal Sul-Africana. Bispo da Diocese de Aliwal (1988-2004), aposentou-se em 2008 no Mosteiro de Mariannhill, na África do Sul (Durban), onde continuou a escrever e a participar de encontros internacionais até que a doença e a idade avançada o trouxeram para esta residência sacerdotal em Pretória, onde faleceu após passar 70 anos de sua vida na África do Sul.
Neste contexto sul-africano, adotado como local missionário, desenvolveu uma visão pastoral centrada em pequenas comunidades eclesiais como células vivas da Igreja. Nessas comunidades, promoveu a prática da Bíblia compartilhada, metodologia que permitiu à comunidade ler, ouvir e discernir em conjunto a Palavra de Deus, reconhecendo a voz do Espírito na vida concreta das pessoas. Essa experiência tornou-se um dos pilares de sua proposta pastoral: uma Igreja onde a participação, a escuta e o discernimento comunitário são o caminho ordinário da evangelização. Para auxiliar na revitalização comunitária, capacitou-se na metodologia de educação popular do educador brasileiro Paulo Freire, visitando o Brasil em diversas ocasiões.
Profundamente atento às reais necessidades das comunidades, especialmente em contextos onde a Eucaristia dominical não podia ser celebrada por falta de sacerdotes, Lobinger propôs com ousadia e fidelidade uma reflexão sobre novas formas de ministério. Sua sugestão de ordenar " equipes de anciãos " — líderes reconhecidos por suas comunidades, casados e com vida estável — surgiu não como uma solução funcional, mas como uma proposta teológica e pastoral profundamente enraizada na vida do povo de Deus e na grande tradição das comunidades paulinas.
No verão passado, durante uma visita à Herder Publishing, soube com tristeza que seus dois livros, publicados em 2011, estão esgotados. No entanto, é sabido que os problemas que ele aborda não estão. E isso não afeta apenas o Brasil (como Dom Erwin Kraütler já expressou ao Papa Francisco) e a África, por cujas comunidades Dom Fritz Lobinger se preocupava. Há poucos dias, segundo alguns parentes afetados, duas pequenas cidades de Palência se viram impossibilitadas de celebrar a Eucaristia todos os domingos devido à falta de padres. O bispado ofereceu-lhes freiras para atendê-las (claro, sem a possibilidade de celebrar a Eucaristia, apenas a Palavra), o que muitos recusaram, considerando-o um "curativo" que não resolve o problema real.
Este é apenas um exemplo que menciono (por causa da anedota recente que é relevante). Não é um incidente isolado. Todos sabemos que a escassez de padres é um problema crescente em nosso país. Padres estão sendo trazidos de outros países (onde também há escassez) que querem vir — por várias razões — para o Primeiro Mundo. E muitos padres, daqui ou de lá, têm que servir várias paróquias, enquanto algumas delas estão fechando. Um problema em cima do outro, agravando o problema: o papel do padre como sujeito sagrado, o homem que tem que fazer, dirigir e controlar tudo, que é imposto à comunidade de fora, que é colocado acima da comunidade, que geralmente não vive com ela; e que, infelizmente, muitas vezes foi convertido em um funcionário público, um administrador de sacramentos.
Reverter isso não é fácil, especialmente quando o verdadeiro problema subjacente não é revisto e analisado. Como bem sabia o Bispo Fritz Lobinger, não se tratava apenas da falta de sacerdotes e de sua má distribuição pelo mundo, mas também da falta de consciência nas comunidades sobre seu papel de liderança na celebração do Memorial de Jesus. Esse grave déficit, que impede que os carismas e dons que o Espírito coloca em sua Igreja emerjam e se traduzam em uma Igreja plenamente ministerial, tem sido alimentado há séculos por uma Igreja que se tornou clericalista e arraigada em um único modelo de sacerdócio: o sacerdote celibatário, formado por muito tempo em seminários.
Nem sempre foi assim. Como disse aquele grande missionário e bispo, Fritz Lobinger, e a quem outros dois padres e bispos alemães, seus colegas, acompanharam em seu trabalho na África até suas respectivas mortes em 2006 e 2011: "O presbitério, ao longo da história da Igreja, mudou e pode mudar novamente."
E ele sempre nos remetia ao exemplo das primeiras comunidades paulinas, onde nenhuma comunidade era impedida de celebrar a Eucaristia por falta de um agente externo, visto que se autoministravam, reconheciam esses dons do Espírito em si mesmas e nomeavam seus próprios ministros. Mas isso não aconteceu apenas na antiguidade; outras igrejas cristãs, que compartilham nossa primeira grande tradição, continuaram a desenvolver formas pluralistas de ministério que impuseram novos desafios. Para refletir sobre essas formas e os desafios e contradições associados a esses desenvolvimentos e implementações, Lobinger frequentemente visitava e dialogava com comunidades de igrejas irmãs, principalmente anglicanas e metodistas.
Lobinger também estava muito ciente e era corresponsável pelas necessidades de diálogo e governança dentro da Igreja, pela coesão dentro da comunidade e nas dioceses, e pela necessária comunhão com Roma, razão pela qual ele defendia processos lentos, mas contínuos. que envolvessem as dioceses na reflexão compartilhada e na resolução de conflitos que pudessem surgir na implementação de novas formas de ministério.
Seguindo esse caminho compartilhado, Roma poderia aprovar experiências locais envolvendo a ordenação de equipes de um novo tipo de padres comunitários, emergindo das próprias comunidades, nutridos por uma formação específica inculturada nelas e compatível, em sua época, com as obrigações daqueles que têm família e trabalho. Esses novos padres comunitários, que trabalhariam sempre em equipe, evitando novas tentações de outras formas de clericalismo, não competiriam com o modelo mais familiar de padres celibatários formados em seminários, mas colaborariam com eles.
Por sua vez, para os celibatários, Lobinger propôs que não vivessem sozinhos, mas que o fizessem em equipes e que cultivassem em si (além da fidelidade à sua opção celibatária) os conselhos evangélicos de pobreza, castidade e obediência, evitando assim outros flagelos do sacerdócio celibatário como a solidão, a sobrecarga de funções ou a falta de espaços para cultivar a espiritualidade e a oração compartilhada.
Meu contato com esse bispo, meu conhecimento de sua obra e trajetória, foi em si um exemplo do exercício da sinodalidade na Igreja. Em 2006, participei de um curso para bispos e teólogos em Embú das Artes, Brasil. Uma das grandes preocupações dos bispos presentes (principalmente do Brasil, mas também de outros países como México e Uruguai) era a dificuldade de celebrar a Eucaristia aos domingos nas comunidades, o que limitava seriamente a missão da Igreja. Esse desafio foi acompanhado por reflexões teológicas que analisaram o problema usando o método VER, JULGAR e AGIR.
A partir do Proconcil, como rede comprometida com o desenvolvimento da sinodalidade, continuamos esses contatos e reflexões compartilhadas. Foi em 2009 que o então bispo de Jales, no Brasil, Demetrio Valentini, me apresentou à obra desse bispo alemão, incardinado na África do Sul. Uma vez familiarizado com ela, entrei em contato direto com o autor e me comprometi a traduzir e produzir uma edição especial em espanhol de dois de seus livros, sendo o mais recente de sua autoria: "Equipes de Ministros Ordenados", escrito em colaboração com o teólogo e professor universitário brasileiro Antonio José de Almeida, e "O Altar Vazio", livro ilustrado para a reflexão comunitária sobre o problema, cujo sintoma é a falta de sacerdotes e a passividade de muitas comunidades, que se traduz na impossibilidade de celebrar a Eucaristia dominical. Neste último, para a edição em espanhol, buscamos uma reflexão teológica de Juan Antonio Estrada que servisse de introdução e suporte à reflexão comunitária que buscávamos provocar.
Os livros foram publicados e apresentados em 2011 em Madri. Poucas semanas antes de sua apresentação pública, enviei-os (entre outros) ao então Cardeal Arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio. Ele respondeu em uma carta escrita por ele mesmo, compartilhando a preocupação comum com o problema e sua compreensão positiva da proposta do bispo alemão, que ele considerava viável, desde que acompanhada de processos adequados de explicação e diálogo dentro da Igreja.
Anos mais tarde, como Papa, Francisco conversou com o Bispo Erwin Kraütler sobre a proposta de Lobinger, reconhecendo sua profundidade (e a dos diáconos casados de San Cristóbal de las Casas) quando Kraütler expressou os problemas enfrentados por muitas comunidades em sua região do Brasil em uma entrevista em 2014. O Papa instou os bispos a fazerem propostas ousadas nesse sentido.
Um detalhe bonito e significativo da proximidade e simplicidade de Lobinger que tive a oportunidade de vivenciar é que - depois da publicação de seus livros em 2011 - ele me escreveu para dizer que viria à Alemanha no verão para visitar um irmão e que se pudesse passar duas semanas em casa, poderia me conhecer e conhecer a proposta da Proconcil, assim como da editora Herder, e também do teólogo Estrada, que havia escrito uma introdução teológica para um de seus dois livros publicados em espanhol.
Um pouco surpreso com a proposta, perguntei se ele queria que eu encontrasse um centro de espiritualidade ou algo parecido para ele morar, e ele disse que não, que se eu concordasse, ele queria vir para minha casa e ficar com a minha família. E assim fizemos. Compartilhamos o mesmo teto e a mesma comida como família, ele conheceu alguns dos nossos amigos, viajamos juntos para Sevilha e outros lugares, e construímos uma amizade que vai além da colaboração em projetos comuns.
Gostaria de enfatizar que Lobinger não apenas considerou soluções pastorais, mas também semeou as sementes de uma Igreja sinodal , onde o discernimento compartilhado, a corresponsabilidade e a liderança dos fiéis são expressões de comunhão autêntica. Seu diálogo constante com suas Igrejas irmãs e sua abertura às experiências eclesiais da Ásia, América Latina e Oceania enriqueceram suas propostas, tornando-as profundamente católicas no sentido pleno do termo: abertas, inclusivas, enraizadas na vida.
Hoje, enquanto a jornada sinodal continua a desafiar a Igreja a encontrar novas linguagens e formas para a missão, o testemunho do Bispo Lobinger ressoa como um convite à coragem , à confiança no Espírito que fala nas comunidades e à construção conjunta de uma Igreja mais íntima, participativa e esperançosa. Por isso, creio que, gratos por sua vida e comprometidos com seu legado, devemos continuar a estudar como resgatar e divulgar suas reflexões e propostas.
Que ele descanse na paz do Deus da Vida, a quem serviu durante toda a sua vida com criatividade, audácia e ternura pastoral.
Para mais informações sobre a proposta do Bispo Fritz Lobinger:
De 2009 a agosto de 2011, em antecipação à publicação em espanhol de seus dois livros, o Proconcil abriu um espaço para reflexão sinodal, onde foram publicadas reflexões sobre o problema da escassez de padres e a falta de participação da comunidade, questões que afetam seriamente a missão da Igreja. Também acompanhamos a publicação dos livros e publicamos comentários na imprensa. Para aqueles que desejam se aprofundar na proposta de renovação ministerial do Bispo Lobinger, recomendamos visitar nosso blog, onde você pode aprender mais sobre os desafios e as implicações dessa proposta.
No Brasil, o trabalho de Lobinger foi amplamente recebido e divulgado pelo teólogo Antônio José de Almeida. Vários de seus artigos, além dos citados logo abaixo no Leia mais, podem ser encontrados no IHU.